DURA LEX SED LEX


Estando agora no sétimo período de Direito, arrumei mais um título em minha cidade natal. Sou agora um “quase advogado”.
Nesta condição sou chamado para quase tudo que envolva direito e lei. Compra e venda de imóvel – tenho que ler a escritura particular antes de algum amigo assinar tal documento. Pensão de marido que morreu e deixou filhos com outra, ou que vivia com mais de uma mulher, tenho que dá orientações e apoio – geralmente aos dois lados. E por aí se vai: ação contra o INSS, contra a Prefeitura, briga de mal vizinhos e etc...
Hoje peguei meu caso mais difícil na condição de “quase advogado”: um amigo que foi cobrado por umas parcelas em atrazo de uma dívida agrícola em um banco oficial, me pediu para que o acompanhasse para resolver o caso, visto que a dívida de seis mil e oitocentos reais estava com três parcelas em atraso e além de multa, juros e mora, veio também para pagar uma taxa de quinhentos reais sobre tudo isso como honorários da empresa terceirizada que efetuou a cobrança ao pobre do meu amigo.
De pronto aceitei o convite e vestido numa camisa de manga longa abotoada no punho e até o último botão do colarinho rumei com ele ao banco.
No local, nos assentamos de fronte à mesa do Gerente de Negócios e este com a cara mais dura do mundo espatifou um monte de papel e foi explicando a operação de crédito desde o início. As cláusulas do contrato, as taxas de juros, as normas do BNDES e outras informações técnicas bancárias que eu não entendia patavina nenhuma.
Para não deixar meu amigo desconfiado que eu não sabia de nada e para não perder moral com ele, comecei a debulhar uma dezena de palavras difíceis que eu ouvi nesses três anos de faculdade, quase sem nexos, mas com fluencia:

- Bem, Senhor Gerente... Eu gostaria que o senhor me informasse a fundamentação jurídica desta cobrança de honorários, ab initio. Tempestivamente solicito vistas aos autos e com o seu beneplácito irei analizar o caso. Se necessário vou peticionar uma reformulação administrativamente ou impetrarei uma ação cautelar. Caso,  necessário ajuizarei uma ação
actio quanti minoris. Se tivermos êxito no intento, ajuizaremos também uma de danos.  Pois não houve sucumbência alguma. Na verdade não houve nem a lide. Caso contrário, vamos solicitar a anulação do contrato com efeito ex tunc. Além de ser um afronte ao Código de Defesa do Consumidor, é uma burla aos princípios da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal... E pode ter certeza que o resultado obtido será erga omnes...

O rapaz, meio que espantado fica de pé e me interrompe:

- Um instante Senhor!... Me aguarde um minuto apenas!

Entrou num ambiente ao lado, separado apenas por uma divisória de madeira e após uns cinco minutos volta com a sentença:

- Senhor está resolvido. Fique tranquilo que o seu cliente só pagará o principal... Até os juros o Gerente Geral dispensou.

Eu o agradeci cheio de moral, apertei a sua mão e para fazer o arremate final, disparei:

- É isso aí amigo! “Dura lex sed lex!”

E saí de lá correndo com
medo de que ele me perguntasse algo mais...
Damísio Mangueira
Enviado por Damísio Mangueira em 09/12/2011
Reeditado em 13/12/2011
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