SANTADA X - PESCARIA NA BARRA

Quase todos os domingos eu ia com a família pescar nas praias da Barra no Rio de Janeiro. Até meu filho pescava e com uma concentração que era notada por todos os pescadores que diziam:

- Quando crescer será um grande pescador, se já nesta idade é assim, imaginem futuramente.

De fato ele apenas com quatro ou cinco anos gostava de pegar alguns peixinhos para brincar. Eu tinha feito amizade com os pescadores daquele local que eram todos da zona norte do Rio. Formamos um bom grupo que pescava e “lanchava” com bastante cerveja o dia todo. Quando eu não levava lanche, pescava até umas 13:00 horas e depois íamos almoçar no shopping. O comentário geral era que se pescava para passar o tempo, porque peixe mesmo estava muito difícil, vez ou outra um sortudo apanhava um pampo ou uma perna de moça que lá é conhecido por papa-terra, fora estes, outros raramente eram apanhados, mesmo assim pequenos, menores de trinta centímetros.

A praia naquele ponto é rasa, apresentando algumas depressões, de forma que se entrava no mar uns cinqüenta metros para fazer o lançamento e depois voltar para a praia e esperar pelo puxão. Quanto maior a habilidade e a força, maior era o comprimento da linha e maiores eram as chances de se pegar algum peixe além da arrebentação.

Num desses domingos, depois de vários lançamentos, após o refluxo, recebi um puxão, a vara envergou, o molinete cantou, ajustei a fricção do molinete e entrei na água com nível acima da cintura. Os pescadores pararam e também entraram na água para me ajudar.

- Paulista, dê linha. Não perca esse peixe. Esse tamanho é coisa rara. Canse esse peixe. Diziam.

Notei algo estranho. Toda vez que vinha o fluxo, a pressão diminuía e eu conseguia enrolar a linha para depois soltá-la no refluxo. O pessoal caminhava junto comigo. Os mais afoitos já estavam à frente. O peixe estava bem fisgado, a linha 0,50 era bem resistente, de forma que tínhamos que cansar o “monstro”. E era o que agente fazia.

Na praia a expectativa era geral, formou-se um aglomerado, gente que não estava no pedaço afluiu para lá. Na água estavam mais de dez pescadores para pegar o peixe à unha, se preciso fosse.

Outra coisa estranha que notei. Puxava com bastante força, mais não havia vibração que é o que apaixona o pescador. Não sei quanto tempo fiquei naquele puxa e enrola. A euforia dos demais pescadores era maior que a minha. Era medo que a linha quebrasse, então vinham os conselhos:

- Não force, dê linha, etc. Teve um que segurou na vara o disse:

- É tesão demais, esse bicho é um monstro, por Deus não perca esse peixe!!!

Finalmente, a uns vinte metros, visualizamos o “monstro”. Era branco e tinha mais de um metro. Naquele ponto raso, todos correram para segurar o peixe. Quando seguraram o “peixe” só foram ouvidos palavrões. Enrolei a linha rapidamente seguindo em direção. Quando cheguei os pescadores disseram:

- O troféu é seu Paulista!!!

Enorme foi a minha decepção. Não era peixe. Era uma saia branca, daquelas que as macumbeiras vestem. Como foi aparecer lá é um mistério. Será que alguma mulher quis fazer a purificação e se despiu? Há um ditado que diz: “O maior peixe do mundo ainda não foi pescado, mas já esteve no anzol de todo pescador”. No meu esteve, mas eu pesquei uma saia. Acho que é um caso único na literatura da haliêutica. Veio muito consolo e gozação. Ninguém se conformava com o acontecido. A pescaria deve ter tido uma hora de paralisação. O que não faltou foi expectativa. Ainda tenho esperança de pescar um peixe daquele tamanho, desde que seja peixe mesmo.

Foi localizada uma inscrição na região do antigo império Assírio (estima-se que foi escrita 300 anos antes de Cristo, cujo texto dizia: “Deus não conta em nossas vidas o tempo que passamos pescando”. Infelizmente, esse crédito eu não ganhei, não pesquei.

Ah! Lembrei. O meu filho cresceu, mas não se tornou um grande pescador. Não pesca. Não sofrerá decepções.

SANTO BRONZATO
Enviado por SANTO BRONZATO em 11/05/2014
Reeditado em 13/05/2014
Código do texto: T4802706
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