O ZÉ E O SEU DOUTOR

E eu, sempre às voltas com as revoltas do doutor João. .

Mal a manhã acabara de começar e o doutor João, aquele meu amigo, já estava de cabelos em pé, a bem da verdade, seus poucos fios que lhe restaram depois de tantos anos trabalhando nas reviravoltas daquele pronto socorro.

E eu , lá tentava ajudá-lo como podia, porém era inevitável, aquele seu Zé que sempre deixava o doutor nervoso acabara de chegar mais uma vez, como fazia há exatamente vinte anos, pontualmente na mesma hora e sempre com a mesma queixa, tudo muito igual:

-Doutor, doutor, socorro, estou passando mal de novo!

-O que é dessa vez seu Zé, ao menos uma queixa diferente?

-Não doutor, antes fosse, é aquela mesma que o senhor já conhece! Sinto que vou morrer, a sensação é de que a morte chegou para me levar, pega meu pescoço e aperta o meu peito. O senhor olha o meu coração?

-Vamos lá seu Zé, vamos ver, se acalme, respire fundo, afinal, todos vamos morrer...um dia.

-Doutor, o problema é que meu dia chegou. É hoje! È sim doutor, acredita em mim! Eu estou sentindo e nunca me engano com os meus sentimentos!

-Tá certo, tá certo, há vinte anos que o senhor espera por esse dia seu Zé! Com o mesmo sentimento que lhe chega e lhe engana há vinte anos! Percebe como o senhor está bem vivo ainda?

-Doutor, o senhor é que não percebe nada, desta vez está enganado, agora é bem diferente, meu coração tremeu! Saltou do peito, tropeçou neste osso aqui, engripou e disparou demais...estou indo doutor, estou indo..eu sinto que sim...

-Vamos lá seu Zé, vamos, calma, feche os olhos, respire fundo, imagine uma viagem boa...para um lugar que o senhor aprecia muito ...bem calmo, tranquilo, cheio de flores...de pássaros...um lindo por- de- sol...uma praia, um barquinho...lá longe...de tudo...

-Doutor!

-O que foi seu Zé?

-Que lugar maravilhoso...será que é o mesmo que o senhor me leva há vinte anos? Quero ficar aqui, doutor.

-Eu também seu Zé...eu também...

Nota:

Verídico.