O Bombom da ......... macumba?(primeira parte)
Carlos e Carlinhos são amigos inseparáveis.É o tipo de amizade que,dizem os espíritas,costuma repetir-se por inúmeras encarnações.Carlos é alto,espadaúdo,já carlinhos,como o diminutivo faz supor,é baixo e franzino.Além da amizade,ambos tem em comum o nome,a idade,quinze anos,e um apetite de fazer inveja à Rei momo.
Certa vez,quando os dois voltavam do colégio,por volta do meio dia(ambos estudavam de manhã),Carlinhos reparou num objeto que estava rente ao meio fio da calçada.Tinha forma retangular,e era pouco menor que uma caixa de sapatos.O pacote estava embrulhado num vistoso papel azul,e era adornado com um elegante laço grená.
Movidos pela curiosidade,a dupla desfez o laço,rasgou o papel e,maravilhados,depararam-se com uma caixa de bombons finos,pertencentes à uma marca conhecida mundialmente.A divisão do chocolate já ia ser feita,quando, ao olhar mais atentamente em volta,os adolescentes acharam também,rente ao meio fio,duas velas vermelhas,apagadas e gastas pela metade.Além disso,o local onde estavam,era formado pelo cruzamento em noventa graus de duas ruas,que é vulgarmente conhecido como......encruzilhada!Por mais estranho que podia parecer,havia uma grande chance daqueles inocentes bombons fazerem parte de um.....despacho!!
Começou um dilema cruel para os comilões:Satifazer a gula,e correr o risco de serem vítimas de forças ocultas,ou deixar a caixa lá, para provavelmente ser devorada por pombos,cães de rua ou mendigos.Após pesarem os prós e contras da situação,resolveram arriscar suas almas.Dividiram os bombons meio a meio e foram embora.
Carlos chegou em casa,jogou a mochila em cima da cama,e começou a ler uma revista em quadrinhos do Hulk ,seu herói preferido.A cada página,eram três bombons mastigados. Em pouco tempo,todo aquele chocolate já estava no seu estômago.Enquanto isso,Carlinhos tomava banho em sua casa.Debaixo do líquido refrescante,o menino planejava o jeito apropriado de ingerir a fina iguaria de cacau e leite.Resolveu,então,adiar o prazer gastronômico para à noite,durante a transmissão do jogo do Flamengo,seu time de coração.Por volta dos trinta minutos do primeiro tempo,o doce havia sido prazeirosamente ingerido.
No dia seguinte,nenhum dos dois foi à escola,pois estavam com um tremendo "piriri",indo ao banheiro o tempo todo.Carlinhos,mais "cerebral",tomou logo um remédio para diarréia,que aliviou os sintomas.Carlos,que era facilmente impressionável,conseguiu um encaixe de horário com seu médico.O doutor receitou um fármaco semelhante ao que Carlinhos escolhera,e,assim,ojovem ansioso também melhorou.
Quando encontraram-se,no dia seguinte,Carlos estava cismado com o mal estar mútuo,mas Carlinhos minimizou o ocorrido,dizendo que,provavelmaente,a enfermidade havia sido causada pelo calor "africano",que dificultou a digestão.
Tudo voltaria ao normal,não fosse a incrível sequência de acontecimentos desagradáveis,ocorridos com a dupla nas semanas seguintes,a saber:Carlos quase foi atropelado em frente a escola,por um carro que avançou o sinal;Perdeu a vaga de goleiro titular do time da sua sala;Foi assaltado duas vezes no mesmo dia;de manhã,no ônibus,e,à tarde, em frente ao cursinho de inglês,e teve de fazer um tratamento de canal inesperado,pois um dente seu começou a doer e não parou mais.Já Carlinhos, tomou um "fora" da namorada,perdeu sua carteira,com a mesada do mês inteiro dentro,e teve uma apêndicite fulminante,que o obrigou a ser operado com urgência,ficando uma semana em casa.Para completar,ambos tiraram nota vermelha em matemática,sendo obrigados a fazer prova final,numa matéria em que contavam passar direto.
Assim que Carlinhos recuperou-se,Carlos marcou uma "reunião"com o amigo,para tentarem achar uma saída daquele"mato sem cachorro".Resolveram encontrar-se na casa de Carlos,pois teriam maior privacidade,já que os pais do jovem iriam estar fora de casa durante a tarde.Sentaram no jardim,esperando que todo aquele verde os inspirasse.Carlos começou seu discurso.Estava nervoso:
___Sei que você não acredita nessas coisas Carlinhos,mas tem algo acontecendo com a gente......isso não é normal!!
___Olha, eu realmente não acredito.....(respondeu,sem muita convicção,Carlinhos,enquanto colocava a mão no local da operação).
___Eu quase morro atropelado,seu apêndice fica "podre" de uma hora para outra,meu dente...sua namorada....a nota baixa em matemática.Eu não sou muito bom com números,mas você......você é cobra no assunto!!!(havia desespero em sua voz)
___Teve o assalto......(completou a lista de martírio, Carlinhos).
___Isso,isso mesmo....a bosta dos assaltos.....foram dois...e no mesmo dia !!!
___Tenho que concordar,é muita coisa junta.....(a fortaleza intelectual de Carlinhos estava por desabar).
___Nós temos que fazer alguma coisa!!!!!(Ao mesmo tempo que falava,quase gritando,Carlos deu um soco na mesa de vime,em torno da qual estavam reunidos.Com o impacto,o vaso de flores que decorava o móvel caiu, sujando o chão de terra e cacos de cerâmica).
___ Desespero não vai adiantar nada,Carlos!(Carlinhos tentava mais uma vez recuperar o controle).
___ Desespero?,que desespero?isso é encosto,meu amigo!!!!!(Carlos olhava fixamente para o vaso quebrado).
Neste momento,os rapazes notaram a presença de seu Renalvo,encostado no portão da frente.O idoso era quase uma lenda no bairro;Ninguém sabia onde ele morava,vivia de biscates,e tinha mais de setenta anos.Às vezes sumia por uns tempos,reaparecendo meses depois procurando serviço.Como era conhecido por todos,logo arrumava ocupação.Sem nenhuma cerimônia,fumando um cigarro feito à mão,falou para os jovens:
___ Desde o dia em que vi vocês pegarem a caixa de doces na esquina,tenho acompanhado o padecimento dos dois.....(o ancião tinha uma voz baixa,mas firme,de quem sabe o que fala).
___ Que padecimento?(a dupla perguntou,ao mesmo tempo).
___ Não adianta esconder a verdade....ela sempre aparece......(o "matusalèm" falava quase por parábolas,era enigmático).
___Verdade?, que verdade?(Carlos estava se alterando.Pelo espaço entre as grades do portão,seu Renalvo sentenciou):
___Quando vocês pegaram a oferenda,levaram junto a carga negativa......(a verdade era terrível de se ouvir).
___ Carga negativa??????(agora era Carlinhos que se alterava).
___ Isso mesmo.Agora vocês vão ter que reparar o dano....(enquanto o velho falava, os adolescentes podiam sentir o fedor do fumo barato).
___Que dano???fala logo de uma vez!!!(os dois agora falavam juntos,desesperados).
___ Calma___ disse "seu"Renalvo___ Vocês terão que encontrar a pessoa que fez o trabalho,pedir desculpas,e restituir a oferenda.....
___Mas como?,nós nem sabemos quem foi!!!!(o desespero estava virando pânico).
___Eu sei .......(o misterioso andarilho soltava as palavras lentamente).
___Então fala de uma vêz!!! o senhôr está parecendo até o Sílvio santos!!!!!(Carlinhos teve de conter Carlos, para o amigo não pegar o ancião pelo pescoço).
___O nome dele é Antenor.Ele mora na rua do frade,número quinze,casa três.Vocês devem ir o quanto antes......lembrem-se......o quanto antes!(assim que acabou de falar,o suposto morador de rua deu uma longa tragada,no que restava do seu cigarro,e,sem olhar para trás,foi embora).
Os dois amigos ficaram ali,estáticos,sem falar nada por uns cinco minutos.Rompendo o silêncio sepucral,Carlos falou:
___Temos que reagir Carlinhos!!!!,e tem que ser agora, enquanto ainda podemos andar!!!
___ Concordo......Estou nessa!!!(Carlinhos rendia-se às evidências).
Não ia ser uma missão fácil.