PASCALINA & MAIS
PASCALINA
SEGUNDO FALOU PASCAL,
O HOMEM É SÓ UM CANIÇO,
MAS UM CANIÇO PENSANTE.
PARECEU-LHE NATURAL
ENQUANTO DIZIA ISSO,
QUE PENSAR FOSSE IMPORTANTE.
COMO SE APENAS PENSAR
MELHORES JÁ NOS TORNASSE
QUE AS PLANTAS OU ANIMAIS.
E SE PODE IMAGINAR,
SE TODA GENTE PENSASSE,
QUE ACRESCENTASSE ALGO MAIS.
PORÉM SE VÊ TANTA GENTE
QUE SOMENTE PENSAR PENSA,
MAS SE PENSA, PENSA MAL.
E O CANIÇO, NO PRESENTE,
EM SUA ESTRUTURA TENSA,
À BEIRA DO LODAÇAL,
VIVE TANTO QUANTO NÓS
E QUEM SABE SE NÃO PENSA,
NAS RAÍZES DA TOUCEIRA.
QUE NUMA VERDADE ATROZ,
ELE ATÉ PENSE QUE PENSA,
MELHOR QUE A AVE LIGEIRA,
SER ATÉ MELHOR QUE NÓS,
QUE MELHOR QUE O VENTO ADENSA,
EM SUA VAIDADE ALTANEIRA.
COLOCAÇÃO
Por toda a Europa correu uma questão,
cuja resposta atinar não se podia:
esse problema, de fato, consistia
mais num trabalho de distribuição.
Como alojar vinte e quatro judeus
em um só Volkswagen, simplesmente?
Cada qual dava resposta diferente,
algumas sábias, outras de sandeus...
Levaram anos estudando o tema,
sem que ninguém descobrisse o que se faz,
com tanta gente, num carrinho sem poleiro...
Mas a SS resolveu fácil o problema:
dois no banco da frente, sentava dois atrás
e os outros vinte, punha dentro do cinzeiro!...
CACAREJO (cumprimentos a Maurício de Souza)
Na Roma antiga, costumavam gladiadores,
antes de combater, conforme estudam
os historiadores, pois costumes mudam,
apresentar-se perante seus Imperadores...
"Ave, César!" -- demonstrando seus valores,
"os que vão morrer" -- diziam -- "te saúdam!..."
É apenas na coragem que se escudam,
não esperavam obter quaisquer favores...
Porém, num galinheiro, há outras "aves",
que em saudação bem diversa se apresentam
e das cascas bem depressa se desnudam,
bem perfilados, igualmente graves,
os ovinhos veem seu pai e cumprimentam:
"Ave, galo! Os que vão nascer te saúdam!..."
CROCHÉ I (para Neusa Tânia)
Conviveu um casal sessenta anos,
em plena harmonia e confidência:
falavam sobre tudo com paciência,
nas horas de alegria e desenganos.
Um dia, como todos os humanos,
chegou o momento da final consciência:
ela foi desenganada, sem clemência,
depois de tantas lutas e afanos...
O marido sentava-se a seu lado
e um dia, finalmente, decidiu-se:
"Querida, aquela caixa de sapatos..."
"Sempre evitei," lhe disse com cuidado,
"abrir a caixa, porque você me disse
que respeitasse seus ocultos fatos..."
CROCHÉ II
"Está certo, acho que chegou o momento
de lhe mostrar o que guardo dentro dela,
lá no alto do armário, ao lado da janela..."
Ele foi então buscar, sem adiamento.
Quando a abriu, para seu espantamento,
duas bonecas de croché encontrou nela
e, mais abaixo, envolto em velha tela,
havia um pacote, que foi abrir bem lento...
Eram 95 mil dólares em dinheiro!...
E perguntou-lhe o que significava.
"Bem no começo de nosso envolvimento,
a minha avó me aconselhou primeiro
que um casal por bobagem não brigava:
esse é o segredo de um bom casamento..."
CROCHÉ III
"Quando eu ficasse com raiva de você,
deveria ficar quieta e me conter:
que procurasse, para espairecer,
tecer uma boneca de croché!..."
Ficou o velhinho comovido, já se vê.
Todo esse tempo ela só fora fazer
duas bonecas, para assim dizer
até que ponto em seu amor tivera fé...
Mas então, ele indagou: "E o dinheiro?
Para que foi que você economizou?
Por que guardou tanto dinheiro aqui...?"
"É que sobraram só duas, companheiro:
esse dinheiro todo resultou
das mil e tantas bonecas que eu vendi!"
CROCHÉ IV (Coda)
E é por isso que, antes de dormir,
eu me ajoelho a pedir sabedoria;
e a paz do Senhor minha vida guia:
mesmo com raiva, consigo até sorrir...
Eu peço amor, para perdoar o agir
de minha parceira, desde o nascer do dia;
paciência de aguentar o que fazia:
pedir forças para quando me feria...
Porque eu sei, que se Deus não me ajudar,
dando-me amor, mais paciência infinita,
não saberei o que fazer... Pois é...
Acho que bato nela, até matar!...
Se a desgraçada por demais me irrita:
porque eu nunca consegui fazer croché!...
LEITO DE MORTE I
Um judeu velho estava agonizante,
em seu leito de morte, e a família
juntou-se a seu redor. Chamou a filha:
"Raquel..." "Estou aqui, Papá, sempre constante..."
Ao ver chegar o seu último instante,
o judeu chamou os filhos, um a um,
só para ver se faltava ainda algum,
depois a esposa, que fora fiel e amante.
Ali estava até mesmo, concentrado,
o seu irmão rabino, entoando a ladainha,
todos contritos, sentados lado a lado.
E ao ver que a negra morte se avizinha,
indagou o ancião, muito angustiado:
"Mas então, quem está cuidando da lojinha...?"
LEITO DE MORTE II
Outro judeu, também esperando a morte,
quis conversar com seu filho mais velho:
que ninguém mais metesse o seu bedelho
nessa conversa de portentoso porte.
Saiu a mulher, cobrindo até o espelho,
com panos pretos para dar um corte
em qualquer aparição da feia sorte,
costume antigo a sustentar parelho...
"Jacó," falou o velho, fracamente,
tirando o anel que sempre usava ao dedo,
"este anel há gerações vem a passar
de um pai para seu filho, permanente...
Gostou, meu filho, desse meu segredo?"
"Sim, Papá..." "E então, vai me comprar?"
LEITO DE MORTE III
E teve o outro, que fora milionário
e deixou aos três filhos a fortuna:
"Não quero atravessar a última duna,
sem levar nada, qual fora um perdulário.
Quando eu morrer," exigiu, atrabiliário,
"cada um de vocês põe no caixão
cem mil reais, bem mais que o dinheirão
que vai herdar de mim, seu salafrário!..."
Após a cerimônia, em obediência,
os dois mais moços colocaram no ataúde,
cem mil reais cada. E o terceiro,
olhando para os dois, com impaciência,
pôs um cheque de 300. "Tem gente que se ilude..."
E, bem depressa, agarrou todo o dinheiro!
ELEIÇÕES I
No dia Trinta e Um, o último dia
do mês de outubro, celebram o Hallowe'en,
mas nessa data se comemora assim
também o Dia da Reforma, que surgia
nos confins da Alemanha, que jazia
até então na escuridão, enfim,
das indulgências, cobradas com o fim
de enriquecer a Igreja que luzia...
Neste ano, nós teremos eleições
até o por-do-sol e desde a alva,
reproduzindo do Calvário a cruz...
Porque um candidato, às multidões
proclama o santo lema: "Jesus Salva!"
e a outra que "Maria... É a mãe de Jesus!"
ELEIÇÕES II
Até o fim do mês, os candidatos
vão cravar seus espetos o mais fundo
que conseguirem, o rosto rubicundo
na acusação de fatos e boatos...
Este debate tornou-se mais profundo
que o do primeiro turno, qual dois ratos
querendo o queijo e prometendo fatos
que não conseguem iludir nem moribundo.
Nessa sua ânsia de agradar o povo,
cada qual se faz de bom, ninguém é mau
(esperam que a promessa a gente esqueça),
perante os olhos do eleitor mais novo...
Mas não te olvides que tu és degrau
e os dois só querem pisar na tua cabeça!