A URSA DO IGLU & MAIS

A URSA DO IGLU I (13 mar 11)

Há uma luz no iglu, a qual atrai

da ursa branca sua curiosidade.

Estende seu pescoço, sem vaidade:

quem sabe algo de comer não sai?

Ela percebe a estranha atividade

em seu ambiente e à procura vai

desse objeto que o desejo embai

ou na suspeita de qualquer malignidade.

Pois certamente é um iglu artificial,

colocado dessa forma, em chamariz,

para que seja em vídeo captada.

Mas não percebe o intruso que, afinal,

lhe está a boa distância do nariz,

com a teleobjetiva bem focada...

A URSA DO IGLU II

Porém, estranhamente, os dois filhotes

o olhar fixo pousam nesse intruso,

atrás da mãe escondidos, no profuso

campo de gelo em que vivem sem fricotes.

Para esse clima já possuem certos dotes:

são predadores natos, no difuso,

cinza nevoeiro seu pelame é escuso

e sobrevivem sem o luxo das mascotes...

A ursa-mãe, em forçada posição,

seu pescoço protendido e o dorso alçado,

até parece estar posando para a imagem...

Talvez receba depois uma ração,

como cachê pelo esforço realizado,

misto de fome e laivos de coragem.

A URSA DO IGLU III

Sem dúvida, esse iglu é bem pequeno

e não parece estar bem rejuntado,

por estrangeiro decerto improvisado,

erguido apenas no meio do terreno...

O seu calor interno mais ameno

pode tornar tal páramo gelado;

ou quem sabe, existe um peixe defumado

para atrair o faro em brando aceno...

Mas nada disso engana os dois ursinhos,

para a câmera a olhar diretamente:

focinho e olhos negros sobre o gelo...

Pois cabe à ursa alimentar seus filhotinhos

e assim estica o pescoço, firmemente,

sem mostrar qualquer receio de perdê-lo...

A URSA DO IGLU IV

Mas, por sorte, é gentil essa armadilha:

não vieram os Inuit a essa caçada, (*)

nem se pretende a fera aprisionada

ou abduzida para estranha trilha...

A precaução da experiência é filha:

sendo ela a predadora, teme nada;

provavelmente, nem sequer foi atacada,

anda tranquila ao longo de sua ilha.

Nem sequer teme que, ao ser fotografada,

a sua alma lhe tomem, mais sensata

que muita gente de vezo mais selvagem.

Ou, quem sabe, foi sua alma congelada

neste vídeo...? Para sempre marchetada,

em tal curiosa e rechonchuda imagem...

(*) O verdadeiro nome dos esquimós.

TRAMELA I

Um lusitano queria trancar sua porta:

perdera a chave para a fechadura

e, num acesso de inspiração pura,

prendeu-lhe roda de madeira torta.

Mas esse giro que tal roda importa

mantinha a porta fechada e sempre dura.

Enraiveceu-se e, num ato de loucura,

deu um soco na madeira da comporta.

Ela rachou e assim, partiu-se ao meio...

Quando ficava só na vertical,

abria-se a porta sem dificuldade...

Porém se a girassem, sem receio,

deixada em posição horizontal,

ficava a porta trancada de verdade...

TRAMELA II

Maravilhou-se o português com sua invenção:

fez mais uma para o postigo da janela;

para a porta dos fundos, coisa bela,

e até prendeu com outra o seu portão!...

Pois bem depressa isso chamou a atenção:

e como tinha o sobrenome de Tramela,

os seus vizinhos, sem qualquer balela,

passaram a encomendar-lhe uma porção.

Até que veio um comerciante e encomendou

mil e quinhentas tramelas de uma vez...

O lusitano enfureceu-se na ocasião

e o comerciante quase maltratou:

"Mas eu só quero ser o seu freguês!"

"O que tu queres, é rebentar-me a mão!..."

TRAMELA III

"Mas estás doido, Manuel! Se me bateres,

tua mão poderá ser machucada,

mas sou eu que vou ficar de cara inchada!

Como podes, então, isso dizeres...?"

"Pois então? Poucas faço, com prazeres:

recorto a roda e deixo pendurada

numa parede. Depois dou-lhe uma pancada

com o punho, para a tramela teres...

"Ela se racha em duas, sem emendas;

mas o meu punho fica mal disposto,

não estás vendo como está arranhado...?"

E desse modo, não se acertaram vendas,

"nas lindas tardes de agosto, ao sol posto,"

como cantavam naquele velho fado...

SOLUÇÃO FINAL

Um dia, em que fazia muito frio,

o meu cachorro viu um trilho quente.

A descoberta o deixou muito contente

e foi logo se aquecer, com todo o brio.

Depois dormiu e o rabo fino e esguio

sobre o trilho deixou indiferente.

Um trem passou, cortou-lhe o rabo rente

e o cachorro levou um susto de arrepiar!...

Só de raiva, tentou morder o trem,

que prontamente lhe arrancou a cabeça,

do pobre bicho a vida dando cabo...

Pois dou conselho pra você também:

é importante que jamais o esqueça:

Nunca perca a cabeça por um rabo!...

MATUTO

Um cara olhava o relógio da estação:

os dois ponteiros juntos sobre o doze;

virava o rosto, depois fazia pose,

como quem mostra grande hesitação.

Chegou um guarda, estranhando a posição

e indagou: "Por que está parado

no meio do caminho? Está aloprado?"

"Eu só quero saber que horas são..."

"Mas não está vendo? É exato meio-dia!"

"É que eu cheguei de trem e adormeci

no meio da viagem. Não sabia

se era meia-noite a hora que eu via..."

"Mas não está vendo o Sol, bem alto, ali?"

"Ah, me desculpe! É que eu não sou daqui..."

GURI CHATO

No banco da praça, um cara lia o jornal.

Chegou um garoto e logo perguntou:

"Tio, o que eu tenho na mão?" ele indagou.

"Eu não sei", resmungou o cara, afinal.

"Não sei e nem quero saber qual

a porcaria que tua mãe deixou

pegares por aí!..." E pronto retornou

à sua leitura da folha matinal.

Mas o garoto insistiu: "Tio, adivinha!"

O homem suspirou: "É uma moeda?

Uma bala? Um pião? Alguma cria

de lagarto? Minhoca? É uma espinha?

Me deixa em paz, garoto, não enreda!"

"Tu errou tudo!... Minha mão tem paralisia!"

AMENDOIM

Em um ônibus, tranquila, viajava

senhora idosa, para outra cidade,

num assento da frente e, em sociabilidade,

com o motorista assunto ela puxava.

Era de noite e, às vezes, alcançava,

enquanto palestravam sem maldade,

para do sono espantar a intensidade,

um amendoim que o motorista mastigava.

Chegou o momento em que o motorista

falou: "Vovó, não me dê tanto amendoim,

logo vai ver que nada lhe sobrou..."

"Ah, não se preocupe e não desista!...

É que eu não tenho dentes... Chupo assim

primeiro o açúcar e só depois lhe dou!..."

GAIVOTA (19 MAR 11)

Pela praia passeavam o Manuel e o Joaquim.

De repente, uma gaivota sobrevoou

e, na careca do Manuel, fez um cocô:

deixou o coitado todo sujo assim!...

Ele pediu ao amigo: "Dá pra mim

o papel higiênico? Você não guardou

um pedaço no bolso...?" O outro reclamou

que era inútil gastar papel assim...

"Um pedacinho até que te consigo:

trago no bolso, porque nunca é demais,

mas não adianta, ô Manuel, que diabo!

Pois então não vês, meu bom amigo?

A gaivota já está longe! Como vais

pegar o bicho e depois limpar-lhe o rabo...?"

William Lagos
Enviado por William Lagos em 26/03/2011
Código do texto: T2870986
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