Quem não deve, não teme.
A carona era muito especial: uma loura bonita nos seus 47 anos, vizinha de bairro de Sérgio e há três meses na firma. Mas havia muito mais que isso: uma vez ou mais por mês eles saiam. E eles estavam voltando, naquela sexta-feira, fim de expediente. Não era rotina... Eles eram amigos, quer dizer, mais que amigos... Mas tudo era novidade ainda. Mas havia dois grandes empecilhos: não eram casados entre si.
Assim sendo, viviam o dia a dia devendo a eles mesmos satisfação do que recebiam no corpo e no coração. Naquela tardinha, ele ao volante do carro, como sempre, e ela no assento do carona... Foram momentos supimpas, disse ele para si mesmo, num chiste, enquanto já se preocupava com a sua chegada em casa e tendo que passar necessariamente perto de sua residência, a fim de levar a Ana Maria em casa. Isso era novidade para ele, mas necessário, pois o carro dela estava na oficina... De qualquer modo lhe dava um calafrio.
O carro descia a avenida principal e ele já vislumbrava logo, logo deixá-la em casa. Mas aquela área era Zona de Desconforto mesmo. Alto risco... Era na verdade uma área perigosa, porque era ali que sua esposa, psicóloga, clinicava... e àquele horário ela estava saindo de uma secção. Eis que, de repente, uma surpresa aconteceu: o Marcos Paulo, calmo, sangue frio, falou para a Ana: olha a minha mulher aí na frente. E já nos viu.... Passa aí para traz, fica calada, deixa comigo.
Ele deu uma leve buzinada, sua esposa já o tinha visto, reconhecido o carro, e de cara feia, se aproximou do carro: e ele logo tomou a dianteira: Carmen Lucia, meu amor, entra aí...essa é a Ana Maria, uma nova colega da empresa, mora aqui perto... O carro dela esta na oficina e eu estou dando uma carona pra ela. Ana Maria disse um oii amarelo, passou para traz, e ele saiu em direção a casa dela. Era mesmo perto; duas ruas.
Carmen Lucia não disse uma palavra. Sisuda, calada estava , muda permanece. O silêncio era sombrio e frio. Ele sabia que não adiantava explicar nada. Ana Maria, em silêncio, esperava ansiosa que sua rua chegasse. E chegou... As despedidas foram monossilábicas. Mas a volta... Foi um quebra pau feio. Mas ele usou um forte argumento, que a deixou de oiças em pé:
-Meu amor, você acha que se eu tivesse algo com ela eu ia passar perto de nossa casa? E pior: te chamar e apresentar? E arrematou com segurança: quem não deve não teme, Carmem Lúcia.