A Miridiane do caderno do Zé

O Zé Rodrigues tinha um caderno onde anotara cada mulher que havia passado pela sua vida. O dia que conhecera até o dia que tudo terminara. Desde a adolescência aos dias de hoje, ele já com seus 46 anos.

Quem apareceu com a informação foi o Santo, que ficara sabendo pela Mirtes, uma morena da Vila do Kiko que fazia faxina uma vez por semana na casa do referido. Segundo ela, que dera uma boa espiada, era um brochurão de 100 páginas, preenchido até a 60, 61.

Muita mulher para um mocorongo como o Zé, hoje viúvo da Eva.

A turma se assanhou!

E combinou de alguém afanar o diário, darem uma lida e devolverem sem que ele descobrisse. Segundo a Mirtes o caderno estava na gaveta da cômoda, no quarto, e foi aí que a equipe de planejamento entrou em ação.

Ela deveria ver que desenho havia na capa, eles procurariam um igual. Na próxima faxina ela trocaria os cadernos, eles leriam, dariam boas risadas, descobririam quais as infelizes que tinham tido coragem de encarar o Zé e é lógico tirariam o maior sarro. Não nele, que era meio nervoso e podia apelar para a ignorância, mas nelas sim. Ter alguma coisa com o Zé era sinônimo de desespero puro.

Não que ele fosse o pior da espécie. Haviam outros em Bitinga City que pelamordeDeus! Mas que era ruinzinho, ninguém podia negar. A Eva mesmo, hoje falecida, não havia quem conseguisse entender como tinha conseguido agüentar a fera por 12 anos. Até brincavam dizendo à meia voz que havia morrido de desgosto.

Que o homem era brabo! Um mau hálito desgraçado e isso não era coisa recente não. Rapaz ainda, tempo das domingueiras dançantes e bailinhos caseiros, o cheirinho do podre bucal já o acompanhava. Alguma coisa relacionada a estômago , porque os dentes eram perfeitos. Bem, o apelido dele na época era Zé Hallsdrigues. Precisa falar mais?

E chato. Gente, como o Zé era chato! Bebia pouco, não fumava, não perdia uma missa e era só pintar pornografia no meio das conversas que ele dava um jeitinho de se mandar. E sempre com a mania horrorosa de querer converter os demais. Ruim de futebol, não jogava bilhar nem baralho( aliás tinha o costume de afirmar que jogo, qualquer tipo de jogo era da parte do diabo) e durango de pegar mulher, mesmo as putas. Como havia conseguido preencher um caderno de quase 100 páginas era um mistério. Tipo assim os círculos nos milharais na Inglaterra , as estátuas da Ilha da Páscoa ou o que acontece de verdade no Lost.

Feita a troca( Mirtes, depois de um incentivo de 10 reais, tinha ido no serviço do Zé e inventado que havia esquecido o RG na casa) a turma postou-se no bar do Alemão para a conferência da obra literária. Cervejas geladas na mesa, uma disposição infernal e risadas antecipadas do que leriam, abriram na primeira página.

Pois é, o Zé era meticuloso mesmo.

Nomes, endereços e datas em ordem crescente. A maioria dos nomes eram de perrengues, daquele tipo que o Carmo classificou como” nem sob tortura” mas no meio algumas até boazinhas. Estas, é claro, duração de dois, três dias no máximo. Marias, Joanas e Cleides em profusão. O mais delicioso eram os detalhes: peguei na mão; beijei de língua, apertei as tetinhas por cima do vestido; gozei abraçado no banco do jardim. E alguns nomes de putas com as descrições detalhadas e, por incrível que pareça , os preços.

Boas risadas, sacudir de cabeças não acreditando em tanta bobagem, foi quando o Santo empacou num nome: Miridiane.

Epa!

Porque epa? Os outros perguntaram.

Miridiane era o nome da esposa do Santo.

Com o mal estar reinando no ambiente o Gardé tentou minimizar o estrago: Deve ser outra!

Então me fale de outra Miridiane que não a patroa?

Difícil. Muito difícil! Se fosse uma Débora, uma Elizabeth com th ou e, uma Mariana ou uma Ângela, até Sebastiana ainda vá lá, mas Miridiane? Por mais que forçassem a memória não lembravam de nenhuma outra que não a referida.

Então veja a data? De repente foi antes de se casar com você.

Conferido. Depois. Dois anos depois.

Veja a duração.

Uma semana.

Ainda tentaram argumentar meio descrentes que o Zé , inda mais o Zé, numa semana só não ia conseguir muita coisa, mesmo assim o Santo tomou a cerveja de um gole só, arrancou a folha com a prova do crime ,enfiou no bolso e tascou o caderno na rua, com raiva

Depois foi embora, não sem antes dar um chute no pobre do viralata que foi cheirar seu pé e não tinha nada com isso.

Nickinho
Enviado por Nickinho em 19/02/2007
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