BUQUÊ DE FLORES

Buquê de flores

Sertão.

A meninada corre brincando com os gravetos secos tal qual fossem bonecos.

O chão de terra parecia um mar marrom a perder de vista, terra craquelada, ressecada lembra um quebra cabeça.

Firmina, menina alegre, esperta, magra de cabelos pretos, dedos longos e finos. Era a sombra da mãe, estavam juntas desde o acordar, da saída pra semear a terra até a época da colheita, muitas vezes se sentava num banquinho feito para ela, lá ficava ora debuiando milho ora socando arroz no pilão.

A labuta do povo era quase sempre para o próprio sustento, mas geralmente o que plantavam morria, nem os poucos animais sobreviviam a seca.

A fome já não estava na barriga, estava na cabeça.

Uma vez alimentados já pensavam se teriam o que comer na próxima refeição.

O tempo passou. Firmina cresceu, mocinha foi pra cidade grande morar com a tia.

Sua alegria logo encantou a família toda.

Dedicada destacou-se, seu primeiro emprego foi como cuidadora do lar, depois foi galgando outras profissões e realizou o sonho de ser professora. Mesmo com o uso da língua formal comum nas metropóles, em casa Firmina ainda fala a língua do nordetinês. Tinha orgulho do seu sertão, apesar das dificuldades foi feliz.

Contando ao namorado sobre um episódio de sua vida, explicava que a vida na cidade causava-lhe estranhamento, era tudo muito novo. Uma delas era o uso das palavras. Jovenzinha passou por essa situação embaraçosa.

Num dia qualquer tocou o interfone:

-Alô?- Indagou Firmina.

-Oi Firmina, sou eu Ronaldo. Tem uma entrega, pode subir? - Disse o porteiro.

-Sim ômi..num se apoquente mande subir.

Toca a campainha e Firmina recebe um bilhete dentro de um envelope Rosa.

Deixa na mesa e vai até sua Patroa:

-Chegô aqui uma encomenda pra sinhora. Um envelope.

-Ah sim Firmina. Por favor você pode lê-lo enquanto passo a maquiagem? - responde a Patroa.

-Oxi ...posso...- Abriu o envelope e em pensamento leu:

"Querida, obrigado pelo bouquet, fiquei muito feliz com efeito que causara. Assinado Jorge"

Com o rosto ruborizado de vergonha Firmina põe a mão na boca e dá um risinho, em pé fita a patroa.

- O que foi Firmina?

- Aqui diz que a senhora estava xumbregando, desculpa foi a sinhora que pediu pra ler.

-Como assim Firmina? O que é xumbregar?

-Aqui voces dizem "trocar amassos".

O marido da patroa estava no computador, virou-se rapidamente, desceu os óculos e olhou por cima deles.

-Quê? - Disse a patroa, tomando o envelope bruscamente.

-Firmina, aqui não diz isso! De onde você tirou isso?

-Oxente, aqui ó BOUQUET - Mostra Firmima apontando a palavra.

Rindo a patroa disse:

-Não é aquela palavra sobre sexo. É buquê de flores! Jorge é meu pai. As flores foram para mamãe que estava doente.

Firmina rindo com as mãos na boca diz:

-Aaah sim. Lá a gente diz ramalhete, ou só flor mesmo. Desculpa!

Priscila Ferrer
Enviado por Priscila Ferrer em 10/04/2018
Reeditado em 11/04/2018
Código do texto: T6304917
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