Paixão de Cristo
Nos meus tempos de criança, nenhuma mãe que se prezasse deixava de levar a filharada toda para assistir, às sextas-feiras santas, ao velhíssimo e surrado filme, em preto e branco, da Paixão de Cristo. E vem desse tempo a seguinte história.
Um caboclo da minha terra, valente que só, foi assistir ao filme. E no momento que os soldados romanos estavam batendo em Jesus, ele levantou-se da cadeira, gritando, revoltado:
- Cabras safados! Desgraçados! Por que estão fazendo isso com o pobrezinho?
Puxou o revólver e quis dar tiros na tela para derrubar os soldados romanos e defender Jesus. Foi contido pelos amigos, que explicaram:
- Tinha que ser assim, Tonhão! Ele era o enviado de Deus, tinha que sofrer para deixar uma mensagem de amor e salvação!
- Hum, tudo bem, mas não precisavam bater tanto no pobrezinho, né? Tadinho, tão magrinho...
Passou-se um ano e na sexta-feira santa seguinte, convidaram Tonhão para assistir ao filme Paixão de Cristo.
A história toda se repetiu até que, de repente, Tonhão viu de novo os soldados romanos baterem em Jesus. Aí não agüentou:
- Olha, cara, no ano passado eu fiquei morrendo de pena de ti, mas agora, não, tenha a santa paciência! É muita falta de vergonha na cara! Tu não viste o que te fizeram no ano passado? Por que foste arranjar nova encrenca?