Pais separados
Pai e mãe entram no quarto do filho e sentam na cama dele, que está no computador jogando e só observa com o canto do olho. Eles ficam em silencio. O filho para de jogar, tira os fones e vira pra eles.
- Antes de qualquer coisa eu queria dizer que não foi culpa minha.
- Não, não foi mesmo.
- Não mesmo.
- Isso é uma coisa nossa.
- Ah tá, eu pensei que eu tinha culpa.
- Não, você não tem culpa nenhuma. Eu e sua mãe que temos.
- Mais ele.
O pai da uma olhada para a mãe.
- Porque eu faço coisas erradas, mas agora não fui eu.
- Não, que isso. Isso não tem nada a ver com você.
- E isso não vai mudar em nada nossa relação.
- Vamos continuar sendo seus pais.
- Cumprindo com as nossas obrigações.
- E te amando aconteça o que acontecer.
- Isso é uma coisa que acontece.
- É normal no mundo dos adultos.
- Quando você crescer vai entender.
- Só não queremos que você sofra.
- Pode ligar para o papai a hora que quiser. Não hesite.
- E eu vou estar sempre aqui.
- Vamos se separa como marido e mulher, mas continuamos sendo pai.
- E mãe.
- Ah vocês estavam falando da separação.
- Sim, do que você acha que era.
O filho fica em silencio. Olha para os dois.
- Nada.
Vira para o computador, coloca o fone e volta a jogar. Os pais ficam sentados na cama sem entender.
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A mãe e o pai estão em pé, em frente ao filho que está sentado.
- E aí?
- Não sei.
- Ele vai ficar comigo.
- Como assim vai ficar com você Marieta.
- Eu sou a mãe.
- E eu sou o pai.
- Grandes coisa, por pouco não é.
- Oi?
- Eu falei que ele vai ficar comigo e pronto.
- Não, não. falamos que ia deixar ele escolher.
- Ele não tem idade para isso Roger.
- Você está com medo, porque se deixar ele escolher, sabe que ele vai ficar comigo.
- Ah coitado!
- Otavinho, né que você quer ir morar com o papai.
- Né que não, né que você quer ficar com a mamãe.
- Na casa do papai vai ter piscina.
- Aqui tem seu vídeo game, brinquedos, seu quarto.
- Não esquenta, você pode levar tudo isso Otavinho, ou se não o papai compra tudo novo. Isso, o papai vai comprar tudo novo.
- Nossa a gente se separou você ficou rico?
- Praticamente, já que agora não tenho mais você me afundando.
- Olha o que você fala na frente do meu filho.
- Nosso filho.
- Filho você vai ficar com a mamãe né? Não vai abandonar a mamãe igual fez o papai.
- Se ele tivesse casado com você com certeza iria.
- Oi?
- Nada, eu disse que não vale fazer chantagem emocional.
- E comprar vale?
- Não estou comprando, estou deixando ele aproveitar das coisas que não podia porque meu dinheiro estava sendo gasto com você.
- Comigo e com aquela safada da sua amante.
- Eu não quero discutir isso na frente do meu filho.
- Nosso filho.
Silencio.
- E ai filho, com quem você quer ficar?
- Com a vovó.
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Pai e filho estão no carro. O filho está no celular. O pai dirigindo.
Silencio.
- E aí filhão, como estão as coisas? Quais as novidades?
- Nenhuma.
- Hum, legal.
Silencio.
- E a escola?
- Ta bem.
- Bom, bom...
Silencio.
- Viu o jogo ontem?
- Vi.
- Tava bom né?
- Bom.
- Legal.
Silencio.
- Filho.
- Oi?
- Quem é aquele cara que estava na sua casa quando eu fui te buscar?
- É o...
- Não que eu me importe. – interrompe.
- É o namorado da mamãe.
- Namorado?!
Vai com o carro para o meio fio. Volta.
- Namorado?
- É...
- Nossa, que legal...
Silencio.
- Namorado, legal.
Silencio.
- E faz tempo que eles estão namorando?
- Não sei, acho que faz uns quatro meses.
- Como assim quatro meses, sendo que nós nos separamos a três.
Vai para o meio fio de novo, o carro de trás buzina, ele mostra o dedo.
- Ah, então faz dois.
- Ah, dois, ufa...
Silencio.
- E ele é legal com você.
- Sim.
- Porque se ele não for pode falar que eu vou lá agora mesmo, quer que eu vá lá agora? Eu vou agora!
Dá pisca pra fazer a volta.
- Não precisa, ele é legal, bem legal.
- Ah bom.
Silencio.
- Filho.
- Oi.
- Ele é mais legal do que eu?
- Claro que não né pai.
O pai abre um sorriso de satisfação.
- Apesar da mamãe dizer toda hora, que ele é mil vezes melhor que você em todos os sentidos.
Some o sorriso. E ele vai para o meio fio mais uma vez.