O SOBRINHO

A irmã telefonou de Brasília: o Paulinho está de férias, vai passar uns dias aí com vocês. Tava certo, há quantos anos não via o sobrinho, devia estar um rapagão. A cidade era pequena, não tinha muita coisa para fazer, mas havia boas praias, ainda não poluídas.

– Espero que ele goste daqui – falou.

Dias depois, recebia um jovem clarinho, com barba preta bem cuidada. Vinha cheio de malas e sacolas coloridas. O marido achou que tinha um jeitão meio esquisito. À noite, apossou-se do telefone e passou horas conversando, fazendo beicinhos e olhares enternecidos.

Dia seguinte, para irem à praia, apareceu com bermudas colantes vermelhas, havaianas bordadas e um chapéu de abas largas enfeitado por uma peninha. A camisa, multicor, trazia escrito no peito – Don´t love a girl. Love only a boy. A tia parou estupefata. Nem na televisão havia visto tamanho festival:

– Você não pretende sair assim, não é, Paulinho?

– O que que tem, tia?

– A cidade é pequena, o pessoal muito antiquado. Vão falar um bocado. Por favor, você não trouxe algo mais discreto?

– Ah, não, tia! Esta roupa foi comprada nos States. Uma fortuna em dólares. A senhora não quer que me vista como um jeca de cidadezinha.

A mulher parou mais um pouco, deu uma olhada na camisa.

– O que é agora, tia?

– O que está escrito nesta camisa?

– Nada de mais, só aquele negócio de amor ao próximo. Está na Bíblia. (Só não disse de que próximo se tratava).

Procuraram a praia mais deserta. Ainda assim, alguns banhistas deram um olhar disfarçado. Principalmente quando se despiu, o corpo branco, uma sunguinha vermelha, correndo para a água com andar bamboleante.

Chegava em casa, se apoderava do telefone. Contava tudo que acontecia, tintim por tintim. Fazia observações irônicas. O tio chamou a mulher:

– O negócio não está bom, ouvi sem querer na extensão e era voz de homem. Pendurar-se no telefone, tudo bem, mas andar por aí com calça justa e sapato de saltinho...? O pessoal do serviço já está me gozando.

– Deixa estar, ele logo vai embora. É meu sobrinho, não posso expulsá-lo – falou desanimada a mulher.

No outro dia Paulinho acordou tristonho:

– Tia, não agüento mais ficar aqui sozinho. Quero pedir uma coisa.

– Claro, disse ela, o que você quiser (deve estar querendo dinheiro pra ir embora ). Pode pedir.

– Posso trazer meu namorado pra cá, até o final das férias?

Hilton Gorresen
Enviado por Hilton Gorresen em 12/07/2007
Código do texto: T561878
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