O PÉ-DE-PÃO
Contou-me, nestes últimos dias, determinado cidadão dos inhamuns que me pediu anonimato incondicional, à respeito de uma pesquisa extraordinária, lograda de pleno êxito e realizada por um AAP.
No seu relato esmiuçado de detalhes que não vale a pena deter-me, peneirei e fiquei com o mais importante e o mais verdadeiramente real. A pesquisa é fenomenologicamente falando, fenomenal.
Disse-me ele, no seu jeito simples de interiorano desumidificado (já que procede de uma região onde o índice pluviométrico anual aproxima-se, aproximativamente do zero, índice de Irauçuba), que um pesquisador de renome em meio aos apicultores e panificadores da cidade, desenvolveu o Pé de Pão. “De que maneira? – refutei. Estava assaz, curiosamente curioso!” Ele prosseguiu. “Tomei conhecimento (também não falou como e de quem) que o AAP preparou a massa do pão, como de costume. Com a massa já pronta e descansada, tomou parte dela e adicionou numa proporção apenas conhecida por ele, uma quantidade de mel. Misturou os dois ingredientes várias vezes e com muito cuidado e prudência, até que aquele odor tão característico e ‘similar’, desaparecesse por completo. Ao resultado final de todo este processo ele denominou ‘massa com senha’. “E aí – indaguei”. A cada instante que passava tornava-me mais ansiosamente ansioso. Com voz mansa e palavreado arrastado (talvez fosse fome, não sei; ou quem sabe, sede? Havia falado tanto...), retorquiu: “Aí? Aí na calada da noite ele cavou um buraco no chão, bem debaixo da estrela papa-ceia (senão, não dava certo) e plantou a ‘massa de senha’. Arrumou-se pra dormir, mas pensa que ele dormiu? Ei, ei, ‘neguim’, passou a noite em claro. Sono que é bom...” Eu não agüentava mais. Era muita expectativa para um hipertenso. Interferi: “Espero agora que o senhor termine seu relato”. Ajeitou-se um pouco na cadeira (esqueci de dizer que estávamos sentados: ele numa cadeira comum e eu numa cadeira de balanço, com um pé sobre a cadeira, de óculos escuros, uma lente pintada de preto e outra transparente, mão direita segurando o joelho), e retomou. “ Mal o sol despontou o homem pulou da cama e correu para o quintal. A claridade ainda não era total. Ele aproximou-se com respiração ofegante, coração disparado, pernas trêmulas, olhos esbugalhados e, estático, somente exclamou: “Não! Não!” (óbvio que a tradução é contrária). Eu gritei: “E o que foi que ele viu?” Soletrando palavra por palavra e carregado de emoção ele revelou: “S-e-u P-a-u-l-o v-i-u o p-é d-e p-ã-o, o p-é-é-é d-e-e-e-e p-p-ã-ã-ã-o-o-o-o-o-o!!! E uma coisa que o senhor não vai acreditar, mas eu juro, eu quero é que a mula sem cabeça carregue a minha ‘fia’, se não for verdade. O pé de pão tem a temperatura tão alta que o pão já nasce torradinho. E mais: a metade do pé produz pão bengala, e a outra metade carioquinha com mel. Tá pensando que eu tô mentindo? Eu digo até onde ele fica: no quintal da Panificadora Semear. Eu digo e provo. Vá lá pra ver.”
ALMacêdo