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Jonas não soube me contar direito por que expulsou, de modo tão brusco, a coitada da Dona Cadoca e seus oito rebentos da sua própria casa.

Senhora exemplar, apesar de um pouco chatinha, em nada influía ou contribuía para tornar sua vida melhor ou pior. Era uma folha em branco, só isso.

A única situação que Jonas define com clareza é a sua alegria ao se ver só, senhor absoluto do seu apartamento e das coisas que ele continha, principalmente a TV, onde adorava assistir o futebol nas quartas-feiras enquanto a mulher não dispensava a novela.

Assim que percebeu que estava enfim só, em vez do enfim sós, tão agradável de exclamar doze anos antes, deitou-se na rede da varanda e dormiu o sono dos justos, livre do barulho das crianças e do bulício da casa.

Acordou satisfeito, apanhou um livro e conseguiu fazer a mais deliciosa leitura da sua vida.

Bom, estava escurecendo, hora de pensar no jantar.

Foi fácil encontrar a cozinha que a pobre Candoca tinha acabado de arrumar quando foi expulsa do paraíso sem que, ao menos, tivesse induzido a degustação do fruto proibido que, dizem alguns, era uma maçã, mas eu, particularmente, não acredito, por ser uma fruta muito insossa, ao contrário, por exemplo, da manga espada, tão doce e sumarenta.

Bom, voltando à cozinha, agora do Jonas, o mesmo, depois de cavoucar a geladeira e os armários, separou alguns ovos, uma lata de ervilhas, alguns temperos e um saquinho de arroz.

- Farei uma bela comida, pensou ele. --- Ervilha com ovos e arroz bem temperado.

Enfileirados os ingredientes, descobriu que faltava o sal.

- Diachos. Resmungou.  --- Onde essa mulher guardava o raio do sal?

Descobriu, enfim, o saleiro, porém, vazio e lavado. Provavelmente a esposa, ou ex, iria comprar um pacote no armazém próximo, que agora já estava fechado.

Daí lembrou-se que as mulheres adoravam sair de pires na mão pedindo às vizinhas as coisas que lhes faltava.

Prontamente, bateu na porta do apartamento ao lado e perguntou se podiam lhe emprestar um pouco de sal; devolveria assim que comprasse o seu.

Os vizinhos disseram que ficariam ofendidos se ele fizesse isso e lhe deram um pacote fechado.

- Olha, não esquente ”seu” Jonas, a cesta básica que a empresa do meu marido nos dá vem com dois pacotes de sal, uma estupidez!

Agradeceu e voltou ao seu ofício de cozinheiro.

Mas, em vez da ervilha com ovos, decidiu preparar uma omelete, tão simples e prática de fazer.

Sua dúvida era como as mulheres conseguiam fazê-la tão redondinha e dourada, apetitosa para os olhos e o paladar.

Arrumou uma vasilha funda, quebrou os ovos e despejou com casca e tudo, acrescentou as ervilhas, os tomates, colocou sal, pimenta e canela em pó e amassou tudo com o pilãozinho do almofariz.

Agora, estava na hora crucial: como arredondar a omelete.

Despejou a massa num prato raso, apanhou a tampa da panela e tentou, com ela, dar forma à omelete. Não conseguindo, desde que tudo se esparramava pelas bordas, resolveu fritar assim mesmo, já que não era uma obra de arte e sim, uma refeição.

Neste momento, pintou uma leve saudade da mulher, que logo passou e ele saiu à cata do óleo de cozinha, pois tinha uma vaga lembrança de que era frita.

Encontrou mais facilmente o azeite doce e resolveu brindar-se com o que havia de melhor.

Gastar o azeite tão caro, que era reservado apenas ao bacalhau do domingo, usando para fritar omelete lhe parecia um grito de liberdade.

Derramou parte do azeite na frigideira e, quando aqueceu, jogou a mistura lá dentro.

Pois a mistura, uma vez no fogo ensandeceu-se e começou a bufar e pipocar como louca. Um pedaço de casca do ovo, num desses saltos, bateu justo no seu olho, deixando-o momentaneamente cego.

Blasfemou, disse palavrões cabeludos que não costumavam frequentar aquela cozinha.  A mistura queimada lhe deu repugnância, jogou tudo na lixeira e saiu para jantar.

Estando o macho bem alimentado, dormiu o sono dos justos. De manhã, tomou café no escritório, almoçou num restaurante por quilo e começou a pensar no jantar. Fritaria uns bifes.

Em casa, atrapalhou-se com as panelas; não sabia para que as mulheres precisavam de tantas e com tantos formatos diferentes.

Apanhou uma panela funda, encheu de óleo e colocou os bifes que comprou no supermercado, já cortados. Não se lembrou de lavá-los e temperá-los.

Eram sete da noite. Acendeu uma boca do fogão, colocou a panela e saiu.  Meia hora depois entrou na cozinha para ver o resultado do seu trabalho. Sentia-se quase um  chef, quem sabe um  Adrià.

Decepção profunda! Encontrou uma coisa escura e malcheirosa que fervia soltando uma terrível espuma esverdeada.

Assustado, desligou o gás certo de que aquilo deveria ser uma das bocas do inferno e, a qualquer momento, o diabo sairia dali empunhando um tridente.

Alucinado pela raiva e morto de fome correu para a casa da sogra atrás da mulher.

Foi recebido com impropérios e levou a porta na cara.

A mulher não voltou.

 

Miriam de Sales Oliveira
Enviado por Miriam de Sales Oliveira em 12/07/2011
Código do texto: T3090524
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