A INDULGÊNCIA DO DOUTOR JOÃO

E hoje senti que o doutor João exercitou a paciência de forma indulgente para toda a sua vida passada, presente e futura!

Era lá para as bem tantas do dia, já exaurido de ouvir, anotar examinar, diagnosticar, receitar explicar re-explicar , já no enésimo paciente e a queixa era :

" ô home, dá pra me vê agora?- nunca tive por aqui nesse lugar ...mas acabou minha injeção pro meu açúcar alto e quero que ocê me ajude".

Procedente a preocupaçao daquela paciente, porque parecia ser alguém diabético que precisava de insulina.

O médico a convidou para entrar e sentar, e fez algumas perguntas minimamente básicas, num diálogo que seguiu EXATAMENTE ao pé da escrita que segue:

-A senhora não é daqui da região dessa unidade de saúde?

-Sou...não senhor, sou de bem longe e meu médico de lá disse que morro se acabar minha injeção..que era pra mode eu pegá o remédio onde der pra pegar.

E começou a anotação na ficha.

-Mora onde?

-Lembro...não senhor.

-A senhora nasceu aonde?

-Sei... não senhor, é que nasci já faz muito tempo.

-Quanto anos tem?

-Lembro...não senhor.Acho que é 42.

-Ah quanto tempo tem diabetes?

-Sei quanto tempo...não senhor.

-O que sente?

-Sinto... nada não senhor.

-Tem a receita so seu médico?

-Tenho...não senhor.

O doutor não desistiu. Lutaria até o fim! Até ali tudo poderia não ser informado mas aquela paciente conseguiria tirar o doutor dos eixos do razoável...dali pra frente.

Bem, olhe, a senhora tem que se matricular na Unidade, precisamos abrir um prontuário. Ok, então só me diga qual insulina usa, como e quanto usa por dia?

-Ah! isso eu sei...não senhor, mas eu truxe minha filha que muito bem sabe tudo disso.

Então, ela levantou da cadeira, abriu a porta e gritou bem alto ao corredor de espera:

-Eita menina de Deus, larga esse mardito celular e vem cá que o hôme não pára de fazer pergunta e quer saber tudo de mim...

Doutor João suspirou fundo, rezou um pouco e eu ainda percebi que conseguiu forças para tentar esperançosamente concluir aquela tarefa árdua.

-Ô fia, vai, diz pra ele o que ele quer saber da mãe, do açúcar e da injeção que a mãe toma.

E ainda orgulhosamente explicou ao doutor:

-Esssa menina sabe tudinho de mim, pode perguntar tudo pra ela, hôme do céu...

E aquele doutor só podia ser do céu mesmo, alguém duvidaria?

Também notei que, dessa vez, doutor João fez um atalho e encurtou as perguntas:

-Olá, para eu fazer a receita para sua mãe, então SÓ me diga o nome da insulina, o horário e as unidades que a sua mãe utiliza.

E a garôta:

Sei nada disso não...dotô. Tudo isso... sei dizer não.

Aí a coisa pegou. Doutor João olhou pra mãe, ficou vermelho e perguntou:

-A senhora acha que eu trabalho com bola de cristal como um adivinho??

-Acho...não senhor.

Nota 1: verídico, porque eu vi.

Nota 2: que venham os médicos de Cuba e do mundo todo!