Loteria na Índia
Aquela multidão incalculável, suando em bicas sob o calor infernal, aguardando a extração da loteria. Na ordem decrescente: quinto prêmio, uma máquina de costura, manual. Longos minutos passam até que se identifique bilhete premiado. É de uma velhinha que, suarenta, subida ao palco, proclama, cheia de felicidade:
Vou costurar para toda a nossa Índia, ninguém mais será descamisado neste meu país! Aplaudida de pé.
Quarto prêmio, aquela mesma angústia da extração do quinto, e o premiado ganha um automóvel:
É um Hindustani 52, usado, glória da indústria automotiva indiana, que vai para um senhor, de turbante, barbudo, que anuncia a todos pulmões:
Vou percorrer o país de norte a sul e vou disputar a fórmula um e botar o Aírton Senna no chinelo!
Terceiro prêmio, aquela expectativa com os prêmios crescendo de valor:
E dá um avião, monomotor, maior conquista da tecnologia do país. O ganhador anuncia que fará a volta ao mundo e se deixarem, vai pousar na Lua.
Segundo prêmio, o populacho não consegue conter a tensão e a expectativa e todo mundo pensando num iate, ou coisa maior. E quando surge o vencedor, de bilhete à mão, eis que o apurador anuncia:
Quanta sorte e que honra, meu rapaz: o senhor foi galardoado com uma audiência com a Sra Presidente Indira Gandhi, diante de todos os seus ministros!
O moço que esperava algo mais material, naquele mundo dito tão espiritualizado, enegrecido de ódio, não se conteve e bradou a todos pulmões:
Foda-se Indira Gandhi!
Ao que o apurador, rapidamente deu-lhe o troco em tom de reprimenda:
Quanto açodamento, rapaz! Isso que aí disseste, impropriamente e fora de hora, é o prêmio exclusivo reservado ao primeiro lugar!