Após ler o cartaz:
JF
O Advogado das Causas Possíveis
O Advogado das Causas Possíveis
Maria da Inocência, uma simpática velhinha aposentada, não pensou duas vezes, adentrou o local.
Depois de aguardar quinze minutos, a secretária indicou a entrada da sala onde JF a atenderia.
_ Olá! O senhor é o JF?
_ Eu mesmo, em que posso ajudar?
_ Antes de responder, posso fazer uma pergunta?
_ Vou permitir três indagações, pois a senhora terminou de realizar a segunda.
_ Está correto! Por que o senhor afirma que é o advogado das causas possíveis?
_ O que tem de errado nessa propaganda?
_ Seria melhor dizer que é o advogado das causas impossíveis.
_ Se a causa é impossível, não possui solução. Eu só consigo resolver questões difíceis, muito complicadas, aparentemente insolúveis, porém possíveis. Concorda comigo?
_ Perfeito! Uma outra curiosidade, a quarta pergunta, JF significa o quê?
_ João do Feijão à sua disposição.
_ Senhor JF, um rico empresário me acusa injustamente de roubo.
_ Me conte todos os fatos, não esconda nada.
_ Eu fui comprar minha lingüicinha calabresa predileta, escolhi cinco unidades. Na hora de pagar, a caixa ficou na dúvida sobre o valor que a placa indicava, eu não recordava, aí observei a cara das lingüiças, avaliei a aparência meio pálida, considerei a forma magrinha, disse “Deve ser um real cada uma”. A caixa não conferiu, digitou esse preço. Dois dias depois um oficial de justiça surgiu na minha porta com uma intimação. O preço verdadeiro era o dobro do valor o qual sugeri, me acusam de furto deliberado.
_ Fiquei curioso, Dona Maria. A lingüiça a senhora enfiou onde?
_ Eu enfiei na salada, lasanha e macarronada, mas senti uma grande vontade de mandar enfiar...
_ Calma! Não precisa ser tão detalhista. Por favor, prossiga a narração que interrompi!
_ Houve duas audiências. Na última, o dono da loja, Macedão do Lucro, exigiu uma indenização de cinqüenta mil. Eu expliquei que sou uma aposentada, não adiantou.
_ O que o Macedão disse?
_ Disse sem emoções que era comigo, Roberto Carlos e as baleias.
_ Falando sério?
_ Sim! Eu expliquei que vivo chutando lata, que meu marido era caminhoneiro, porém seu corpo hoje está cansado, por isso ele não trabalha mais. Ele me disse adeus, pediu silêncio, não quis ouvir outra vez.
_ Quanta insensatez! Esse homem é um tolo.
_ Em casa chorei muito, mas o meu marido me consolou. Apesar do gostosão não ter mais 20 e poucos anos, ele ainda diz senta aqui. A gente brinca demais de caça e caçador, sabia?
_ Fico feliz sabendo disso, mas a senhora misturou os cantores.
_ Perdão!
_ Quando será a audiência final?
_ Daqui a sete dias. O senhor pode me ajudar?
_ Claro! Se a senhora me pagar uma feijoada, ganho a causa.
_ Como o senhor pretende conseguir?
_ O segredo é a alma do negócio. Topa ou não?
_ Se o senhor garante, a feijoada sai. Com lingüiça?
_ Bastante lingüiça! Eu quase esqueci de perguntar, quem é o advogado do Macedão?
_ É um tal de JQ.
_ JQ?
_ Sim, João Querograna.
_ Para encerrar, a senhora gostou da lingüiça?
_ Gostei demais, no entanto detestei o fato dela estar dobrada.
_ Dobrada?
_ Sim! O preço estava dobrado.
_ Ah! Nos vemos na audiência, Dona Maria!
No dia da audiência, JQ ficou preocupado, pois JF, conforme os colegas comentavam, jamais perdia uma causa.
O juiz pediu que a acusação apresentasse suas testemunhas e fizesse a exposição justificando a indenização solicitada.
JQ convocou seis testemunhas.
Além da caixa, testemunharam Macedão, uma mulher que também comprou lingüiças naquele horário, o segurança do mercado que pagou a diferença no lugar da caixa (depois a caixa compensou num motel barato), Basílio, o primo do empacotador, e o empacotador.
Depois disso, JQ, durante trinta minutos, destacou todos os argumentos na tentativa de convencer o juiz.
Ele gentilmente sugeriu que Dona Maria pagasse o débito realizando vários empréstimos bancários sem deixar de utilizar a poupança azul da Caixa a qual passaria a ficar vermelha.
O juiz pediu que JF trouxesse suas testemunhas, mas ele não tinha ninguém para testemunhar.
_ Senhor JF, eu espero que a sua defesa seja brilhante. Resumindo os fatos, a senhora Maria da Inocência procurou, naquela tarde, algumas lingüiças da sua marca predileta, escolheu cinco unidades e ludibriou a caixa indicando um valor correspondente à metade do preço real. Preferindo não ter testemunhas, como o senhor pode contestar essa grave infração?
_ Simples demais, meritíssimo!
_ Simples?
_ Minha cliente pagou o preço correto, a metade do valor.
_ Queira esclarecer, nobre JF.
_ As lingüiças Sadias custavam dois reais.
_ Sim, e daí?
_ Ela levou cinco unidades doentes.
***