NO VELÓRIO DA "EX"

Eu, sinceramente, nunca havia ouvido nada parecido com o que vou lhes relatar.

A bem da verdade, eu peguei o bonde andando quando eu o ouvi exclamar ao amigo:"Gente, que velório supimpa!" e claro, prestei atenção no que se tratava porque quanto mais a gente acha que já viu de tudo...percebe que ainda temos muito por ver.

E não era que o velório era da sua ex- mulher?

Um adendo:

Quando eu era criança sempre ouvia minha família me dizer que tínhamos alguns parentes "de longe" que só encontrávamos em duas ocasiões: nos velórios e nos casamentos.

Como eu era criança, ainda não entendia como se podia encontrar a família apenas nessas duas ocasiões, digamos, a meu ver- naquela época- muito distintas, já que aparentemente uma era ocasião de muita tristeza e outra de muita alegria.

Com o tempo fui percebendo que não era bem assim não e hoje, já com certa experiência de vida, vejo que as coisas mudaram tanto que chegaram até a se inverter, isso sim!- Hoje tem gente que chora muito nos casamentos ( eu respeito, não discuto!) e como lhes descreverei , tem aqueles que curtem e riem muito nos velórios.

Tempos modernos, sem sombra de dúvida.

E ele, alegremente, continuava a relatar os detalhes da festa de morte da sua "ex".

Claro, eu já sabia que hoje já podemos, de maneira prática, econômica e elegante, preparar a grande festa da nossa "ida" exatamente aos moldes dos requintes duma grande festa de casamento.

Mas confesso que não me empolgo muito em encomendar uma festa da qual participarei duma forma tão passivamente estática depois de ter pago a conta toda...de forma tão ativamente dinâmica.

E ainda ter que aguentar lá do "outro lado" alguém reclamar da festa?

Nem todos são tão animados e gratos como aquele ex...

Prefiro deixar para alguém pagar o luxo...o que acham? Não estou certa? Ou sou egoísta?

E ele, sempre animado, continuava: "comida da melhor, cara! Os antepastos de tomate seco, os canapés de salmão, o vinho, a cerveja, o suco de uva, a música que se podia escolher ali mesmo, ao gosto musical do freguês, cara, tudo no capricho!- só lamentei que não tinha um churrasquinho supimpa..."

E quem disse que não?

Afinal, ele havia começado a contar da festa dizendo que a sua "ex"

optou pela cremação. E ainda comentou:"coitada..."

Não, aquilo era demais para os meus ouvidos."Tenho que escrever", decidi.

Mas como ninguém é perfeito, ainda mais se tratando de alguém no velório da "ex", digo-lhes que ele ainda aproveitou para reclamar:

"Pô amigo, agora tenho que pagar o inventário porque a separação não estava oficializada...uma grana para uma festa daquela e a despesa do inventário correrá por minha conta. Um dinheirão!"

Ao leitor eu posso confessar: Como achei que ela fez bem! Que cara mais pão- duro!

Mais que certo, afinal, nada é gratuito em se tratando de acertar as contas dos "ex", e pelo que vi ele saiu do velório feliz...e de barriga bem farta. Tem que pagar alguma coisa, ora essa, eu concordo com a ex-defunta!

E depois, orgulhosamente pela parte que lhe cabia, ainda concluiu ao amigo: "Cara, aquela mulher tinha bom gosto... ah, se tinha..."

Enfim, com aquele "ex" eu aprendi que casamentos e velórios...bem, me desculpem a conclusão, podem ser festas bem parecidas.

Podem ou não podem?

Nota:

Incrivelmente verídico.