Em ponto

Ele está colocando a mesa para o jantar. Ela entra e fica parada na porta.

- Amor, está atrasada.

- Desculpa amor, eu calculei errado. Mas a carne só vai atrasar mais uns dez minutos.

- Não a carne.

- Sua mãe?

- Não, que minha mãe.

- Ela quem então?

- Minha menstruação.

- Sua quem?

- Minha menstruação!

Fica tão nervoso que coloca cinco garfos no mesmo lado.

- A quanto tempo?

- O suficiente.

- Tem certeza? As vezes ela não está tão atrasada, só pegou um transito, mas já está vindo.

- Amor, já falei que não estou falando da minha mãe.

- Nem eu.

Ela fica olhando para ele sem entender.

- Você acha que você pode estar...

- Gravida!

- Gravida?

- É! Não era isso que você ia falar?

- Não, ia falar: doente.

- Ai Renato. – Ela senta e começa a chorar. – O que nós vamos fazer?

- Calma. Não entra em pânico. Panico não vai ajudar em nada. Temos que manter o pânico. A calma!

Silencio.

- Primeiro temos que ter certeza de que realmente está atrasada.

Ela para de chorar e olha para ele.

- Está mesmo né?!

Ela faz que sim com a cabeça.

Silencio.

Ele levanta e voltar a por a mesa para o jantar.

- O que você está fazendo?

- terminando de por a mesa para o jantar.

- Por quê?

- Não quero mais nada atrasado nessa casa. Primeiro vamos jantar. Depois entramos em pânico.

Tira a carne do forno e coloca em cima da mesa.

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Os dois chegam juntos em frente a um bar, vindo cada um de uma direção. Ficam olhando em volta como se procurassem alguém.

- Você por um acaso não viu uma menina de vestido florido por aqui não?

- Não.

Silencio.

Voltam a olhar em volta ainda com esperança de encontrar quem estão procurando.

- Quando você estava por aqui não viu um rapaz de camisa xadrez e all star branco.

- Também não.

Silencio.

Olham para o relógio.

- Droga de transito. – pensa alto.

- Atrasado?

- Sim.

- Eu também. Não me dou bem com a pontualidade.

- Eu também não. Quer dizer, até me dava, quando se tinha uma noção de quanto tempo realmente demoraria para chegar em algum lugar.

- Pois é, agora tem isso, você tem que calcular quanto tempo da até o ponto de encontro, mais o transito, contratempos.

- Sim. Tenho que parar de marcar de me encontrar. Nunca chego no horário. Eu até tento, mas não sei o que acontece. Parece que sempre aparece alguma coisa pra atrapalhar e faz com que eu chegue atrasado.

- Mentira.

- É geralmente, ninguém acredita.

- Não, eu disse mentira, porque comigo também acontece.

- Sério?

- Sim! Aí eu tento explicar, mas nunca acreditam.

- Eu acredita.

- Obrigado.

Silencio.

Dão mais uma olhada em volta.

- Pelo jeito não aguentaram esperar.

- É, pelo jeito, não mesmo. Se bem que foi melhor, ele não acreditaria o que aconteceu.

- É, nem ela.

Silencio.

- O que aconteceu?

- É uma longa história.

- Eu não tenho pressa, não tenho nenhum compromisso marcado.

- Então eu conto. Só se você contar a sua.

- A minha é inacreditável.

- Não mais que a minha.

Os dois entram no bar.

Então chega uma mulher de vestido florido vindo de um lado e um homem de camisa florida e all star vindo do outro.

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- Que horas são no seu relógio.

- No meu falta dez.

- Estranho no meu já são e cinco.

- É que o meu está dez minutos atrasados.

- quinze!

- Não, dez.

- Não, quinze. Porque se agora são e cinco e no seu falta dez, quer dizer que está quinze.

- Não, está só dez, o seu que está cinco adiantado.

- Não, o meu está certo. O seu que está quinze atrasado.

- Não, o meu está só dez. Não deixo quinze. Só dez. O seu é que está errado.

- É o seu.

- O meu.

Uma senhora que está passando pergunta as horas.

- falta dez.

- são e cinco.

- Alias, agora, falta nove!

- Não, são e seis.

- Nove.

- Seis.

A senhora acompanha discussão com a cabeça.

- Falta nove cacete!

- Não, já são e seis.

- Nove!

- Seis.

Os dois começam a se pegar na porrada. Um senhor passa olhando para os dois no chão, gritando “nove”, “seis”.

- Tão brigando por causa do truco?

- Não horas.

- Horas?

- É, que horas são?

Ele olha para o relógio.

- E quinze!

Afonso Padilha
Enviado por Afonso Padilha em 02/10/2012
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