A DOR DE DENTE DO PRIMEIRO MINISTRO DE GOROBIXABA (Aleixenko Oitavo)
A DOR DE DENTE DO PRIMEIRO MINISTRO DE GOROBIXABA
O Primeiro Ministro de Gorobixaba, ALEIXENKO OITAVO, saiu do trabalho do Palácio Penkago com um dor de dentes daquelas. Já chegou em casa na maior gemedeira.
- Ái. Ui. Ái .
A mulher dele, senhora DALILIKOVA perguntou:
- O que é isso “preto”? (apelido carinhoso, que qualquer um está sujeito no lar)
- Estou com uma dor dente daquelas de deixar qualquer um maluco.
- Ora! Vai ao dentista.
Naquele medo característico que todos nós temos de dentista foi rápido e enfático.
- Mas é nemmm!!
A esposa não comentou nada e foi cuidar dos afazeres domésticos e não mais se preocupou com o marido. Este ao ver que a esposa havia deixado a ele a escolha da dor ou da cura tomou rumo do dentista.
Manja só dentista de periferia! Diz-se prático, mas prática mesmo é pouquíssima. O consultório é aquele cubículo, se chove as goteiras são maiores dentro do que a chuva lá fora, se faz sol o calor dentro é o mesmo de dentro da cuscuzeira. O que é pior, já é pequeníssimo e ainda subdividido com a recepção. Mas deixa para lá, isso é o de menos, vamos ao referido Dr. Cirurgião Dentista, com letras maiúsculas que é para destacá-lo e honrá-lo com as devidas deferências. O dito cujo nunca nem passou à porta de uma faculdade e/ou universidade, nem tão pouco leu uma linha se quer sobre odontologia, muito menos viu ou conversou com um odontólogo sobre dentes e similares. Isto também é irrelevante, vamos ao profissional prático, o qual com um boticão na mão é DOUTOR, não pergunte porquê, pois vou me embananar todo. Deixemos os circunlóquios e vamos aos entretantos que aos finalmentes chegaremos logo logo.
O Primeiro Ministro, como já dissemos foi ao dentista, ou seja, se encaminhou ao “Consultório Dentário”.
Ainda não definimos a secretária, então passemos a ela: loiraça, tipo escultural, alta, fala mansa e dengosa, batom berrante, cor de uva; esmalte escandaloso cor de sangue; em fim o arquétipo de secretária faz-tudo; agenda clientes, espanta os mesmos quando necessário, puxa saco se for o caso, deita com o patrão na cadeira de dentista quando não tem freguês e com estes quando o tira-dentes se ausenta.
O enfermo chegando à secretária, todo assustado perguntou, assim meio enrolado:
- O denfista estaf...?
- O que moço?
A megera nem se quer se dignou tirar os olhos da cutícula que estava a escarafurunchar. Mania de secretária de dentista prático.
- O Douftorr está?
- Como é que é? Quem está onde?
Com aquela dor escabrosa e aquela burroira, tinha que apelar. Gritou:
- O FILHO DA PUTA DO DENTISTA ESTÁ?
- Sinto muito, mas o Dr. não tem filho não moço.
Sir ALEIXENKO OITAVO apelou:
- O DIABO QUE TE CARREGUE, EU QUERO RANCAR UM DENTE.
- Ah! Por que não disse logo. O Sr. Vai ser atendido num minutinho e só aguardar.
Ela entra por uma porta tipo duas folhas, ou melhor, daquelas que abre a metade para um lado e a outra logicamente para o outro. Delonga por no mínimo uns bons vinte minutos, sai de lá ajeitando a saia, limpando as mãos em toalhas de papel. Senta-se na sua poltrona giratória, retoca o batom, vira para o infeliz ali do lado e diz:
- Assim que Dr. tomar um fôlego, ele vai atendê-lo.
- Tomar fôlego de que?
- Deixa de ser curioso, se preocupe com sua dor de dente e espere a sua vez de estar lá dentro com ele.
O coitado já não suportava mais a dor, mas esperou. Uns intermináveis cinco minutos e eis que é autorizada sua adentrada ao “consultório” propriamente dito. Ele vê um jaleco ensebado, e dentro deste um molambo de homem; amarelo, suado, os cabelos em desalinho, parecia até que o bicho tinha brigado com um bando de gatos ainda há pouco. (Se bem que a luta foi só com uma gata).
- O que o Sr. está sentido?
Perguntou o do boticão.
- Uma dor de dente horrorosa.
- Deixe-me ver. Abra a boca.
ALEIXENKO OITAVO abre assim meio que na marra, com uma careteira de dor. O esmolambado pega no primeiro dente que lhe parece estar doente, sacode para lá e para cá, e pergunta:
- É este que está doendo?
O “preto”, com a boca toda dolorida, nem sabia mais qual o dente que doía, e responde:
- Sim. É este mesmo.
O ranca-dentes sem mais delongas providencia a anestesia e com a sutileza que lhe é peculiar arranca-o. Nosso amigo apesar da boca dormente, uma dorzinha brejeira, ainda sorri ao passar pela boazuda da secretária, e volta para casa feliz da vida. Ao chegar em casa todo contente gaiofa com a esposa.
- Aquilo é que é mulher!
- Que mulher homem de Deus?
- A atendente do doutor.
- Pois então providencia ela para lavar sua roupa, cozinhar para você, dar de vez em quando, e até logo que já falei muito.
A mulher fez a trouxa, deu um nó na boca do saco e partiu para casa da mãe.
Quando a anestesia acabou...a dor anterior voltou com a carga toda, o Primeiro Ministro ALEIXENKO OITAVO percebeu que tinha autorizado arrancar o dente errado, pois este se encontrava ali bem intacto e o buraco do lado não deixava duvidas quanto à besteira cometida. E para piorar, havia cometido a asneira de elogiar aquela puta do dentista, o que tinha feito com que a mulher fosse para a casa da mãe, sua sogra. Ainda pensou: "aquela megera”!
Estava conformado com a dor, ele merecia: tinha procurado aquele rábula metido a dentista, tinha autorizado a extração de um dente sadio no lugar de um podre, tinha elogiado aquela piranha perante sua mulher, era bom que doesse bastante para espiar seus pecados e burrice.
Na próxima encarnação ele queria ser tatu. Deu uma boa risada só em pensar “tatu é desdentado, como iria ter dor de dente?”. Pensou um pouco mais e daquela risada passou a ojeriza, pois tatu é caçado por cachorros e estes mordem doído como o quê. Talvez quem sabe ele se reencarnasse num ouriço que também é desdentado, ou não é, se não e daí. Gargalhou gostoso “quero ver cachorro morder em ouriço!” De risada em risada e em gargalhada ele se esqueceu da dor, o dia passou, a mulher se arrependeu e voltou...
Mas a maldita dor também.
(julho/1999)
Por ALEIXENKO OITAVO, Primeiro Ministro de Gorobixaba