O CAIPIRA QUE SE ESCONDEU DA MORTE

Em nossa região vivia um rapaz filho único de um rico senhor feudal, possuidor de incontáveis alqueires de terra. O rapaz era valente, foi como voluntário lutar na guerra do Paraguai. Seu pai, apesar de ter só ele como filho, deu com orgulho, sua benção ao vê-lo partir para cumprir sua nobre missão.

O jovem não decepcionou o pai, era intrépido e ousado. Toda missão perigosa que requeria um voluntário ele era o primeiro a se oferecer. Ao término da guerra voltou para casa com o peito cheio de medalhas e o corpo marcado por incontáveis cicatrizes. Marcas de ferimentos de bala, chuços, baionetas. Um verdadeiro herói. Foi recebido com fogos em sua cidade. Com o falecimento dos pais, herdou todo o império. Tornou-se o Coronel Libério.

O tempo passou e ele como bom administrador conseguiu aumentar ainda mais o patrimônio. Já bem idoso, viveu até quase os cem anos, tinha um empregado de sua confiança que tinha um medo mórbido de morrer. Se o sujeito tivesse um resfriado, ou uma unha encravada entrava em pânico. Certa vez foi com o patrão à cidade a cavalo fazer umas compras e levar uma arreata para ser consertada. Chegaram à cidade e o patrão foi ao armazém fazer compras e mandou o empregado ao seleiro entregar a arreata para consertar. O coronel após suas compras foi saindo e encontrou o empregado apavorado.

-Que foi? Perguntou.

-Patrão, tô morto, acabei de encontrar a morte aqui perto!

-Que isso? Andou bebendo?

-Não, patrão, eu vi a morte, ela veio me buscar...

-Ora deixe disso, você já está muito velho para acreditar nessas coisas...

-Patrão, me empreste o cavalo, eu vou lá no Quartel

Geral me esconder na casa da minha irmã.

O Coronel tentou de todos os meios demovê-lo daquela idéia absurda. Em vão. Por fim disse:

-Tá bem, hoje é sábado, pegue o cavalo e vá para o Quartel Geral, mas segunda-feira de manhãzinha, te espero na fazenda...

O empregado concordou, pulou no lombo do animal e o chamou nas esporas...

O Coronel saiu pelas ruas balançando a cabeça não acreditando na ingenuidade do empregado. De repente em uma praça, viu um vulto esquisito. Era mesmo a Morte. Ele se aproximou e perguntou:

-Você é a morte?

O vulto respondeu que sim. O Coronel passou-lhe uma descompostura:

-Que negócio é esse de vir assustar os outros, se tem que levar alguém leve mas não fique fazendo guerra de nervos com as pessoas.

-Não sei do que você está falando, respondeu ela.

-Você assustou meu empregado, que “morre” de medo de morrer, ele até me pediu um cavalo emprestado para fugir de você...

-Não assustei ninguém e nem vim buscar homem algum, eu vim buscar duas mulheres, aliás, já busquei, já devem estar queimando no inferno...

Como o coronel insistisse a Morte tirou um caderno do bolso da túnica e mostrou a ele:

-Tá vendo, só tem duas mulheres na lista desta cidade, não tem homem nenhum na lista, e já estou indo embora, estou indo para o Quartel Geral, buscar um homem, tá aqui o nome dele, mas espere aí como é mesmo o nome do seu empregado?

-José da Silva. Respondeu o Coronel. A Morte disse:

-Ah, ele tem razão, eu vim buscar ele mesmo, só que não é aqui, é lá no Quartel Geral...

* * *

Adaptado de um velho conto árabe.

HERCULANO VANDERLI DE SOUSA
Enviado por HERCULANO VANDERLI DE SOUSA em 10/12/2012
Reeditado em 12/12/2012
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