QUEM ERA QUEM, MESMO?
Nesses dias atuais em que se viver é "fast" demais, algo tecnologicamente "online", em que tudo gira à quase velocidade da luz, eu vivi uma experiência muito emocionante, um fenômeno antropológico que já se tornou bem comum nos dias de hoje: os encontros de turma dos tempos da escola, via "facebook".
Ainda outro dia eu ouvia uma pessoa contar do mesmo acontecimento e ela proferiu a frase que me tocou e que é o título desta minha crônica;achei fantástico porque é um resumo bem certeiro do quanto o tempo transforma tudo, o espaço, os sentimentos sobre o todo, e também as pessoas, inclusive no seu "modo operandis" de vida.
Embora, verdade seja constatada, se as mudanças são predominantemente físicas, nossa essência não muda nunca.
Ri muito com a mesma Fiorella, a nossa Fifi de sempre, que igualmente nos fazia rir o tempo todo, bem lá atrás, nas aulas do colégio...com sua graça e com sua espiritualidade tão alegre...
Todavia, parece que nos desconectamos imperceptivelmente dos nossos cenários...e dos nossos antigos hábitos. É da vida.
A exemplo, nos reunimos num restaurante para a troca de presentes e acreditem, eu já nem me lembrava como se faz amigo secreto.
Descobri também que agora tem um tal de "amigo ladrão". Interessante, deve ser dos nossos mais recentes tempos sociológicos...mas deixemos para lá...que a hora é de alegria.
Vejam isso: justo no momento em que peguei o papelzinho do sorteio do amigo secreto exclamei: "gente, peguei a Helô". Quase fui enxotada do encontro. Esperei o restaurante todo me vaiar...
"Vi, o amigo é secreto, se lembra?" alguém me falou.
Eu me lembrava bem vagamente...mas, como é que era mesmo?
E claro, tudo teve que ser sorteado novamente. Será que alguém poderia entender meu entusiasmo, ora essa? Afinal, fazia trinta anos que eu não pegava a Helô..."pegar" no meu antigo sentido denotativo, porque hoje tudo é bem diferente.
Bem, o papo seguia ótimo...
Dificuldades para se ler o cardápio, sugestão só dum "cafézinho" já que o peso das calorias nos persegue, hormônios em queda livre, dicas de como fazer a maquiagem sem sair da rota do delineador, toneladas de adoçante, as maravilhas (com ressalvas) do botox, o melhor foco para se tirar fotografia para se reviver os dezenove anos...enfim, até que o assunto enfocou "filhos".
Ara, afinal, o que era "filhos" mesmo? Todo mundo sabia o que era...mas vagamente se lembrava deles.
Uma de nós tinha três filhos, só alegria, embora não conseguisse sequer nos dizer o "status atual" de algum deles naquele exato momento tecnológico, a despeito de toda a presença da atual tecnologia.
Nem a Fifi sabia da sua herdeira, a única de nós que levara sua pimpolha ao nosso encontro, mas a cuja aura de Natal aproveitava para fazer suas "comprinhas" lá no shopping do encontro.
De repente o celular da Fifi sinalizava freneticamente uns "plim- plins" que me chamavam a atenção. A toda hora aquele "plim- plim" ressoava, ela não atendia, e eu a percebia nitidamente preocupada com algo. Então perguntei do que se tratava.
Bem, de fato, aprendi que essa tecnologia do nosso atual mundo muito nos estressa mesmo...pois a cada compra da "bambina" da Fifi, o cartão de crédito mandava um sinal pelo celular, e nossa mesa estremecia de inquietação.
Eu sinceramente não aguentaria tamanho ataque ao meu bolso e ao meu coração...Por uns instantes eu a defendi :" Deixa ela, é Natal Fifi, afinal, é Natal..."embora comigo eu pensasse que papai Noel seria desfalcado nas melhores ofertas de presentes para um mundo tão globalizado em desejos, claro, depois da brilhante atuação do cartão de crédito da filha da FIFI...vinculado ao bolso da Fifi.
Ali ficou claro que filhos realmente voam, não resta dúvida...mas atualmente voam com a as nossas asas, obviamente.
Por um momento senti que estávamos numa terapia grupal de consolo...cada uma de nós com algo a desabafar...
De repente alguém lamentou:"Ah que pena, meu filho já é independente..."
Então perguntei curiosa: "ei, aonde foi que você acertou?"
Assim que a pimpolha da Fifi chegou a nossa mesa tive a impressão de ver a própria FIFI num retorno ao tempo, uma Fifi repaginada, plugada fulltime, e então pudemos, com certa dificuldade, reencontrá-la em meio às sacolas das compras já "antenada" para compartilhá-las com o mundo dos andróides.
"Não se preocupe, tudo bem baratinho, viu mãe? Só ofertinhas de lembrancinhas..."
Pobre Papai Noel, nem ele sobreviveu aos tempos reais.
Decerto que também perdeu seu espaço celestial nesse tempo que voa bem mais rapidamente que a magia das suas obsoletas renas...