Nos tempos dos bailes da Juvelina
Nas décadas de 60/70, dona Juvelina e seu marido Argeu eram proprietários de um salão de baile muito frequentado pela classe hoje denominada ‘menos favorecida’.
O espaço físico era de madeira já desgastada pelo tempo e sem forro, sendo que nos dias ‘úteis’, as galinhas ali se abrigavam à noite. Mas isso não alterava o bom andamento das noitadas de sábado.
Dona Juvelina, a responsável pela portaria, não perdoava ninguém na cobrança; Argeu e um cunhado tomavam conta da venda de bebidas.
Dois sobrinhos do casal eram os seguranças do evento. Ambos de porte físico avantajado e com cara de poucos amigos tendo como ‘respeito’ um cacetete e um punhal escondido na cintura.
Desavenças eram resolvidas na base da faca, mas sempre fora do salão. Nos quase 18 anos de funcionamento, ocorreram somente nove homicídios, todos de autoria identificada.
O baile era abrilhantado por um gaiteiro e um pandeirista e sem aparelhagem de som - a cantoria era na força do gogó.
Os homens faziam suas necessidades lá fora, pelos cantos do salão ou embaixo de um pé de guabiroba que ficava no outro lado da rua - isso conforme a necessidade.
As mulheres eram privilegiadas com um banheiro no corpo do salão e nos intervalos musicais, quando o mesmo lotava, muitas delas faziam xixi nas frestas do assoalho - e que pontaria! Medalha de ouro.
Anos depois chegou ao conhecimento de dona Juvelina que alguns atrevidos - principalmente os que não adentravam ao evento, estariam espionando essas mulheres, já que o banheiro ficava a uma altura propícia para tal. Dona Juvelina contratou um cidadão de apelido Lambreta para moralizar a coisa. Mas comentários davam conta de que ele evitava, mas se dava o direito.
Por conta disso, Lambreta ficou famoso por conhecer... todas, numa associação linguística em que as palavras rimam. E isso obrigou os proprietários a fazer um investimento no banheiro eliminando as frestas. E Lambreta ficou desempregado, mas orgulhoso.
Muitos dos frequentadores residiam no interior ou em bairros distantes e tinham lanternas para iluminar o caminho - tanto na ida como na volta.
Certa feita, um desses rapazes ouviu de uma moça com quem dançava que ele estava com a “barraca armada”. O mesmo explicou que “ainda não - era a lanterna que tinha no bolso”. Assim mesmo, na maior simplicidade.
E o tal de bailão facilitou muitos casamentos que duram até hoje. Como o casal Armelindo (82 anos) e Felícia (80). Ao ser questionado sobre a veracidade do fato indecoroso do banheiro feminino, ele não escondeu um sorriso de conhecimento. Dona Felícia fez de conta que não entendeu nada.