O FILADOR DE CIGARROS

Quando eu era membro da banda de música municipal, regida pelo maestro Major Bellini Andrade, tinha um colega daqueles “serrotões” o Almir Serrote. É infalível, todo lugar tem um. Esse, não deixava a gente fumar sossegado, era um tal de “me dá a guimba”, “me dá um cigarro”, “me dá uma tragada”...Filava de tudo, um copo de cerveja, um pedaço de doce... Certa vez chegou um dos colegas chupando um picolé e ele mais que depressa:

-Me dá uma mordida? O Colega levando na maldade disse:

-Mordida não dou, mas deixo você dar uma chupada...

Certo dia ele foi chegando, estávamos reunidos para o ensaio noturno, e nosso colega, Eustáquio das Chagas, estava fumando, quando o Serrote foi chegando. Mais que depressa falei com ele:

-Esconda o maço de cigarros, o Serrote vem vindo. Eu sempre escondia o maço de cigarros nas meias, ou dentro da cueca. Eustáquio mal humorado, cansado pelo dia de trabalho como pedreiro disse:

-Não vou esconder nada e não vou dar cigarro para aquele vagabundo!

Serrote quando via um maço de cigarros no bolso das camisas da gente, sem fazer cerimônia ia metendo a mão e tirando um ou mais cigarros.

Ao ver Estáquio fumando disse apontando para o cigarro:

-Cadê o irmão deste?

Eustáquio rispidamente respondeu:

-O irmão deste, morreu queimado.

Certo dia, eu já cansado da exploração dele, resolvi dar-lhe uma lição: arranjei um pouco de pólvora tirada de uma bombinha, e fui preparar um cigarro para ele. Pacientemente tirei um pouco do fumo do cigarro com uma pinça, coloquei no lugar do fumo a pólvora. Soquei á pólvora como se o cigarro fosse uma espingarda pica-pau, e voltei o fumo retirado, para o cigarro. Foi um verdadeiro trabalho de artífice, não dava para notar nada de diferente. A quantidade de pólvora era pequena, era só para assustar. Fui para a aula e deixei o cigarro separado do maço e contei para alguns colegas. Logo Serrote foi chegando, ao vê-lo, acendi um cigarro. Ele de longe já foi falando:

-Tô na guimba!

Eu falei:

-Nada disso, me deixe fumar sossegado, tome um cigarro e não me encha o saco.

Ele estranhou minha generosidade, mas aceitou prazerosamente o cigarro. Ia acendê-lo quando o maestro nos mandou entrar. Logo no início da aula o maestro disse:

-Vamos ensaiar hoje o dobrado “Capitão Caçula”. Como o maestro fumava e era liberal, permitia que fumássemos durante a aula. Serrote havia acendido o cigarro e como tocava instrumento de percussão, caixa surda, continuou fumando e tocando. Eu tocava saxhorne, e quando havia algum solo, com preguiça de acompanhar a partitura, tocava de “ouvido”. O maestro tinha um ouvido sensível: no meio de 28 instrumentos, chegava perto de mim e dizia:

-Ta “oreiano!”, “ta oreiano”!

Eu estava com um olho na partitura e outro no serrote. Ele dava uma tragada e eu pensava:

-É agora, é agora”.

Serrote alheio aos meus pensamentos, fumava placidamente seu cigarro.

Em dado momento, a brasa do cigarro chegou à pólvora... Foi aquela tira de fumaça e fogo! Ele apavorado jogou o cigarro fora gritando:

-Puta que pariu!

Parou o ensaio. Caímos na risada, foi uma farra... Ele nunca mais aceitou cigarro de mim...

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HERCULANO VANDERLI DE SOUSA
Enviado por HERCULANO VANDERLI DE SOUSA em 28/03/2011
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