MOMENTO “PISCÃO” – VAPAPU!!! O QUE FAZ UM URUBU

A partida estava prevista para as sete horas da manhã de um domingo, dia 17 de janeiro de 1970. Eu e um colega de trabalho iríamos fazer uma auditoria em Rondônia, numa companhia de mineração. No mesmo voo conhecemos dois engenheiros, um elétrico e outro mecânico que para lá também iam trabalhar, já contratados pela companhia.

O voo partiu às 11:00 horas. Quatro horas atrasado. Um passageiro que embarcou no Rio teve um ataque cardíaco quando já sobrevoava São Paulo. O avião retornou ao Rio, desembarcou o passageiro e voltou a São Paulo. Partindo de São Paulo, uma das escalas foi no aeroporto de Urubupungá. O aeroporto era no meio de um canavial que foi roçado com a ponta de uma das asas quando o avião fez uma manobra. Deu para dar um “piscão”. Logo partiu, afinal precisava tirar o atraso. O meu colega olhou para mim e disse:

- Não estou bem. Esse “barbeiro” (o piloto) é um fdp e começou a vomitar. Encheu um saco, dois, três.... O avião balançava, sacudia, outros começaram a vomitar também. As comissárias não venciam atender aos necessitados. Elas trombavam com outros que estavam no corredor. Ainda bem que havia um bom estoque de “bags”. Quem não estava com vômitos, tinha um paciente para cuidar. Metade dos passageiros estava passando mal.

O medo de que acontecesse o pior estava estampado no rosto de todos os passageiros. O avião “lambia” os canaviais. Perguntei a uma das comissárias porque estava acontecendo aquilo e a resposta foi:

– Isto é normal, estamos voando abaixo da altura dos urubus, assim que passarmos esta zona de urubus, ganharemos altura e o avião ganhará estabilidade.

Havia passageiro que já não tinha nada no estômago e a roupa estava molhada (não sei se era adrenalina ou urina - ainda bem que outros odores não eram sentidos). O pânico tomava conta de alguns, não faltaram aqueles que caíram em desespero.

–“A coisa está feia, está preta, quem não for filho de Deus, está na unha do capeta”.

O avião era um YS-11 – Turbo hélice da antiga Cruzeiro do Sul – dois passageiros em cada lado. Cabiam umas 60 pessoas e estava lotado. As turbinas vibravam e rosnavam, estava bem pesado e precisava de toda potência para voar baixo, mas graças a Deus o sufoco estava terminando. O avião levantou o bico e começou a ganhar altitude. Fim dos “piscões”, parou de balançar. O meu colega encostou a cabeça na janela e respirou aliviado. Sua cor era indefinida. Ia do branco cadavérico ao amarelo diarreico. Cinto solto, camisa aberta, sem sapatos e molhado. Estava fraco e nada queria ingerir com medo de recomeçar a passar mal. A situação de outros passageiros não era diferente. Parecia um avião transportando flagelados, aqueles doentes subnutridos, sobreviventes de tragédias. Pensei:

“Vápapu, o que faz um urubu”!

Aquela paz foi efêmera. Foi anunciado para apertar os cintos, etc. etc. que iríamos descer em Campo Grande. Alguns disseram graças a Deus, mal sabiam. O aeroporto era de terra batida. Quando o avião tocou o chão, houve um bombardeio de pedregulho na fuselagem que assustou até quem não estava assustado, mais piscões, mas enfim estávamos em terra. Parada de apenas 15 minutos. O comandante olhou para o meu colega e disse:

- O senhor fica aqui no avião, a temperatura é de 35 graus, e isso não lhe fará bem.

Quem quisesse comer alguma coisa, pediria no restaurante um lanche e comeria no avião, estávamos muito atrasados e o aeroporto de Porto Velho (como tantos outros na época) não permitia pouso após as 17:00 horas. Foram os 15 minutos mais rápidos que passaram. Mal deu tempo de pedir um lanche e ir ao sanitário.

Eu já tinha perdido a noção do horário. O trecho entre Campo Grande e Cuiabá transcorreu sem incidentes. Aí veio a surpresa. Iríamos pernoitar em Cuiabá, pois não daria tempo para chegar a Porto Velho antes das 17:00 horas. A viagem continuaria na segunda feira às 6:00 horas da manhã.

Piscão= contração dos dois esfincteres

SANTO BRONZATO em 15/01/2.014.

Aguardem a continuação - MOMENTO “PISCÃO” II – A TEMPESTADE

SANTO BRONZATO
Enviado por SANTO BRONZATO em 15/01/2014
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