GRANDE SERTÃO.... SERTÃO..... SER TÃO... SERTÃO
Seu dotô, seu Fofó de Belém, começo aqui minha históra. Meu nome é Creuzo de Tomba-Burro. Sou jagunço das Gerais, da terra de seu Tiradentes, que o Criador o tenha nos infinirtos dos aléns. Sou jagunço por opção, já que o meu querido pai tinha posses, era homem de ouro, prata e niquer. Decidi ser jagunço porque via muita cosia errada. Mas, seu doto, esses sertão que me abrigaram me fizeram homem rude e frio. Esse sertão transforma as pessoas. Esse sertão dos chupins tomando orvalho das foia de mato pela manhã. Esse sertão dos caga-sebo catando semente dos fedegosos espaiado. Seu doto, nesses sertão de necessidade, de procurá moita pro despacho, de errar a folha certa e pegar folha de urtiga enganado. Aí o sertanejo ta aperriado. Essa vida é coisa inexplicável, quem ganha dinheiro é dono de funerária. Mas já vi muito dono de funerária ir à falência por fiado do defunto. Esse sertão é coisa de inigualáver sabedoria. Quem sabe não conta e quem não sabe também não conta. Cachorro cheira o traseiro do outro em sinal de amizade, se houver rejeição, ou se o cheiro não agradar, a circunstância sempre acaba em desavença. Tem cachorro no sertão que não gosta que cheirem o seu traseiro, cachorro esse de rabo grosso. Conto isso, seu doto Fofó de Belém, porque segui muito tempo o bando de Horácio da Cucuia. Enfrentamos noites dormidas no relento. Nóis não tinha hoter cinco estrelas, mas sim hoter “todas as estrelas”. O céu era nosso cobertor e a grama nossa cama. Quantos criu-criu dos grilos, crau-crau de gafanhotos, e creu-créu dos xexéus. Tinha um amigo do peito: Dioguinho Lava-toba. Lava-toba eram aquelas liberulas que fica voando rasante nas cerca de currais, e na menor poça sobrada da chuva, vão lá e passam voando bem baixo, deixando o traseiro bater na água. Então Dioguinho pegou o apelido. O que nós enfrentamos não ta escrito. Na Fazenda Chifre Cruzado, o tiroteio foi pra lá de tenso com o bando de Sinofredo Faisca de Binga. Era tantas as balas que chegaram a colocar semarforo nos cruzamento pra ter o controle das balas. Foi então que conseguimos por a mão em Sinofredo Faísca de Binga. Fizemos uma roda e dali começou o julgamento do sanguinário, do abutre. Pois ele tinha o apelido de “abutre do sertão”, porque só se aproveitava das carcaças caídas e sem vida. Começou o julgamento. O nosso líder Horácio das Cucuia disse com voz firme prele: “Pois conte tudo pra nóis o que você tem guardado aí dentro.” O jagunço velho, líder do bando contrário, Sinofredo Faísca de Binga mordeu o beiço com seus dentes de cavalo e seus olhos pareciam moendas de cana. Então o jagunço começou: “Voceis querem saber o que guardo aqui dentro. Deixa-me ver: estomago, pâncreas, fígado, baço, rins, tripas e outras coisas que agora não lembro...” O julgamento durou cerca de duas horas. Terminou com todos concordando que o líder bandoleiro teria que dançar a dança da boquinha da garrafa e depois seguiria o seu caminho pelo sertão. O sertão é implacável com os desavisados, o sertão das cotia em cio, esperando o macho da cotia pro encontro nupciar. Já o gato do mato espera o encontro nupciar das cotias pra garantir o jantar. Cotia gorda eleva o nível de colesterol ruim dos gatos do mato, mas os gatos do mato não querem saber disso. E é possível encontrar gatos do mato mortos sem propósito pelos descampados. Sinofredo Faísca de Binga teve um fim triste. Pegou uma bactéria incurável depois de comer um pastel de feira estragado. Claro que se o senhor perguntar tínhamos necessidade de mulher, claro. A gente se aliviava com a Gervira, uma moça grandona da venda do seu Joaquim Bafo Feio. Gervira era grandona, mas sem bunda, corria pelo sertão o apelido de Gervira Bunda-Mucha, quando seu nome era citado, até os urubus viravam o pescoço pra sorrir escondido. Mas eu, Creuzo de Tomba-Burro tinha um amor querenciado pras bandas do Empina Bucho. Severina, moça feita nos moldes divinos. Só podia porque o pai era mais feio que um canhão e a mãe mais feia que furúnculo na bunda. Nos conhecemos atrás de um bananal no fim da ladeira do padre Ambrósio. O pai dela não gostou de saber que nos conhecemos atrás do bananal. Seu Matusquela ficou furioso, ameaçou pegar em arma. Tinha um trabuco pendurado na parede da sala. Severina explicou pro Cata-Piolho que não era nada disso que ele estava pensando. Disse pro velho Saco de Bode que eu era moço respeitador, porque a cabaça continuava cabaça. Mas, na verdade, a cabaça era referente a uma moita de cabaçal, quer dizer que não havíamos pisado em nenhuma cabaça. O velho se aquietou, mas não deixou de olhar de rabo-de-zóio um só segundo pra nóis. Um olhada em nóis e outra no trabuco espanta-rola, pendurado na parede. Mas senhor doto Fofó de Belém, antes de eu parar nessa vida ainda houve tiroteio numa emboscada no canal do Córgo Rabo de Boi. Quase perdi a vida, ou a vida me perdeu, tive uma bala encravada na perna. Por isso de eu andar de saltado. Mas o sertão é imprevisível. O sertão é casa de sertanejo, de jagunço foragido, de coiote, de anta, de cavalo perdido, de tamanduá, de assanha-bago, de coacho de sapo-cururu, de rasto de onça pintada, de cheiro de mijo de gato pardo(isso tudo ovoce pode encontrá na barraquinha do Biguinha da feira, num CD som do sertão) . O sertão ensina, doto, mas se não aprende a lição é chicoteado pelo destino. Seu doto, prum home que sabia o manejo da pistola com destreza hoje perdeu o controle do mijo. E outro inconveniente que não contei, mas carece de contar. Lembra do meu amigo Dioguinho Lava-Toba? Decobri que era apaixonado por mim. Quando sube disso me deu uma ingrisia de sentimentos. O que fazer então? Já não chega uma vez que um tal de Lili Largatixa se encafifo comigo e foi dificer de desatá esse nó de amor na cabeça dela, quase tive de partir pra outras bandas de madrugada. E desfeito esse tar laço sentimentar vem esse outro: ser gostado por home? Deu um descontrole geral nos meus pensamentos. Até as minhas lombrigas ficaram em desatino. Minhas idéias parecia boiada sem aprumo, em disparada pro meio do agreste do sertão e um boiadeiro magrelo correndo atrás tentando detê-las. Porém naquele tiroteio no canal Córgo Rabo de Boi, Dioguinho Lava-Toba levou um tiro trifatal. Agoniando no meio de um capinzal Rabo de Burro, ele teve forças de balbuciar: “Creuzo, eu não sou homem. Sou mulher.” Ouvi falar que muitos valentões nas vias da morte, se tornam mulher. Não sabia mais em quem confiar. Ou nas palavras do jagunço Lava-Toba ou nas culturas que regam nossas idéias. Mas em seguida que o médico do Arraial dos Balaios despiu o jagunço pro preparo pra ultima condolências, descobriu-se que não tinha memo as partes principar de um home. Mas memo assim alguns outros jagunços chegaram a comentar talvez da falta de mistura em casa, e a mulher na fúria, fez o berimbau do valentão com farinha. Pois o sertão é cruel, é implacável com os desavisados. E nesse meu esperar pela última hora vou vendo pela janela os pirilampo, os caga-luz, voando lá fora. Por fim é só isso, seu doto.