Gramaticando

Não é segredo algum que eu sou uma amante passional da gramática da língua portuguesa. E esse meu fascínio faz com que eu tenha um profundo respeito pelas suas regras e figuras, tão mal faladas e mal-ditas pela população regida por ela. Além de respeitar, eu sigo, cumpro e obedeço essas regras, como verdadeiras leis. Afirmo aqui, sem titubear, que a gramática é a minha segunda Constituição. E nesse mundo de figuras linguísticas e classificações que eu tanto adoro, acabo por passar por situações um tanto cômicas. É o preço que se paga em ser muito prolixa, num país onde povo é amestrado para ser disléxico.

E por falar em ser prolixa, uma vez estava eu em uma roda de tereré com as vizinhas e falávamos sobre as manifestações do mês de junho deste ano, e acho que proferi uma frase em Português, mas que elas juraram que era Grego, porque me olharam como se eu fosse um verdadeiro extra-terrestre. Expliquei de uma maneira mais popular, pedi desculpas e confessei que eu sou realmente muito prolixa. Aí a coisa ficou séria! A mais velha da roda tapou os ouvidos da neta, fez o sinal da cruz três vezes e me disse para procurar Jesus, que só ele iria me salvar de uma heresia dessas!

Outra vez, na sala de espera de um consultório médico, eu estava distraída, escrevendo um poema no editor de mensagens do meu celular, quando uma conhecida, que por acaso ali se encontrava, perguntou-me para quem eu tanto mandava mensagem. Eu mostrei a ela, que um tanto confusa, disse-me: “Até ficou bom, mas tem algumas frases invertidas, não tem?” E eu, sem conseguir me controlar expliquei-lhe que eu tinha mesmo esse vício, de abusar dos hipérbatos. Ela deu um sorriso amarelo, sentou-se do outro lado e não falou mais comigo. E neste mesmo dia, alguém ligou anonimamente para a minha mãe, dizendo-lhe que eu estava viciada em drogas! Ainda bem que ela me conhece, né?

E assim eu sigo, incompreendida e mal interpretada. Inventei de dizer a uma amiga que eu andava muito metonímica e ela me marcou uma consulta com um psiquiatra, confessei minha atração por sinédoques a um primo, e ele me chamou de pervertida! Disse ao vizinho que a carta que ele recebera era metafórica e ele deitou no chão, achando que ela fosse explodir. O pior é que essas palavras todas me parecem tão lindas e corriqueiras, que me é natural utilizá-las, escrevê-las, dizê-las, fazê-las ganhar vida... e continuarei, com essa naturalidade toda, eternamente, gramaticando!

Mi Guerra
Enviado por Mi Guerra em 22/08/2013
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