UMA PERERECA VENENOSA ATACA ATÍLIO

Os dois entraram se agarrando, se beijando, atabalhoados, quase caindo um por cima do outro até alcançarem a porta do quarto. Os cabelos de Vivian chicoteavam as faces de Atílio. Ele puxando a cintura dela para si. Ela beijando a boca dele. Ora quase perdendo o equilíbrio, ora esbarrando em objetos. Os dois rindo que se matava. Seguiam se agarrando, naquele ímpeto selvagem até se aproximarem da cama, onde seria o ponto crucial da propulsão do romance.

Quando...

Vivian fica paralisada, a euforia de inicio desapareceu. Um silêncio tão profundo que parecia perturbador, um silêncio selvagem até. Um silêncio inquietante, um silêncio de uma britadeira desligada e esquecida num canto. O silêncio de uma dinamite esquecida sem detonar dentro de uma caixa de sapatos em cima do guarda roupas. Enfim um silêncio mais irritante que uma balbúrdia. Um silêncio estarrecedor.

Pois lá estava o motivo do estarrecimento do casal. No espelho da penteadeira, escrito com batom: CRETINO.

De repente a mãe de Atílio, dona Juma, recebe um telefonema.

-Do Pronto Socorro!!?? Meu filho!!??? Jesus!!!

Em menos de meia hora a mãe estava ao lado de Atílio todo enfaixado, com as pernas imobilizadas e soerguidas por cordas que desciam do teto.

-Meu filho!!! Que foi????

Dona Juma não sabia o que fazer, em toda parte que colocava a mão nele doía.

-Conta, meu filho! O que aconteceu?

Houve uma hesitação.Vivian estava ali ao lado sentada numa cadeira de espaldar.

Mais um tempo de hesitação. Foi quando Atílio respondeu:

-Foi uma perereca.

Dona Juma pediu um copo d’água. Sentou-se na cadeira que Vivian cedeu vendo a palidez nas faces da mulher e temeu por acontecer algo mais grave.

Depois de beber a água dona Juma falou:

-Essa mulher vai te matar Atílio.

O filho pensou um pouco e respondeu:

-Uma perereca descomunal, mãe.

-Meu filho, desde pequeno lhe adverti desses pormenores.

-Annnnn!!!! –Vivian ficou sem entender.

-Meu filho sempre teve pavor de perereca.

Vivian pôs a mão na boca de espanto ou para tapar uma possível risada.

-Titico. –Dona Juma olhou com ternura para o filho.

-Titico? –admirou-se Vivian.

-Quando meu Titico viu pela primeira vez uma perereca entrou debaixo da cama e não queria sair mais de medo.

-Mãe. Também não é assim!! Uii!

-Não se exalte, meu filho, que fica mais difícil a sua recuperação... É verdade, sim, Titico. Não adianta tapar o sol com a peneira.

-Mãe, era uma perereca enorme, uma das maiores que já vi.

-Talvez não seja a maior, meu filho.

Depois de Vivian e Atílio depararem com a palavra CRETINO, escrita com batom no espelho, Vivian quis saber o que estava acontecendo.

-Fui eu que escrevi.

-O que Atílio!!

-Sim, fui eu que escrevi.

-Atílio, você tem problema?

-Sabe, eu escrevi para lembrar.

-Lembrar???!!

-Sim, lembrar.

-Lembrar que você é cretino?

-Não, Vivian, pra lembrar que eu não sou cretino.

Ela ficou uns segundos olhando para ele espantada. Foi onde perguntou:

-Atílio, mas você é cretino?

-Não, claro que não.

-Hummm!!

-Juro que não sou cretino.

-Escrevendo com batom no espelho da penteadeira??!!

-Sim. É um negócio meu, sabe. Uma espécie de.... de....de mania. Pronto, Mania.

De repente ele pega um batom que estava caído ao lado da banqueta da penteadeira e sai escrevendo “Cretino” na geladeira, na estante, no micro-ondas, na batedeira de bolo, no liquidificador, no aparelho de DVD, na TV de plasma, nas janelas, no vaso sanitário, no bebedouro d’água...até que o batom acabou.

Voltou correndo pro quarto, agarrou Vivian, a jogou na cama, e se jogou atrás. Foi que surgiu um chiado: Róóóónc!

Atílio parou imediatamente, ele tinha abocanhado a alça do sutiã de Vivian e rosnava. Agora ficou completamente estático.

Róóóónc!

-Meu pai!

-Deve ser meu estômago. –Amenizou Vivian.

-Não é não. –Atílio procurava com os olhos de onde vinha aquele chiado sinistro.

O chiado estava chegando perto. Mais, mais, mais, mais... Mais.

Atílio sentiu algo gelado e gelatinoso em seu pescoço. Soltou um grito. Um grito terrível. Ecoou por todo o quarto. Correu apanhar o abajur. Sentia a coisa gosmenta descendo por suas costas. Soltou outro grito tenebroso. Com o abajur tentava acertar a si mesmo.

Vivian apavorada não sabia o que fazer.

Atílio dando golpes de abajur em si mesmo. Rolava pelo chão. Se debatia. “Tira isso de mim!!!”, gritava ele. Foi que se enroscou e a penteadeira caiu por cima dele. Tudo o que estava em cima da penteadeira caiu por cima.

Agora estava Atílio imobilizado em cima da cama de um hospital.

Sem se anunciar entra no quarto uma morena toda delgada, insinuante, sedutora, mostrando um olhar de desprezo para Vivian e para o próprio Atílio.

Aproxima-se da perna dele engessada, tira da bolsa um batom e escreve: CRETINO.

Depois foi embora.

Leozão Maçaroca
Enviado por Leozão Maçaroca em 26/08/2016
Código do texto: T5740908
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