GATO MORTO
Logo após o casal ter saído para uma semana de férias, um gatinho pulou a janela da casa, veio vindo, meio molenga, deu uma estrebuchada e caiu morto no meio da sala. Finou-se, faleceu, entregou a alma ao Criador (se é que gato tem alma).
Horas depois, o filho mais novo do casal veio pensando em seu conjunto de rock, quase esbarrou no animal, mas não percebeu nada. A filha passou umas três vezes pelo local, achou que havia algo novo na decoração, não sabia o que era.
Dois dias depois, começaram a sentir um cheiro esquisito na sala. Parecia cheiro de animal morto. Eufórico, o filho maior conseguiu localizar uma lagartixa imprensada na janela. Pronto, estamos livres do fedor. Engano, o cheiro continuou mais forte. Ao esbarrar no rabo do finado, a filha percebeu tudo. Não disse nada, apenas pensou: não é comigo, já basta que sou obrigada a arrumar minha cama todos os dias.
Quando os outros perceberam a nefasta presença do animal, encararam-se como dizendo: e agora, quem vai tomar alguma providência? O menor tomou a iniciativa: borrifou Bom-Ar no bichano. Foi pior do que misturar perfume barato com odor de cigarro. Ficou um cheiro adocicado, penetrante. A filha reclamou que assim não dava de assistir à novela.
– Mude a televisão! – exclamaram os outros.
– Engraçadinhos! Alguém tem de fazer alguma coisa.
Como ninguém se habilitou a fazer algo, a filha tomou uma medida enérgica: ao entrar na sala, colocava um grampo de roupas no nariz. Nessa altura, o fedor do animal já se espalhava pela casa toda. Gastaram três ou quatro tubos de spray, conseguiram até uma máscara de oxigênio. Nada adiantava. Um dos filhos resolveu, então, telefonar ao pai, que estava curtindo um descanso em Gramados:
– Velho, tem um gato morto no meio da sala.
– Gato morto? Deve ser o namorado da tua irmã.
– Não é brincadeira, não, velho. É um gato mesmo. O que fazemos?
– Já experimentaram tirar o bicho daí com uma pá e enterrar no quintal?
– Não, ninguém falou pra fazer isso.