UM GOLPE DO NEO ADJETIVO MEGA SUPERLATIVO
Esta minha história de hoje não é minha, aconteceu dia desses com o doutor João, aquele meu amigo protagonista de algumas crônicas que aqui escrevo.
Todos os ofícios têm seus ossos, isso é mais que fato, todavia, percebo no dia-a -dia que o meu amigo doutor João anda meio desanimado com os mais recentes e modernos espinhos da sua profissão.
A fila anda, a sociedade muda muito e os valores do bons costumes...variam conforme as culturas, é o que sempre lhe falo, na esperança de um dia acalmá-lo.
Então, estava ele lá, militarmente a postos, impaciente, a esperar seu último paciente daquele dia, paciente que não chegava nunca.
Travava-se duma senhorinha grega, que a despeito de longo tempo residente no Brasil, socialmente ainda é aclimatada à sua rígida cultura de berço, digamos, um tanto hermética e exigente na forma de pensar, de se expressar e de agir quando comparada à nossa atual frouxidão de costumes.
Pela demora a chegar mais parecia que vinha direto da Grécia para a consulta como o doutor, embora seja mais fácil ir de Sampa à Grécia do que se movimentar pela cidade aos finais das tardes engarrafadas.
Fazia um calor imenso lá fora quando ela entrou esbaforida na sala do doutor acompanhada da sua "heroiníssima" nora.
Meu presente neo adjetivo mega superlativo "heroiníssima" se deve ao fato de que , às vezes, não encontro palavras que expressem o tamanho da minha...angústia, frente à constante angustia do doutor João.
-Boa tarde, senhora!
-Nem tão boa assim, não doutor?
-Por quê, dona Micha...
- Senhora Michaelis, por favor. O senhor tem que saber ao certo o nome dos seus pacientes, ora! É o mínimo!
-Sim, é claro, senhora Michaelis, e ao que devo o prazer da sua consulta?
-O senhor não sabe?
-O quê, senhora?
- Que eu estava no carro toda suada, que nem permiti que minha nora ligasse o ar, para agora tomar este golpe de ar aqui no seu consultório?! (a nora , quieta, pingava suor...)
-Por isso não, eu desligo o ar, pronto dona Michaelis, fique tranquila!
-Como posso ficar tranquila?
-E por que não ficaria?
-Então o senhor não sabe, mesmo?
-Do que, senhora Michaelis?
- Já Peguei uma pneumonia!
-Quando foi isso?
-Ora, Foi agora! ou o senhor não sabia?
- Não, eu não sabia dona Michaelis, primeiro tem que contar ao médico...o que sente...
-Ah, então não sabia? Então, não cuida com seriedade dos seus pacientes! Sabia que eu pegaria uma pneumonia de "golpe de ar" aqui dentro e não desligou o ar? Olha só o meu peito sem ar...sinto que estou sem ar!
Bem, conversa foi, consulta veio e depois de bom tempo o doutor João resolveu fazer uma receita.
-Está aqui dona Michaelis, este é o seu tratamento.
-É para a pneumonia?
-Não, é para o seu coração.
-Coração? Então estou morrendo...disse ela a nora que ali esboçou sua primeira expressão de felicidade. A culpa é do senhor.
A nora então interveio par explicar...
-Vamos tratar de tudo dona Michaelis, em casa eu explico a receita para a senhora.
-Nada disso, quero ver se entendo toda a letra dele.
E enquanto o doutor lhe explicava tudinho várias vezes, ela rasurava a receita toda com as sua anotações em grego:
"é melhor anotar porque a letra desses médicos é um caso bem sério..." argumentava ela.
-Dona Michaelis, a farmácia não vai aceitar essa receita rasurada.
-Ah, é doutor? Então faça outra receita para a minha nora. É ela quem compra os remédios para mim...
Terminada a consulta tive a impressão que o meu amigo, o HEROINÍSSIMO doutor João, se sentia golpeado, numa ocultíssima e elegantíssima crise de nervos...
Moral da história: "Presente de grego" é nada frente ao tudo daquele caso da Dona Michaelis, um autenticíssimo "diagnóstico de grego", que decerto não é para um comuníssimo e brasileiríssimo doutor João.
Fica aqui o registro.
Nota:
Verídico, nomes fictícios.