SUJO... FEDIDO...PRETO...
Eu estava nesse final de tarde, buscando algo que pudesse considerar inédito para publicar aqui e deparei-me com recorte que fiz de um texto de autoria de Iram Saraiva, que já foi Senador e hoje é vereador em Goiânia, além de professor de direito constitucional na Faculdade Sul Americana - FASAM e nas horas vagas jornalista no Diário da Manhã aqui em Goiania.
Vou reproduzir um texto que ele escreveu no dia 06 de maio de 2005 e que apenas repasso pela coragem, inteligência e competência que teve, como diz ele próprio, de mergulhar nessa “lengalenga” do racismo. Uma perola a meu ver.
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SUJO ... FEDIDO... PRETO
Autor: Professor Iram Saraiva
Professor de Direito Constitucional da FASAM
Extraído do Diário da Manhã
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Essa lengalenga, em razão do uso de certas palavras, como sendo de cunho racista, de vez em quando volta à tona. É faltar assunto, principalmente na mídia, e logo dão vulto a fato que de despercebido e sem importância, não mereceria destaque nem nas conversas de botequim, mas acaba rendendo estéreis discussões a empobrecer conteúdos importantes. Igualzinho quando se quer desviar a atenção de determinada coisa levando-a para o lado da insignificância.
A história da cartilha elaborada pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos que reúne palavras, expressões e piadas consideradas politicamente incorretas recebeu importância imerecida.
A não ser que se pretendesse homenageá-la com posição relevante do “FEBEAPÀ – Festival de besteiras que assola o País”, dos anos 60, do saudoso jornalista Stanislaw Ponte Preta (Jornalista Sérgio Porto).
O politicamente incorreto pra mim, reside na falta de ações concretas que eliminem a pobreza que mora nos grotões onde habitam os de cor negra. Discriminados não por palavras, mas pela empulhação de uma cartilha que não aclara a pele e ainda salienta mais as diferenças. Isso é dirigir o debate para o rumo fácil, nivelar o diálogo por baixo.
Os preconceitos sempre foram estabelecidos a partir das condições sociais e econômicas das pessoas, e nunca pelas caricaturas que lhes são atribuídas – mesmo as que ofendem.
Pois foi exatamente o *Cafarnaum que me fez entender que basta a indiferença do discriminado verbal, para o processo contra ele perder força. É como apelido. Se der importância, fica para sempre.
Contou-me que uma senhora viajava de ônibus, sentada. Para se distrair, jogava passatempo, daqueles em que as palavras são formadas horizontal e verticalmente. Depois de alguns pontos, o coletivo parou e recebeu lotação máxima. Aliás da forma costumeira.
A viagem continua. Dia quente, abafado, todo mundo transpirava, bodum próprio das ocasiões; Empurra-empurra natural nos momentos de brecadas mais bruscas. A cada freada a turma quase passava do motorista.
“Com licença, com licença”, caminha o negão operário da construção civil, metro e oitenta de altura, camiseta cavada, suado igual tirador de espírito. Segure espremendo os passageiros:
“Licencinha, licencinha”...; pára de uma vez, e fica a olhar o jogo da senhora. Também fanático na diversão.
A certa altura, o negão de braços pra cima, seguro no corrimão; distraído a espiar, não percebe lhe escorrer do sovaco uma gota de suor, que cai direto no livrinho de palavras cruzadas.
A mulher levanta a cabeça, olha pra ele, e, pausadamente, fala:
“Sujo... fedido... preto...” Sem qualquer cerimônia, ele aponta na direção do jogo e diz: “Se for com quatro letras, madame, é ânus!”
Repito: O texto acima não é de minha autoria, como foi citado no inicio.