O CAIPIRA, A CARTA E O RETRATO DA NAMORADA

Quinzinho do Gamelão contando mais um de seus “causos” na Rádio Atividade Sertaneja:

-Quando eu mudei lá pra divisa de Goiais, fui trabaiá numa fazenda e dexei aqui uma namoradinha. Aqueles namurico que nem atava nem disatava... Naquele tempo num tinha o tal Istragano, Yogurte, Zap-zap...A gente só cumunicava cum carta, bietes...

A fazenda era longe da cidade, o patrão toda semana ia no correio pegá as correspondença dos impregado. A namoradinha sempre mandava umas carta e eu cumo tenho poca leitura, letrinha feia, num gosto muito de iscrevê não, mais pur inducação, tinha que respondê. Quando eu iscrivia uma carta pras namorada, gostava de fazê uns verso e terminava as carta assim:

“Pela letra, peço discurpa,

Pros erro peço perdão,

Mais são palavra sincera,

Do Fundo do coração”

Elas achava bunito...Um dia ricibi uma carta da tal namorada, num era bem carta, era um biete assim:

-O fim dessa é terminá nosso namoro, arranjei pur aqui outro namorado, de mais futuro, é bunito, bem de vida e tem diproma. Favor me devorvê meu retrato.

Naquele tempo a gente tinha mania de pidi retrato das namorada, das amiga, das parente...E eu tinha uma verdadera coleção de retrato. Eu li e reli o biete dela, achei um disaforo, uma humiação pra mim, num tava nem aí pra ela, mais achei muito feio o jeito dela terminá o namoro. Fiquei matutano um jeito de vingá dela. Nem drumi direito de raiva. Mais lá pela madrugada tive uma idéia. Peguei dois invelope, num deles iscrivi meu nome e endereço, botei um selo e iscrivi no ôto o nome e o indereço dela. Peguei uma purção de retrato pur acaso, uns oito ou nove puis dento de um dos invelope e iscrevi um biete e puis tudo dento. O biete dizia assim:

-Ocê pede seu retrato, cumo tenho muitas namorada e muitos retratos, não alembro qual que é o seu, tira o seu daí e me devorve o resto, já tem inté um invelope indereçado e selado. Ainda assim num fiquei sastifeito, fiz um versinho pra ela:

“Ocê pidiu seu retrato,

Tenho retrato dimais,

Iscoe aí o que fô seu

Purque da cara, num lembro mais”...

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HERCULANO VANDERLI DE SOUSA
Enviado por HERCULANO VANDERLI DE SOUSA em 26/06/2017
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