diálogo em jeito de farsa
A farsa apresentada conta um episódio da vida de um marinheiro das naus da iIndia, que desabafa a seu amo a sua paixão não correspondida pela mulher que o enloquece de desejo e raiva
É um diálogo concebido e imaginado ao estilo de Gil Vicente o grande dramaturgo portugues .
I
Diálogo em jeito de farsa
amo:
-Mas que de amor tu te queixas
E assim ficares tão finado?
servo;
-Ai senhor
Que morto estou.
De minha vida fiar.
E sem graça agora estar.
Amo:
-Homem agora te entendo.
Que isso ai é agonia.
Não me rio de teu enfado.
E não te aches zombado.
Bons ventos hão de vir
e tu voltas a sorrir…
Servo:
-A boas léguas daqui.
Eu meti-me na tormenta.
Fui-me pela devoção
à romaria da serra.
Da Senhora dos milagres.
Em má hora aconteceu.
Vi pessoa que me deu
a chaga do coração.
Cuidei de não a encarar.
Virei meus olhos pró mar,
só para não a afrontar.
Apertei – me no gibão.
E melhor me encapucei.
Mas a alma me queria sair.
E um fogo de queimar
nunca tal coisa senti.
Nem quando no alto dos mastros
tremendo e apertado
de águas me desfazia.
Eu via monstros no mar.
Que eram de arrepiar
Ai de mim... ai de mim.
Vos me vedes um farrapo.
Amo:
-Credo homem isso é demo.
que te está a torturar.
Que mais coisas
vieram então.
Desabafa homem de Deus.
Se isso te agradar
melhor tu irás ficar.
Servo:
-Bem vou continuar.
Queira-me então ouvir.
Não quero de si zombaria
Depois….senhor…
Vos digo então...
Foi tamanha a agitação.
Que me deu cá uma gana
de esganar a danada.
Excomungá-la de mim.
Fugir para léguas distantes.
Arrastá-la à Senhora
que é Santa dos milagres.
Aos pés do altar na serra,
fazê-la ajoelhar.
Murmurar orações.
E também devoções.
Trilhá-la até doer
para ela não esquecer.
Para ela então saber
o que era meu sofrer.
Mas qual nada!
Que de lembrança
de tempos já tão passados.
Ela tinha era folgaria.
Então deu-me uma tremedeira.
O fogo me apanhou.
Fui-me a ela
sem fastio.
O calor me consumiu.
E aqui estou como vedes.
Quedo, triste, infamado.
E muito muito esfalfado
Mas vos digo.
Que há fadigas,
desatinos, desvarios.
Que fazem um homem sentir.
Que enfim está vingado.
E a alma limpa, alivia.
Amo:
-Há demo quanta vilania
tu meteste em teu fardo.
Quanto trabuqueis.
E de agonia ficais cheio.
Que de tal não é nada.
Isso foi grande alegria.
Não te amofines então.
Isso foi teu coração.
Que de doido e amordaçado.
Se quis de tormentos esquecer.
Mas que haveis de fazer?
De todo o mal que te consumia?
Em mais fogo te abrasastes.
Mas te digo.
Que há fadigas
que valem bem o perigo….
Agora me certifico.
De T, ta
.Agosto de 07