Todos os Santos

Ela está numa igreja, sozinha, ajoelhada, de mãos juntas, de frente pra uma imagem.

- Santo Antonio eu quero muito arranjar um marido. Me ajuda...

- Por que?

Ela da uma olhada em volta. Não vê ninguém. Fecha os olhos.

- Me da uma força.

- Porque você quer um marido?

- Quem ta falando?

- Com que você está falando?

- Santo Antonio!

- Então cacete!

Silencio.

- É o senhor mesmo?

- Não é o São Jorge!

Ela da risada, ele fica em silencio.

- Por que você quer que eu te arranje um marido.

- Por que eu quero me casar!

- A vá?!

- Não, é que eu quero muito, meu sonho desde criança era arrumar um marido.

- Isso não é sonho é pesadelo.

- Peraí o senhor não é o Santo Casamenteiro.

- Sim.

- Então por que está falando assim?

- To sendo realista. Casar da muita dor de cabeça. O homem não ajuda em casa, não quer saber de nada.

- Não mais...

- Pensa bem, no começo é legal, mas uma hora cai na rotina.

- Sim, eu sei. Mas estou preparada.

- Não, não está preparada. Ninguém ta preparado para o casamento.

- Que isso, não fala assim!

- Falo sim, falo sim porque o que vem de gente me pedir pra ajudar a arranjar marido alegando que está pronto, que é o que quer, e depois na hora da pós-venda vem reclamar que não era bem isso o que queria não é pouco.

Silencio.

- E aí o senhor vai me ajudar?

Silencio.

- Eu pago promessa, subo as escadas de joelhos...

- O que é que eu ganho com você subindo escadas de joelhos? Não faz sentido nenhum fazer isso.

- Sei lá, foi o que me veio à cabeça.

- Caramba.

- Ta bom, faço outra coisa... Mas me arruma um bom marido.

- Opa, era só um marido, agora já é um bom marido.

- Sim, quero um bom marido, atencioso, trabalhador, engraçado, que me ame do jeito que eu sou...

- É acho que você deveria procurar o Santo Expedito.

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- São Longuinho, São Longuinho, se você me ajudar a encontrar as minhas chaves eu dou três pulinhos.

- Porra só três pulinhos?

Olha em volta.

- Pelo amor de Deus, você é muito mão de vaca. Economiza até nos pulinhos.

- Amor.

- Que amor o que, não tem ninguém em casa.

Silencio.

- E aí, não vai ir procurar suas chaves?

Silencio.

- Se você acha que eu vou procurar elas por três pulinhos está muito enganado.

- Cinco?

- Poxa é só pulinho. Eu faço um trabalhão só por pulinho, que até agora eu não sei o por que, qual foi o momento que alguém estipulou isso. Eu não tenho a mínima idéia de onde eu possa trocar isso. Eu vou comprar cigarro o atendente não aceita em pulinho. Alias ninguém aceita. Vai você fazer compras e tenta pagar em pulinhos, eles quebram suas pernas.

- Eu preciso sair.

- Então vai procurar a suas chaves.

- Me ajuda aí. Eu já procurei.

- Já procurou sim, nem deve ter procurado direito. Vocês tem a mania de fazer isso, só procura onde os olhos alcançam, aí já vem apelar pra mim. Não tenho um minuto de sossego. É celular, chave, roupas.

- Desculpa.

- Não desculpo, não desculpo. To cansado disso. Toda hora me chamam. E em troca eu ganho o que? Três pulinhos.

- Ta bom, deixa que eu procuro.

- Isso mesmo. Procura. Porque eu não vou levantar a bunda daqui. Não por três pulinhos. Alias se você achar, eu dou três pulinhos. Eu to cheio deles mesmo.

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São Jorge, Santo Expedito, Santo Antonio, São Longuinho e São Pedro, estão numa mesa de bar, chega a conta.

- E aí, a conta de hoje é de quem?

- Eu paguei a ultima.

- Ih lá vem o Jorge com história.

- É verdade, eu paguei.

- Aham e também foi pra lua.

Todos dão risada menos São Jorge.

- Deixa que o Longuinho paga com pulinhos.

- Ah não ninguém aceita isso.

- É a vez do Expedito pagar.

- Minha vez?

- Ih isso aí é impossível de se conseguir do Expedito.

- Esse daí tinha que ser o Santo dos Pão Duro.

Todos na mesa dão risada.

- Nego devia rezar de mão fechada pra ele.

- Por que eu tenho que pagar?

- Por que é assim, cada um paga uma semana.

- Mas é a primeira vez que a gente vem aqui.

- Então, vai ser assim. Cada um paga uma semana. Começa por você.

- Porque o Antônio não paga?

- Por que eu to duro. Você sabe como é essa época do carnaval, ninguém ta nem aí pra casamento.

- É, carnaval é foda. Ninguém ta nem aí pra nada.

- Não pra vocês, pra mim o que chega de oração pedindo pra não chover. É difícil segurar o rojão, por isso quarta de cinzas sempre chove to com serviço acumulado.

- Pra você não é ruim também, né Jorge?!

- Por quê?

- Porque o tanto de nego que tem se atracando com dragão é brincadeira, tudo seus devotos.

Todos na mesa riem. Dessa vez, menos São Jorge.

- Muito engraçado.

- Pra mim também não é tranquilo não. O que tem de gente me azucrinando pra achar as coisas antes de ir viajar, fantasia, chaves, pior é a camisinha, bem na hora do vamos ver.

Todos riem.

- Cade Paulo?

- Foi pular carnaval.

- Aquele lá não perde um carnaval também né!

- É do bloco das nuvens, participa com os anjos que se vestem de gay.

- Depois não sabe o porquê da fama.

- E aí, como vai ser? Quem vai pagar.

- Vamos rachar.

- Eu to sem minha carteira.

- Ih o velho golpe da carteira.

- Ficou na outra calça?

- Esse é velho hein!

- É sério, não ta comigo mesmo.

- Se não for dividir igual pra todo mundo eu também não vou pagar.

- Palavras de um pão duro!

- Amém.

Todos na mesa repetem o ‘amém’. Depois riem.

- Vamos colocar na conta do patrão.

- Isso vamos colocar na conta dele.

- Olha só o olhinho do Expedito, brilhou!

- Nada a ver.

- Beleza, vamos colocar na conta do patrão.

Todos levantam da mesa. Vão se direcionando para a porta. o garçom corre atrás deles.

- Espera aí, e a conta?

- Deus lhe pague.

Falam e vão embora.

Afonso Padilha
Enviado por Afonso Padilha em 18/06/2012
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