O papagaio da prefeitura de Guanhabuzamba
As visitas recebidas no gabinete do prefeito de Guanhabuzamba (cidade fictícia) ficavam surpreendidas com a presença de um papagaio empoleirado junto à janela da sala.
- Uai, o senhor tem um papagaio aqui?
E o prefeito sempre gostava de contar a mesma estória. Que o Psitacídeo era oferta de um amigo e partidário, e desde filhote manteve-o ali por mera distração e decoração do ambiente.
Entre uma assinatura de um despacho e telefonemas, o prefeito de Guanhabuzamba levantava-se da cadeira e tratava do animal trocando-lhe a água, a fruta e sementes de girassol. Limpar a plataforma de zinco onde caiam os dejetos da ave, isso deixava para um ou outro assistente fazer. Em seu inconsciente havia aprendido que um prefeito nunca suja as mãos em merda; deixa para outros fazerem por ele.
O papagaio foi crescendo e aprendeu a repetir palavras que ouvia no gabinete, o que gerava ainda mais graça e folclore. Um vereador do partido sugeriu que lhe ensinasse o gingle da campanha eleitoral para que pudessem aproveitar nos palanques e animar os comícios futuros.
- Doutor, vou lhe dizer. Esse papagaio ainda vai nos trazer votos. Guarde o que estou lhe dizendo.
Até que um dia o prefeito entrou de manhã em seu gabinete e deu pela falta do papagaio. O pássaro havia desaparecido, alçando voo pela janela deixada aberta na noite anterior. O autarca ligou para as repartições da Polícia Florestal e IBAMA dando notícia do desaparecimento pedindo alguma atenção pelo caso. Destacou três agentes da prefeitura para que pudessem percorrer o município em busca da ave, mas foi improdutivo. O verde bicudo não deu mais notícias. Caso encerrado.
No ano seguinte, trabalhei para o IBGE percorrendo um complexo de casas populares realizando o CENSO DEMOGRÁFICO. Numa destas moradias entrevistei uma senhora idosa que vivia em sua casinha humilde com uma horta ao fundo. Reparei que num pé de jabuticaba estava um papagaio bicando as frutas se satisfazendo, alegre da vida.
- Que bonitinho aquele papagaio! É da senhora mesmo? – perguntei.
A dona com lenço na cabeça, vestido de chita e chinelos havaianas respondeu-me.
- É, meu fio … ele apareceu aqui no ano passado e nunca mais quis sair. Eu acho que ele era de algum pastor de igreja pois vive repetindo uma coisa qualquer de uma comissão de 10 %. Vá lá saber o que é , né… deixa ele…
Apertei os olhos e reconheci o papagaio. Era o da prefeitura. Mas pelo amor que aquela senhora nutria pelo bicho, nunca contei isto a ninguém. E foi menos um circo nos palanques.
©dalmirlott