O PEQUENO FEVEREIRO

O PEQUENO FEVEREIRO (29 AGO 11)

(Fábula búlgara, recontada por William Lagos)

(Naturalmente, a Bulgária fica no hemisfério norte e as estações assim são invertidas).

O PEQUENO FEVEREIRO I

Quando ainda não havia humana raça,

os meses tinham corpos e eram gente

e entre si competiam, por pirraça...

Porque, de fato, foi o Senhor da Tempestade,

Perun, o pai de todos esses meses,

turbulentos e contenciosos de vaidade.

Um dia, Perun lhes trouxe cesta cheia,

cansado de os ver se arrancarem os cabelos

e a derramou sobre a mesa, após a ceia.

E logo os dias principiaram a pular,

pois não gostaram do tampo dessa mesa

e os meses começaram a gargalhar...

Acharam os dias engraçados, bonitinhos

e cada um queria uns para mascotes:

alguns pegaram para fazer carinhos...

Mas atacavam com as mãos, pela beirada,

e não deixavam nenhum cair no chão;

mas se uns poucos iniciassem a escapada,

logo eram presos pelos longos dedos

dos doze irmãos, os filhos de Perun

e alguns já os embolsavam em segredos.

O PEQUENO FEVEREIRO II

Outros dias pulavam nos seus colos

e brincavam com os meses, descuidados,

que hesitantes, não sabiam aonde pô-los...

Então Perun, já cansado de assistir,

falou: "Meus filhos, vocês podem escolher

e esses dias entre todos dividir..."

Nem bem o pai os tinha autorizado,

os meses se atiraram sobre os dias,

cada qual puxando mais para o seu lado!...

Agosto só queria os que eram quentes,

porém Dezembro preferia os frios

e os outros tinham gostos diferentes...

Assim, ficaram uns com trinta dias

e a maioria ficou com trinta e um:

nenhum deles ficou de mãos vazias...

Porém Março, a essa altura, já era vovó

e meio catacega e atrapalhada,

pegando deles vinte e oito só...

Enquanto Fevereiro, mais esperto,

colocava trinta e um dentro do bolso,

embora os dois sentassem-se bem perto.

O PEQUENO FEVEREIRO III

Baba Marta, "Vovó Marta", por Fevereiro

sentiu-se assim meio prejudicada

e pediu um de seus dias a Janeiro.

Mas este disse que pegasse com Dezembro,

cujos dedos já estavam congelados;

mas este disse que tirasse um de Setembro.

E Setembro tampouco quis lhe dar:

"Eu só fiquei com trinta, Vovó Marta,

peça a Maio para um dia lhe entregar..."

Porém Maio lhe indicou o mês de Julho,

que não quis ficar com menos do que Junho

e Baba Marta engoliu o seu orgulho...

Mas o tempo foi passando e descobrira

que Fevereiro, o seu irmão mais moço,

seus trinta e um dias conseguira...

E lhe falou, "Pequeno Setchko, Fevereiro,

dá-me um dia, por favor, que tem demais."

"Não, Vovó, tenho os mesmos que Janeiro..."

Contudo, Setchko apreciava beber vinho

e Baba Marta era a melhor destiladora,

muitas taças servindo a seu vizinho...

O PEQUENO FEVEREIRO IV

Assim Setchko com o vinho acostumou-se

e visitava Vovó Marta, em sua choupana,

que do mosto melhor sempre lhe trouxe...

E estando com frequência embriagado,

pois se aquecia assim no frio do inverno,

não percebia que estava sendo controlado.

Porque Marta preparava a sua armadilha,

só aguardando pelo melhor momento,

já que a tolice da embriaguez é filha...

Porém durante Março era comum,

conforme ela mudava de tenção,

que nunca se firmasse tempo algum.

Havia dias frios, com muita geada,

ou dias de sol, porém com muito vento

e noutros dias caía a chuvarada...

Embora, às vezes, fosse igual verão:

até as plantas suspeitavam primavera

e aqui e ali, formava-se um botão.

E o Pequeno Setchko bebia,

nos dias quentes, para se refrescar...

e nos dias frios, pois se aquecer queria...

O PEQUENO FEVEREIRO V

E aconteceu que calor primaveril

surgiu um dia, a vinte e oito de março,

parecendo já ser o mês de Abril...

E a Velha Fontana, que morava numa aldeia,

achando que suas cabras tinham fome,

ao ver tal dia de sol, nada receia...

"Ora," pensou, "o mês mais certo é Abril,

mas sou avó, igual que Baba Marta!...

Vou aproveitar esse lindo céu de anil..."

"A Vovó Marta não vai se incomodar,

decerto vai ter pena das cabrinhas,

que a relva verde anseiam por pastar..."

Assim, a velha subiu pela montanha,

com seu rebanho de cabras a balir,

aproveitando esse calor que a banha...

E ao chegar ao pasto verdejante,

enquanto os bichos comiam à vontade,

colheu framboesas para comer bastante...

E nem ao menos se lembrou de agradecer,

exclamando: "Chestita Baba Marta!..."

como é costume entre os búlgaros dizer...

O PEQUENO FEVEREIRO VI

"Feliz Vovó Marta!" no princípio desse mês.

Ela esquecera de dizer o mês inteiro!...

E não era essa a sua primeira vez...

E mesmo usando no pescoço pendurado

duplo pompom de lã, a "Martenitza",

comeu as frutinhas, sem o menor cuidado.

E o sumo lhe escorreu pelo pescoço,

empapando de vermelho um dos pompons,

tecido em lã de cabra, de fio grosso.

Que assim ficou branco só de um lado

e avermelhado pelo sumo que escorria:

até o cordão, que ficou todo encarnado...

E nem assim se lembrou de agradecer

e no sol se deitou, a ressonar,

fazendo a Vovó Marta enfurecer!...

E foi falar com seu irmão, também sentado

numa cadeira, em frente da choupana,

o qual já estava pelo vinho bem tocado.

"Pequeno Setchko, essa velha me ofendeu!"

"O que foi?" disse o irmão, abrindo um olho.

"Me empreste uns dias pelo vinho que bebeu!"

O PEQUENO FEVEREIRO VII

"Baba Marta, por que meus dias você quer?"

"Preciso que me empreste uma semana

e você bebe todo o vinho que quiser!..."

"Mas não quero vinho agora, já estou tonto."

"Você é tonto desde o dia em que nasceu...

Eu lhe dou o barril novo, está no ponto!..."

"Não quero agora, só lhe empresto um dia!"

"Vamos lá, irmãozinho, empreste seis...

Você me deve, prometeu quando bebia!..."

"Eu não me lembro de prometer-lhe nada!..."

"Está certo, então me empreste cinco dias,

que eu lhe darei toda a safra armazenada..."

"Ah, me deixe dormir, te empresto um dia..."

"Eu preciso de mais!" "Empresto dois..."

"Eu quero quatro," Baba Marta lhe insistia.

Até que prometeu-lhe que, anualmente,

lhe daria quanto vinho ele quisesse.

"Bem," disse Setchko, "agora é diferente..."

"Mas te empresto três dias, nada mais;

posso estar bêbado, mas não sou idiota,

talvez não queiras me devolver jamais..."

O PEQUENO FEVEREIRO VIII

"Está querendo me chamar de caloteira?"

"Não, maninha, mas sei bem que é ambiciosa:

vai devolver, verdade verdadeira...?"

E Baba Marta prometeu que devolvia.

O pobre Setchko ouviu de olhos fechados,

já suspeitando que sua irmã lhe mentiria...

Mas com sono, enfiou a mão numa algibeira

e balançou três dias amarrados...

Baba Marta agarrou-os, bem ligeira!...

E nem tampouco pensou em agradecer,

mas invocou muita neve e tempestade:

e assim Fontana não pôde se esconder!...

E se encolheu, enquanto o trovão rugia:

as gargalhadas que soltava Baba Marta!...

Num buraquinho a pobre velha se escondia...

Até que se gelou, desde a cabeça

até as pontas dos pés... E o coração,

depois que gela, nada existe que o aqueça...

E acabou por transformar-se em gelo

e o gelo endureceu e virou pedra:

da Martenitza a pedra guardou o selo...

O PEQUENO FEVEREIRO IX

Após três dias, enfim, chegou Abril

e os camponeses foram em busca da pastora,

a pobre velha, sob o sol primaveril.

A neve derretera e a relva apareceu:

todas as cabras pastando alegremente,

mas Fontana era pedra e assim permaneceu.

Porém a neve entre suas pernas escorria

e desde então, correu sempre essa fonte,

Fontan, em búlgaro, qual seu nome predizia.

E com a Martenitza ainda pendurada,

ao redor de seu pescoço de granito:

uma borla branca e a outra avermelhada!

Ficou esse costume, desde então:

para usar a Martenitza em duas cores,

as fabricantes lã de cabra tingirão...

E a fonte de Fontana permanece,

mas ninguém bebe, sem primeiro agradecer

a Baba Marta, numa breve prece!...

E quando o mês de Março se inicia,

todos dizem: "Chestita, Baba Marta!...

Que seja bom este mês que prenuncia!..."

O PEQUENO FEVEREIRO X

Baba Marta chegou em casa bem contente

e encontrou o Pequeno Setchko acordado,

mas seu humor era agora diferente...

Quando o irmão seus dias de volta lhe cobrou,

ela lhe disse: "Espere o ano que vem,

eu já os gastei e Abril também já começou."

Setchko, porém, lhe disse: "Eu só emprestei,

não vá ficar com meus dias para sempre!"

"Fique tranquilo: ano que vem, devolverei!"

Mas quando o novo ano começou,

o pobre Setchko, como sempre embriagado,

os seus três dias, assim mesmo, reclamou.

E Baba Marta falou: "Encontrei um halla,

nesse outono passado e lhe dei um:

com a ventania, eu já perdia a fala!..."

"Ele soprou-me um ar morno e me curou:

acho que o dia foi muito bem empregado!"

"E os outros dois, você não me guardou?"

"É que depois, outra vez me resfriei...

Quase morri, no último Novembro!...

Paguei um dia ao consultar um tzimey!...

O PEQUENO FEVEREIRO XI

Mas Setchko não ficou nada satisfeito:

"Esse dia era meu!... Por que o gastou?"

"Sou sua irmã mais velha e é meu direito!"

Setchko, bêbado, não compreendia bem:

"Pelo menos, me dê de volta o outro dia!

Não vai dizer que o pôs fora também!..."

"Eu não pus fora, não houve nada disso!

Mas encontrei uma lamya certa noite

e essa malvada me lançou um feitiço!..."

"E conseguiu me roubar um outro dia..."

"Mas Baba Marta, por que não um dos seus?"

"Estava em cima, era o primeiro que ela via..."

"Mesmo assim, eu o agarrei por uma perna

e ela não ficou com o dia inteiro!...

A sua ausência não lhe será eterna..."

"Quatro pedaços lhe darei, caro maninho,

a cada quatro anos, quando se completa...

Agora vamos, tome um pouco mais de vinho!"

Só que os três dias, escondera ela ligeiro...

Por isso agora tem seus trinta e um:

só vinte e oito tem o pobre Fevereiro!...

Ah, meu amigo, quem o álcool não descarta,

acaba pobre, que nem o Fevereiro!...

E nunca esqueça: "Chestita, Baba Marta!..."

O PEQUENO FEVEREIRO I

Quando ainda não havia humana raça,

os meses tinham corpos e eram gente

e entre si competiam, por pirraça...

Porque, de fato, foi o Senhor da Tempestade,

Perun, o pai de todos esses meses,

turbulentos e contenciosos de vaidade.

Um dia, Perun lhes trouxe cesta cheia,

cansado de os ver se arrancarem os cabelos

e a derramou sobre a mesa, após a ceia.

E logo os dias principiaram a pular,

pois não gostaram do tampo dessa mesa

e os meses começaram a gargalhar...

Acharam os dias engraçados, bonitinhos

e cada um queria uns para mascotes:

alguns pegaram para fazer carinhos...

Mas atacavam com as mãos, pela beirada,

e não deixavam nenhum cair no chão;

mas se uns poucos iniciassem a escapada,

logo eram presos pelos longos dedos

dos doze irmãos, os filhos de Perun

e alguns já os embolsavam em segredos.

O PEQUENO FEVEREIRO II

Outros dias pulavam nos seus colos

e brincavam com os meses, descuidados,

que hesitantes, não sabiam aonde pô-los...

Então Perun, já cansado de assistir,

falou: "Meus filhos, vocês podem escolher

e esses dias entre todos dividir..."

Nem bem o pai os tinha autorizado,

os meses se atiraram sobre os dias,

cada qual puxando mais para o seu lado!...

Agosto só queria os que eram quentes,

porém Dezembro preferia os frios

e os outros tinham gostos diferentes...

Assim, ficaram uns com trinta dias

e a maioria ficou com trinta e um:

nenhum deles ficou de mãos vazias...

Porém Março, a essa altura, já era vovó

e meio catacega e atrapalhada,

pegando deles vinte e oito só...

Enquanto Fevereiro, mais esperto,

colocava trinta e um dentro do bolso,

embora os dois sentassem-se bem perto.

O PEQUENO FEVEREIRO III

Baba Marta, "Vovó Marta", por Fevereiro

sentiu-se assim meio prejudicada

e pediu um de seus dias a Janeiro.

Mas este disse que pegasse com Dezembro,

cujos dedos já estavam congelados;

mas este disse que tirasse um de Setembro.

E Setembro tampouco quis lhe dar:

"Eu só fiquei com trinta, Vovó Marta,

peça a Maio para um dia lhe entregar..."

Porém Maio lhe indicou o mês de Julho,

que não quis ficar com menos do que Junho

e Baba Marta engoliu o seu orgulho...

Mas o tempo foi passando e descobrira

que Fevereiro, o seu irmão mais moço,

seus trinta e um dias conseguira...

E lhe falou, "Pequeno Setchko, Fevereiro,

dá-me um dia, por favor, que tem demais."

"Não, Vovó, tenho os mesmos que Janeiro..."

Contudo, Setchko apreciava beber vinho

e Baba Marta era a melhor destiladora,

muitas taças servindo a seu vizinho...

O PEQUENO FEVEREIRO IV

Assim Setchko com o vinho acostumou-se

e visitava Vovò Marta, em sua choupana,

que do mosto melhor sempre lhe trouxe...

E estando com frequência embriagado,

pois se aquecia assim no frio do inverno,

não percebia que estava sendo controlado.

Porque Marta preparava a sua armadilha,

só aguardando pelo melhor momento,

já que a tolice da embriaguez é filha...

Porém durante Março era comum,

conforme ela mudava de tenção,

que nunca se firmasse tempo algum.

Havia dias frios, com muita geada,

ou dias de sol, porém com muito vento

e noutros dias caía a chuvarada...

Embora, às vezes, fosse igual verão:

até as plantas suspeitavam primavera

e aqui e ali, formava-se um botão.

E o Pequeno Setchko bebia,

nos dias quentes, para se refrescar...

e nos dias frios, pois se aquecer queria...

O PEQUENO FEVEREIRO V

E aconteceu que calor primaveril

surgiu um dia, a vinte e oito de março,

parecendo já ser o mês de Abril...

E a Velha Fontana, que morava numa aldeia,

achando que suas cabras tinham fome,

ao ver tal dia de sol, nada receia...

"Ora," pensou, "o mês mais certo é Abril,

mas sou avó, igual que Baba Marta!...

Vou aproveitar esse lindo céu de anil..."

"A Vovó Marta não vai se incomodar,

decerto vai ter pena das cabrinhas,

que a relva verde anseiam por pastar..."

Assim, a velha subiu pela montanha,

com seu rebanho de cabras a balir,

aproveitando esse calor que a banha...

E ao chegar ao pasto verdejante,

enquanto os bichos comiam à vontade,

colheu framboezas para comer bastante...

E nem ao menos se lembrou de agradecer,

exclamando: "Chestita Baba Marta!..."

como é costume entre os búlgaros dizer...

O PEQUENO FEVEREIRO VI

"Feliz Vovó Marta!" no princípio desse mês.

Ela esquecera de dizer o mês inteiro!...

E não era essa a sua primeira vez...

E mesmo usando no pescoço pendurado

duplo pompom de lã, a "Martenitza",

comeu as frutinhas, sem o menor cuidado.

E o sumo lhe escorreu pelo pescoço,

empapando de vermelho um dos pompons,

tecido em lã de cabra, de fio grosso.

Que assim ficou branco só de um lado

e avermelhado pelo sumo que escorria:

até o cordão, que ficou todo encarnado...

E nem assim se lembrou de agradecer

e no sol se deitou, a ressonar,

fazendo a Vovó Marta enfurecer!...

E foi falar com seu irmão, também sentado

numa cadeira, em frente da choupana,

o qual já estava pelo vinho bem tocado.

"Pequeno Setchko, essa velha me ofendeu!"

"O que foi?" disse o irmão, abrindo um olho.

"Me empreste um dias pelo vinho que bebeu!"

O PEQUENO FEVEREIRO VII

"Baba Marta, por que meus dias você quer?"

"Preciso que me empreste uma semana

e você bebe todo o vinho que quiser!..."

"Mas não quero vinho agora, já estou tonto."

"Você é tonto desde o dia em que nasceu...

Eu lhe dou o barril novo, está no ponto!..."

"Não quero agora, só lhe empresto um dia!"

"Vamos lá, irmãozinho, empreste seis...

Você me deve, prometeu quando bebia!..."

"Eu não me lembro de prometer-lhe nada!..."

"Está certo, então me empreste cinco dias,

que eu lhe darei toda a safra armazenada..."

"Ah, me deixe dormir, te empresto um dia..."

"Eu preciso de mais!" "Empresto dois..."

"Eu quero quatro," Baba Marta lhe insistia.

Até que prometeu-lhe que, anualmente,

lhe daria quanto vinho ele quisesse.

"Bem," disse Setchko, "agora é diferente..."

"Mas te empresto três dias, nada mais;

posso estar bêbado, mas não sou idiota,

talvez não queiras me devolver jamais..."

O PEQUENO FEVEREIRO VIII

"Está querendo me chamar de caloteira?"

"Não, maninha, mas sei bem que é ambiciosa:

vai devolver, verdade verdadeira...?"

E Baba Marta prometeu que devolvia.

O pobre Setchko ouviu de olhos fechados,

já suspeitando que sua irmã lhe mentiria...

Mas com sono, enfiou a mão numa algibeira

e balançou três dias amarrados...

Baba Marta agarrou-os, bem ligeira!...

E nem tampouco pensou em agradecer,

mas invocou muita neve e tempestade:

e assim Fontana não pôde se esconder!...

E se encolheu, enquanto o trovão rugia:

as gargalhadas que soltava Baba Marta!...

Num buraquinho a pobre velha se escondia...

Até que se gelou, desde a cabeça

até as pontas dos pés... E o coração,

depois que gela, nada existe que o aqueça...

E acabou por transformar-se em gelo

e o gelo endureceu e virou pedra:

da Martenitza a pedra guardou o selo...

O PEQUENO FEVEREIRO IX

Após três dias, enfim, chegou Abril

e os camponeses foram em busca da pastora,

a pobre velha, sob o sol primaveril.

A neve derretera e a relva apareceu:

todas as cabras pastando alegremente,

mas Fontana era pedra e assim permaneceu.

Porém a neve entre suas pernas escorria

e desde então, correu sempre essa fonte,

Fontan, em búlgaro, qual seu nome predizia.

E com a Martenitza ainda pendurada,

ao redor de seu pescoço de granito:

uma borla branca e a outra avermelhada!

Ficou esse costume, desde então:

para usar a Martenitza em duas cores,

as fabricantes lã de cabra tingirão...

E a fonte de Fontana permanece,

mas ninguém bebe, sem primeiro agradecer

a Baba Marta, numa breve prece!...

E quando o mês de Março se inicia,

todos dizem: "Chestita, Baba Marta!...

Que seja bom este mês que prenuncia!..."

O PEQUENO FEVEREIRO X

Baba Marta chegou em casa bem contente

e encontrou o Pequeno Setchko acordado,

mas seu humor era agora diferente...

Quando o irmão seus dias de volta lhe cobrou,

ela lhe disse: "Espere o ano que vem,

eu já os gastei e Abril também já começou."

Setchko, porém, lhe disse: "Eu só emprestei,

não vá ficar com meus dias para sempre!"

"Fique tranquilo: ano que vem, devolverei!"

Mas quando o novo ano começou,

o pobre Setchko, como sempre embriagado,

os seus três dias, assim mesmo, reclamou.

E Baba Marta falou: "Encontrei um halla,

nesse outono passado e lhe dei um:

com a ventania, eu já perdia a fala!..."

"Ele soprou-me um ar morno e me curou:

acho que o dia foi muito bem empregado!"

"E os outros dois, você não me guardou?"

"É que depois, outra vez me resfriei...

Quase morri, no último Novembro!...

Paguei um dia ao consultar um tzimey!...

O PEQUENO FEVEREIRO XI

Mas Setchko não ficou nada satisfeito:

"Esse dia era meu!... Por que o gastou?"

"Sou sua irmã mais velha e é meu direito!"

Setchko, bêbado, não compreendia bem:

"Pelo menos, me dê de volta o outro dia!

Não vai dizer que o pôs fora também!..."

"Eu não pus fora, não houve nada disso!

Mas encontrei uma lamya certa noite

e essa malvada me lançou um feitiço!..."

"E conseguiu me roubar um outro dia..."

"Mas Baba Marta, por que não um dos seus?"

"Estava em cima, era o primeiro que ela via..."

"Mesmo assim, eu o agarrei por uma perna

e ela não ficou com o dia inteiro!...

A sua ausência não lhe será eterna..."

"Quatro pedaços lhe darei, caro maninho,

a cada quatro anos, quando se completa...

Agora vamos, tome um pouco mais de vinho!"

Só que os três dias, escondera ela ligeiro...

Por isso agora tem seus trinta e um:

só vinte e oito tem o pobre Fevereiro!...

Ah, meu amigo, quem o álcool não descarta,

acaba pobre, que nem o Fevereiro!...

E nunca esqueça: "Chestita, Baba Marta!..."

William Lagos
Enviado por William Lagos em 30/08/2011
Código do texto: T3191937
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