AMOR, ACENDA A LAREIRA...

Garçom encha a minha banheira de gelo...

Camareira traga-me um balde de água...

gelada...

o termômetro marca 40 graus abaixo de zero, mas estou com um calor danado...

Mordomo abra a porta, atenda o carteiro, ele está me trazendo um copo de gim...

A baby-sitter prepara minha mamadeira

e o governo prometeu que não vai mais roubar o meu dinheiro...

Lobos traiçoeiros uivam soltos no quintal da fazenda,

acho que vou caçar uns patos

ou quem sabe talvez botar pra quebrar em algum boteco de beira de estrada...

Acabei de tomar o meu copo de whisky,

meu charuto ficou preso no cinzeiro

a fumaça sobe e desce...

Dentro da minha cabeça...

Dentro da minha cabeça há aquele algo mais...

apenas aquele algo mais que ninguém conseguiu explicar até agora...

ou talvez algo menos... quem sabe?

O psiquiatra resolveu se internar para curar suas maluquices...

o cofre continua lacrado, resolveu se rebelar, disse que não abrirá pra mais ninguém,

disse que está com frio e que prefere ficar no fundo da lareira

porque lá a neve é um pouco mais quente

a estante toca piano na lombada dos livros... ah... que doce melodia...

no quadro, no alto da parede, quase no teto, Van Gogh toca violino,

disse que não quer pintar mais nada,

só pintou o violino porque queria tocar uma música...

puta merda, o desgraçado cortou a orelha do meu coelho...

preciso tomar cuidado senão ele vai querer cortar o meu pau...

esse louco... louco...

Louco sou eu que acordo de manhã e vou pro trabalho

quando poderia ser político ou algo parecido...

Preciso pintar um quadro senão o sol não vai nascer,

a lua hoje estava cheia mas alguém furou o meu balão de festa.

Nas docas o meu navio está atracado, o convés lotado de sardinhas,

logo elas irão içar as velas e partir rumo aos mares do sul,

talvez cruzar o deserto do Saara, o sol nas velas e as areias servindo de guia...

pena que não me convidaram para a viagem...

mas lhes mandarei cartões postais com as fotos da minha sala de estar,

creio que irão gostar...

enquanto isso eu esquio um pouco na cobertura desse bolo

que minha mulher preparou para o chá das cinco... ah... é tão excitante...

ver que você não me esqueceu depois do que aconteceu na semana que vem...

como eu gostaria de ver a sua cara agora, no escuro,

sob a luz de uma vela que ainda nem foi fabricada... ah...

como é bom esse poder de conseguir estar em tudo ao mesmo tempo...

ver, ouvir e saber tudo ao mesmo tempo...

mesmo sem querer e nem precisar saber de nada...

Tudo isso por que o meu chuveiro se recusa

a aquecer na hora do banho, numa noite fria...

o couro velho do meu corpo todo molhado...

o que me resta é tocar meu violão, deitado na cama, nú,

minha esposa ao meu lado me dando conselhos

de como ser um bom marido... será que já não sou???

...minha aliança derreteu e agora está incrustada no osso de meu dedo anelar...

Tomara que o meu esqueleto se transforme em ouro,

quem sabe eu consiga vender uma unha e tomar algum dinheiro do cofre de alguém?!

O trem a vapor cruza a planície agora, ritmado como um blues,

fumegando e apitando, trazendo o Papai Noel

pois as renas tiraram férias de um mês...

o saco ele não trouxe, talvez porque ele sabe que eu já tenho o meu...

eu já distribuí os meus presentes, eles estão por aí, em algum lugar...

minha árvore de Natal incendiou-se, lá se foi a Estrela de Belém...

mas tudo bem, vamos esperar o Ano Novo... de novo!!!

Puta-que-o-pariu... esse negócio não termina nunca!!! Porra meu... que papo louco cara...

É isso que dá... ouvir blues chupando gelinho de gengibre...

Tá pensando que aqui é onde... New Orleans???

Não, eu só fumo no Narguilé... mas tem de ser “do bom” senão não rola “véio”...

mas na real, sem maldade, eu prefiro ficar de cara mesmo, não gosto de máscaras...

Garçom traga-me uma dose de leite, a baby-sitter já preparou o meu Bourbon...

Roberto Carlos Braz do Nascimento

(Roberto Braza)

(Bob Santo Daime)

27/07/2013

14:26h

ROBERTO BRAZA
Enviado por ROBERTO BRAZA em 27/07/2013
Reeditado em 15/08/2016
Código do texto: T4407109
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