HISTÓRIAS DO IRMÃO DO ANTENOR

O irmão do Antenor

- Sabe o Antenor?

- Quem?

- O Antenor, aquele que tem o irmão meio surdo. Pois então, o seu irmão morreu!

- O meu irmão?

- Não, "tô" falando o do Antenor, morreu ontem!

- O Antenor? Não diga!

- Não vou dizer, é lógico, porque não foi o Antenor quem morreu. Você se lembra, na época em que estávamos no colégio, quem era o melhor ponta direita do Brasil?

- Sim! Sim!

- Pois então! Ele morreu!

- Ora, diz logo qual é a piada! Todo mundo sabe que o Garrincha morreu, e há muito tempo!

-Não, cara! Estou falando do Colégio Brasil onde nós estudávamos, daquele time treinado pelo Professor Paulo de Educação Física.

- Claro! Claro! O Professor Paulo, hein? Quem diria, parecia que não ia morrer nunca, um cara tão...

- Que Professor Paulo, que nada! Não tinha aquele cara que a turma toda gozava, que ia todo mês ao médico de ouvido, ao Dr. Meneses Rosas?

- Morreu, é? Mas também o Dr. Meneses já era bem...

- Não e não! Pô! Presta atenção! Eu estou falando outra coisa. Lembra que uma vez no bar do seu Quincas, ali na Lapa, um cara fez uma briga danada por causa da Valéria, deu até polícia, saiu nos jornais.

- Claro frequento o bar do seu Quincas até hoje.

- Pois então, o cara morreu!

- Ah, poxa! Logo seu Quincas, mas ele morreu de quê?

- Não, não foi o seu Quincas. Por favor, vê se me entende.

- Chega! Olha aqui ô cara! Fique por aí todo nervoso com as suas ideias assassinas, e depois falando "não, não é isso", que eu já estou atrasado. Estou indo ao enterro do irmão do Antenor, ele morreu ontem, sabia?

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Outra do Irmão do Antenor

- Oi! Como vai?

-?

- Tudo bem? Não está me... não se lembra de mim?

- Sinceramente, eu não...

- Lá da faculdade, da PUC. Eu andava muito com o irmão do Antenor.

- Sim, o Antenor foi meu colega, mas não me lembro de você nem que ele tivesse irmão!

- Ora, o Antenor devia ter lá seus motivos para não dizer que tinha irmão, inclusive ele morreu no mês passado.

- Não pode! Eu tive com o Antenor anteontem.

- Quem morreu foi o irmão do Antenor. Chato isso, mas deixa prá lá. Seu nome é... Márcia, não?

- Não! Eu me chamo Marcela.

- Você está bem! O que você tem feito?

- Sou jornalista.

- Rum! Estranho!

- Por que estranho?

- Sei lá, um pouco diferente do que você estudou, mas deixa prá lá. Tem visto a turma?

- Tenho! A Dorinha, a Vera, a...

- Dessas duas não estou bem lembrado. Eu tenho visto o Camiseta.

- Camiseta?

- Sim! O Camiseta, amigo do Serjão!

- Serjão? Você quer dizer Sérgio?

- Não! Quero dizer Serjão, mesmo! O Sérgio que você falou deve ser o Serginho. Tinha Serjão e Serginho, sacou?

- Bem..., e você? Qual é mesmo o seu nome?

- Cadeado. Eu era conhecido como Cadeado.

- Cadeado?

- É! Carlos Eduardo. Semana passada vi a Ana Luiza.

- Não, não! Ana Paula. Luiza é outra e não era Ana, era só Luiza.

- Não! É Ana Luiza mesmo, tenho certeza, aquela ruiva, de cabelo encaracoladinho, altona, meio gorducha.

- Ela era baixinha, magra, tinha cabelo preto e liso!

- Pois ela engordou e cresceu, ora!

- E o cabelo?

- Cabelo, não! Cabeludo. Você quer saber do Afonso, conhecido como Cabeludo, não é?

- Não estou perguntando sobre esse tal Cabeludo, não.

Estou falando sobre o cabelo da Ana Paula. O que você me diz?

- Nada! Não digo nada. Não conheci nenhuma Ana Paula. Lá em Petrópolis eu não...

- Espera, espera! Você falou Petrópolis? A PUC de Petrópolis? .

- Sim, é claro! Tinha o pessoal que subia... .

- Eu notei que havia alguma coisa errada. Estude na PU C, mas aqui do Rio! Tchau!

- Márcia, espera aí! Márcia, oh Márcia...

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Ainda o Irmão do Antenor

Era um bom sujeito, sem dúvida. Porém, pouco se sabe dele, apenas que gostou de uma tal Valéria que estudou no Colégio Brasil e na PUC de Petrópolis. Era meio brigão, um pouco surdo de um ouvido, tinha um amigo com apelido de Cadeado, que está morto e obviamente, irmão do Antenor. Irmão mais moço, é claro! Ninguém sabia o seu nome (ao certo e ao errado) porque sempre quem se destacava, tinha realmente nome, era o próprio Antenor. Assim, ele ficou conhecido na roda como o

Irmão do Antenor, o que não chegou a incomodá-lo propriamente, mas atrapalhava-o vez por outra.

Em 1985, não se sabe que tipo de acerto houve, chegou a ser cogitado para ministro (naquela época de festival de ministérios na criação da Nova República), mas acabou sendo vetado pela esquerda porque pegaria maI o locutor anunciar na TV: - Tomou posse ontem no Ministério tal o irmão do Antenor. Quem iria ser promovido e badalado era o próprio Antenor:, mas como este não tinha apoiado o Tancredo, não dava!

Quando jovem, dizem que foi o lançador dos nomes de conjuntos de rock em português - Irmão do Anteno-r e os Profetas do Amanhã - porém, faltava uma certa identidade ao conjunto, não deu certo!

~ Sabe o irmão do Antenor?

- Quem? O Alaor?

- Não! Disse um terceiro – Adamastorl

- Alaor!

- Adamastor!

- Acho que é VaIter, arriscou um quarto.

Certeza mesmo ninguém tinha e como sempre acabava em discussão, o melhor mesmo era chamá-Io só de irmão do Antenor.

Ele até já tinha assumido bem este fato e dava um certo ar de mistério e de importância ao se apresentar.

- Prazer! Eu sou o irmão do Antenor. Por ora é o suficiente e conveniente. Prefiro manter certo sigilo, questão profissional.

Quando morreu, ficou sacramentado definitivamente que passaria para a eternidade como irmão do Antenor. No aviso de enterro, na missa de sétimo dia e, dizem alguns, que até na porta do céu, no listão de São Pedro, ele estava relacionado na letra "I" - Irmão do Antenor...

Era um bom sujeito, sem dúvida. Viveu e morreu no anonimato!

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Tango

Começa a música, um tango. Ele olha, ela olha. Sorriem.

Ela disfarça, ele também. Corre o tango. De novo se olham, sorriem. Ele se anima, estufa o peito, se alisa e encolhe a barriga. A música continua. Vai lá.

- Vamos?

- Dançar?

- Este tango.

- Por que não?

- Ou, não, por que?

- Sim, vamos.

- Aonde?

- Dançar, não é?

- Lógico, o tango.

- Pois então?

- Já te convidei!

- Para que, homem?

- Este tango.

- E eu já aceitei, estamos perdendo.

- O quê?

- Tempo.

- O tempo? Chuva ou não. Não faz diferença.

- Certo! Mas o convite está de pé?

- O convite estava no meu bolso. Entreguei lá na entrada.

Eu estou de pé, vamos?

- Bem, já que você insiste...

- Não, não insisto. Apenas convido, e pela última vez.

- Está aceito, ora!

- Horas? São...

- Nada de horas. Você não está me ouvindo?

- Estou, e muito bem. E o "tango?

- Também estou ouvindo.

- Não! Nossa dança, afinal.

- Bem lembrado, vamos, portanto.

- Não! Íamos, entretando. Acabou o tango.

- Que música tocava?

- Não sei. A letra falava qualquer coisa sobre o irmão do Antenor...

(Textos do livro Jerumenha de Luiz Otávio escrito em homenagem à "Nova República" em 1987)