O banho
É um dia frio daqueles que dá-se um boi pra não entrar no banho e uma boiada pra não sair. Ele já está a dois dias sem tomar banho, então hoje tem que tomar. O jeito é aproveitar que não tem ninguém em casa e tomar um banho daqueles bem demorado, que pra é compensar os dias que deixou de tomar. Arruma as roupas que vão ser usadas depois do banho de uma maneira que não pegue nem um pouco de friagem. Enquanto isso o chuveiro já está ligado. Sabe como é chuveiro de pobre, tem que deixar pré-aquecer. A vapor que sai já cobre o banheiro de fumaça, ele tem que abrir uma porta na fumaça, igual nos desenhos animado pra poder entrar no box. Coloca a mão embaixo da agua pra ver se já está quente o suficiente pra que ele possa tirar a roupa. É a sua deixa. Tira a roupa com uma velocidade já mais vista e entra embaixo do chuveiro. Chega alguém em casa. É a mamãe.
Batem na porta do banheiro.
- Quem ta tomando banho?
- Oi?
- Quem é que ta no banho?
- Não entendi.
Cai a resistência.
- Anda logo!
- Eu acabei de entrar.
Liga o chuveiro e vai desligando aos poucos. O chuveiro dele é daqueles que tem que ir desligando aos poucos. Daqueles em que você tem que convencer ele que merece tomar banho. Essas desligadas aos poucos, é uma espécie de preliminar pra que a agua fique quente.
Aos pouco ele vai conseguindo arrancar agua quente da GorDucha.
Batem na porta.
- Cara você viu meu celular?
- Oi?
- Meu celular que tava ali em cima.
- Piscina.
- Meu celular.
- Nosso lar? Oi?
Ele se distrai com a conversa e desliga muito rápido, o chuveiro não perdoa e a luz cai novamente.
Batem na porta
- Anda logo.
- Eu acabei de entrar, nem me lavei.
- Sei.
Ele recomeça o jogo da conquista. Desligando aos poucos. Pulando pra se esquentar. A fumaça que sai da agua não condiz com a sua real temperatura. Aos poucos ela vai voltando a entrar no clima. Ele começa a se ensaboar.
Batem na porta, de novo.
- Abre a porta pra eu ir no banheiro.
- Oi.
- Eu preciso ir no banheiro.
- Dinheiro?
- Banheiro.
- O que é que tem?
- Eu preciso ir.
- Vai.
- Então abre.
- O que?
- Anda logo. – grita a mãe.
- Eu to me enxaguando.
- Já ta a uma hora debaixo desse chuveiro. Não é você quem paga a luz.
- Eu acabei de entrar.
- É a terceira vez que você fala isso.
- Eu preciso usar o banheiro.
Cai a resistência, de novo. Como protesto a discussão.
- Pensei que não ia sair mais desse chuveiro.
- Mas eu ainda não terminei, to todo ensaboado.
- Eu preciso usar o banheiro.
- Espera eu terminar.
Liga de novo. Recomeça o exercício de paciência. Vai ser sua ultima tentativa. Devagar a agua requenta. Parece que agora vai. O sabão do corpo já foi todo tirado. Agora só falta o cabelo. Ele arrisca e da mais uma desligada de leve. O chuveiro cede. Aproveita o bom humor da gorDucha e começa a lavar os cabelos.
Batem na porta.
- Cacete!
- Onde ta o carregador?
- Já falei que eu acabei de entrar.
- Entrar?
- Oi?
- Carregador.
- Abre que eu preciso usar.
- Não ta aqui!
- Anda logo.
- Eu só to enxaguando meu cabelo.
- De novo.
- Abre.
- Cadê?
- Vou desligar a força.
O chuveiro não aguenta a tanta pressão e desliga de novo. Ele desiste de lutar pela agua quente. Desliga o chuveiro. Se enrola na toalha. Abre a porta e sai em meio a fumaça como um magico com o cabelo cheio de espuma. Os três ficam parados na porta assustados.
- Eu não tomo mais banho nesta casa, enquanto não trocarem o chuveiro e quando vocês estiverem em casa.