CRIME PERFEITO

O caso que vou contar a seguir ouvi-o quando ainda era garoto. O fato de sempre me recordar desta história deve-se à forma como a trama se desenvolve. Trata-se de um bom exemplo de narrativa, com todos os seus elementos: personagens em ação, ambiente, tempo, enredo, clímax. Por isso, em várias ocasiões, usei-a para ilustrar minhas aulas de Redação. Além de boa ilustração, serviu para descontrair a turma.

CRIME PERFEITO

Era lá pelos idos de 1945, quando a Segunda Guerra Mundial, mesmo já perto do fim, ainda fazia seus estragos em terras longínquas. Contrastando com aquela turbulência, cá no interior de Minas Gerais, num cenário calmo, bucólico, uma locomotiva a vapor – então chamada carinhosamente de maria-fumaça – serpenteava entre as montanhas. No calor do meio-dia, quatro personagens surgem nesta história. Sentados lado a lado, um brasileiro e uma francesa. De frente para eles, naquele banco indiscreto de antigamente, viajavam também um russo e um alemão. Ali iam os quatro e ninguém se conhecia. Apenas tinham se saudado educadamente quando embarcaram. Cada um na sua: O russo cochilava, o alemão lia o jornal do dia, a francesa folheava uma revista de modas e o brasileiro apenas olhava para fora, apreciando a bela paisagem. Pois bem, bastou que a locomotiva entrasse em um túnel para se ouvir o barulho de um beijo: Chuic! E imediatamente ouviu-se o estalo de uma bofetada: Plaft! Daí a poucos segundos, o sol surgiu novamente. Tudo normal entre os quatro passageiros. Ninguém parecia se incomodar. Era como se nada tivesse acontecido. Ah! Mas este narrador é onisciente, sabe o que se passa no íntimo das personagens. E o que pensaram? O russo pensou: “Um destes dois malandros beijou a mocinha e levou merecida bofetada. Bem feito!” O alemão pensou: “Que maçada! Um destes dois malandros beijou a garota e EU levei a bofetada!” A francesinha pensou: “Um destes três espertinhos beijou o outro, pensando que estava me beijando e levou uma bofetada. Bem feito!” E só o brasileiro sabia o que de fato havia acontecido.

A questão é a seguinte: Ele, o brasileiro, fora recusado quando se apresentou ao Exército. Frustrado, viu a gloriosa Força Expedicionária Brasileira seguir para a Itália onde, com sangue e heroismo, escreveu uma página inesquecível da História do Brasil, derrotando as tropas de Hitler. Então, logo que o brasileiro viu o alemão, preparou sua guerrinha particular. Assim que o trem entrou no túnel, beijou as costas da mão esquerda e, com a direita, desfechou aquela bofetada no rosto do alemão. Sentiu-se vingado.

Gerson Silvestre
Enviado por Gerson Silvestre em 14/12/2012
Reeditado em 02/03/2013
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