O ESPETÁCULO DÁ VIDA - capítulo VI
ELE NÃO VEM
Seu Italiano saiu enfurecido do circo e ainda teve de aturar mais uma confusão: lá fora as pessoas assaltavam a cabine de ingressos e pegavam de volta todo o dinheiro. Richard até tentou impedi-los, no que acaoou sendo atropelado pelas pessoss alvoroçadas e assim que conseguriram pegar todo o dinheiro, foram embora.
- Miseráveis! - gritou seu Italiano.
- Ainda restou uma nota de R$ 2,00 aqui! - disse Richard, todo arrebentado.
Mas o povo não perdova! Veio uma velhinha de bengala e tomou o dinheiro da mão do rapaz.
- Hum! - disse a velha e ainda meteu a bengala na cabeça de Richard.
- Agora não resta mais nada - ele falou.
Italiano seguiu, com passo longos e apressados, para sua tenda e apanhou algumas de suas roupas que estavam sobre a cama e foi entulhando tudo numa mala. Mara, a gorda, entrou e viu o que ele fazia.
- O que está fazendo? - perguntou ela.
- Indo embora daqui - ele respondeu.
- Mas ainda temos um espetá...
- Não, não temos! - ele vociferou.
- E pra onde está pensando em ir?
- Para qualquer lugar que não seja sugestão sua.
- Está querendo me culpar pelo que aconteceu? - ela perguntou, com as mãos na cintura.
- Você que disse: ah, vamos pra lá, que lá as pessoas são ricas e maravilhosas!
- Eu nunca disse que elas eram maravilhosas!
- Hum.
- Tá, então... Pra onde vamos?
- Sei lá - ele disse e parou o olhar -, você tem alguma sugestão?
- ...
- Mas, isso nós decidimos depois, quando estivermos saindo. Agora avise a todos que estamos deixando a cidade.
- Está bem.
A gorda se retirou e foi avisar aos demais que partiriam dali de imediato.
- Mas ainda falta um espetáculo! - lembrou Gage.
- Deixe de ser tolo, Gage! - falou a gorda - você acha que depois do que houve nessa noite aqueles idiotas vão querer voltar aqui?
Lilie fez gestos para Richard e ele simplesmente os traduziu para os outros que não entendiam.
- Lilie quer saber para onde vamos - disse Richard.
- Eu também queria saber, Lilie - Mara falou -, agora... Alguém viu o Michael por aí?
- Não o vejo desde que o espetáculo acabou - disse Richard.
Então Mara saiu procurando pelo filho e os outros foram tratar de arrumar suas coisas para saírem da cidade. A gorda levou um susto quando encontrou Michael aos beijos com Penélope e chamou-lhe a atenção.
- Michael! - ela gritou.
- Mãe! - disse Michael, surpreso.
A gorda olhou bem para Penélope e a jovem intimidou-se e se afastou ligeiramente de Michael.
- Venha cá - falou a gorda, esquecendo da menina -, preciso falar com você.
- Sim.
Michael deixou Penélope e seguiu a mãe até a tenda do outro lado. Mara pegou duas malas grandes e jogou em cima da cama de Michael.
- Estamos indo embora - ela disse.
- Embora? Como assim? - perguntou Michael - não íamos ficar até amanhã?
- Sim, mas Italiano está muito zangado com o povo e quer sair desse lugar.
- Mas, a senhora o convenceu a não irmos, não foi?
- Eu não! Pensei que aqui seria melhor, admito... Mas vejo que eu estava enganada, essa gente é nojenta e hipócrita! Quero mais é distância...
- E ele disse para onde...
- Não, ainda não sabemos para onde ir, mas isso também nem me importa! Agora arrume logo suas coisas e me espere lá no trailer.
Michael sentou-se na cama e observou a mãe guardar seus pertences na mala com brutalidade e rapidez.
- Eu também tenho uma coisa a te dizer - ele disse.
- O quê?
- Estou namorando com Penélope.
- Hum...
- Mas, a senhora sabe que ela era assistente de Lorde, não sabe?
- Claro que sei - respondeu Mara, guardando sua barba falsa na mala.
- E também sabe que Lorde não está mais no circo.
- Sim, e daí?
- E daí que... Se não há mágico no circo, então, para que servirá uma assistente de mágico no circo?
- É verdade - ela tentou fechar a mala, que estava muito cheia.
- E por isso, Penélope decidiu que vai sair do circo também.
- Que pena - Mara pressiona a mala, com o peso de seu corpo.
- É, mas eu não quero me afastar dela.
A gorda parou o que estava fazendo e virou-se para Michael. Olhou bem para o rosto do filho e temeu.
- O que você está pensando em fazer, Michael? - perguntou ela.
- Eu sinto muito, minha mãe - ele dizia -, mas, não vou com vocês dessa vez.
- O que você está dizendo?
- Que vou ficar com Penélope, irei para onde ela for.
- O quê? Você ficou maluco? - Mara se exaltou e seus olhos encheram-se de lágrimas - Michael, se você disser mais uma vez uma bobagem dessas, eu...
- Pode fazer o que quiser, mãe! Me bata, me ponha de castigo, sei lá! Mas eu vou com ela e não tente me impedir!
- E quem é essa garota que mal chegou aqui e você já pensa em se mandar com ela?
- Nós estamos nos gostando, mãe e...
- Se gostando? Se gostando? Acha mesmo que gosta dela? Só porque vocês se beijaram? Meu filho, você só está impressionado!
- Não, mãe, não é verdade! Eu gosto muito dela e acho até que nunca gostei tanto assim de alguém!
Mara largou a mala de Michael e apanhou a sua. Enxugou com um lenço suas lágrimas incessantes e olhou para o filho, viu que não derramava nenhuma lágrima e estaca determinado a não ir com eles.
- Está bem, Michael - dizia Mara, dando as costas -, vá com Penélope, talvez essa moça o ame, sim, o ame mais do que sua própria mãe.
- A senhora não vai nem me dar um abraço? - Michael perguntou.
Mara, mesmo sentindo tanta raiva e desgosto, virou-se e correu para abraçar o filho. O abraçou muiro forte, em razão de que não sabia se voltaria a vê-lo e abraçou-o mais uma vez e mais forte, porque o amava muito.
- Me prometa que vai tomar cuidado com essa moça - ela disse, chorando e alisando o rosto do filho.
- Eu prometo - ele falou e sorriu.
Mara apanhou a mala e saiu, com o coração partido.
Ao passo que todos colocavam suas coisas no trailer, a lona do circo era desmanchada, depois os artistas entraram no trailer para partir, porém, Michael ficou.
- Vamos - disse a gorda, batendo a porta do trailer.
- Espere - falou seu Italiano -, ainda falta Michael.
- Ele não vem. Vamos.
- Como assim, não vem?
- Vai embora com aquela menina... Como se chama mesmo? Ah, Penélope.
- Ora, eu soube que Penélope ia sair do circo, mas não sabia que ia com seu filho?
- Michael é como o pai, nunca consegui tirar as idéias malucas de sua cabeça e ele sempre acabou fazendo o que decidia... Mas enfim, vamos logo, antes que eu desça e traga Michael à força.
VOCÊS SÃO DO CIRCO!
Depois de meia hora de viagem, os circenses pararam numa lanchonete para comerem algo. A gorda, Lilie e as gêmeas sentaram-se numa mesinha e Gage e Richard em outra. Gage brincava com os palitos de dente no centro da mesa e seu Italiano aproximou-se e sentou junto a eles. Seu semblante era trsiste.
- Tenho medo, sabe - disse seu Italiano, olhando para os outros na outra mesa.
- Medo de quê? - perguntou Gage.
- Do circo acabar.
- O que você está dizendo? O circo não vai acabar!
- Vejam, primeiro se foi Lorde, então adeus mágico e domador e agora, se foi Michael, o menino do trampolim... Quem será o próximo?
- Eu não serei! - exclamou Richard, de boca cheia.
- Nem eu - falou Gage, fitando a bailarina - e espero que também não seja Lilie.
De supetão, Pulguento, que estava ao lado da cadeira de Gage, correu até o balcão e apanhou com a boca uma salsicha que o cozinheiro punha num prato sobre o balcão.
- Ei, seu vira-lata - gritava o cozinheiro -, traga isso aqui!
Pulguento obedeceu e levou a salsicha de volta, cheia de baba.
- Não... Pode ficar.
O cachorro pegou a salsicha e equilibrou no focinho, depois lançou-a para o alto e pegou com a boca e comeu.
- Mas que cachorrinho esperto! - falou o cozinheiro e recompensou o cachorro com mais uma salsicha.
- É, ele é bem esperto - disse Gage, indo até o balcão e fazendo carinho no animal.
- Ei, eu já te vi em algum lugar - o cozinheiro falou, olhando fixamente para o rosto de Gage.
- Não, eu juro que não fui eu quem assaltou sua lanchonete!
O cozinheiro pegou um cartaz do circo, que guardara numa gaveta e observou-o e em seguida, olhou novamente para Gage e também para a gorda e os demais.
- Espere, vocês... Vocês são do circo!
- É!
- Puxa! Nós aqui dessa cidade somos loucos para ver o circo aqui! Quando soubemos que vocês estavam em Campo Minado, torcemos para que trouxessem o circo para cá!
- E vocês gostam de circo? - perguntou Gage, enquanto os outros artistas observavam tudo lá da frente.
- Sim, muito! Eu, por exemplo, amo ir a circos! Quando eu era menino, meu pai me levou ao circo e lembro que fiquei fascinado com aqueles palhaços e suas roupas tão coloridas... Também tinha um homem que soltava fogo pela boca e eu sempre pensava que ele ia acabar tocando fogo no circo! Ha! Ha! Ha!
Nessa hora, Richard se encolheu na cadeira e seu Italiano caminhou até o balcão.
- Pois vocês tiveram sorte - disse Italiano -, porque o circo acabou de chegar nessa cidade.
Os circenses olharam para seu Italiano e sorriram e o cozinheiro, de tão feliz, deu saltos e abraçou a todos. Nem Gage, que era palhaço, já havia visto alguém tão feliz!
É HOJE, PESSOAL!
O carro de som do circo passeava pela cidade de Felicidade, anunciando a chegada do circo ali. Por onde ele passava, o pessoal se animava e as crianças curiosas subiam em cima dos muros e corriam pela rua, para ver Gage fantasiado de palhaço e Lilie com sua roupa de bailarina.
- É hoje, pessoal! - anunciava seu Italiano no alto-falante - o circo Atrazzioni chegou na cidade de Felicidade! E vai ter palhaço?
- Vai sim, senhor! - gritava Gage.
- E vai ter pipoca?
- Vai sim, senhor!
- E vai ter um idiota?
- Só o senhor!
- Venham, venham! O circo já chegou! É nessa noite, às 19:00h, o primeiro espetáculo na cidade de Felicidade!
- Eu estive pensando... - falava o palhaço para seu Italiano -, não deveríamos procurar outro mágico? Com certeza sentirão falta de mágica.
- E onde vamos encontrar um mágico como Lorde?
- Mas não precisa ser como ele! Pode ser um mágico bom mesmo.
- Ha! Ha! Ha! Mas Lorde era incrível... Nunca consegui descobrir como ele fazia pr'aquela laranja sair pelo umbigo.
- Ele usava uma cinta da cor da pele e rolava, disfarçadamente, a laranja por cima da camisa e ela descia até o umbigo e saía por um buraco da cinta.
- O quê? Mas isso não é mágica!
- Ha! Ha! E você acha que o Lorde sabe fazer mágica?
- Mesmo assim, ele era incrível... Conseguia enganar todo mundo! E no final, todos se perguntavam: como ele fez isso? Como fez aquilo?
- É verdade... Que falta faz Lorde.
Continua...