Esforço Romântico

O jovem moço, ainda imberbe, decidiu que aquela seria a mulher de sua vida. Uma tez morena, perfumada, olhos vívidos e perspicazes e um corpo simplesmente escultural.

Romântico, procurou várias formas de aproximar-se e poder conhecê-la melhor, falar frente a frente e, quem sabe, ousar um toque de mão ou mesmo um beijo.

Era década de 60 e havia uma pré-disposição, um que de liberdade que deixava a vida mais divertida, uma possibilidade excitante que fazia os joelhos tremerem e o estômago apertar de antecipação.

Já se imaginava em uma praia quase deserta com sua Vemaguete praticamente nova, azul, com aquela morena ao lado fazendo um pic-nic, apenas para começar.

Sorria da antecipação, já pensando uma estratégia de aproximação, um tigre cercando sua presa.

Era tempo de cinema, liberdade, romantismo e não foi difícil encontrar alguém que lhe apresentasse aquela diva.

A moça, saia rodada, óculos de gatinha, mascando chicletes, pareceu ser receptiva, embora com uma atenção bastante dispersa. Nada que o fizesse desanimar do seu plano romanticamente maquiavélico.

Conseguiu seu intento, cinema, lanchonetes, uma ou outra hora dançante com aquela cocota explodindo de charme. Talvez ela fosse mesmo um pouco saidinha, disponível, mas nada fora do contexto da época.

O rapaz foi se aproximando e apaixonando cada vez mais. Imaginava sua Vemaguete, na verdade emprestada, cheia de crianças gritando e brigando por qualquer motivo e espaço. Decidiu que era hora de tentar algo mais definitivo...e assustador. Enfrentar o futuro sogro.

Conseguiu marcar um encontro naquela que, talvez, seria sua futura casa, o local para onde iria aos domingos para comer macarronada e cultivar a barriga. Nervoso, vestiu o melhor terno, com pernas um tanto curtas, passou um perfume e apressou-se em comprar uma caixa de bombons e três rosas, toda sua reserva monetária.

Mais confiante foi até o endereço e bateu à porta. Um homem alto e sério o cumprimentou formalmente, com olhos de flecha, frios a diretos. Não pensou em recuar, mas imaginou se algum dia eles se suavizariam ou se, por outro lado, seriam os olhos da jovem que o fuzilariam daquela maneira.

Afastou a ideia. Assim como ele, ela parecia romanticamente arrebatada. Olhou para as flores e sentiu-se mais confiante.

Conversou um pouco com o anfitrião, a mãe cheia de dedos e cuidados e teve a permissão de namorar na sala, claro, com uma irmã mais nova e convenientemente fofoqueira acompanhando.

Tudo bem, ele pensou. Tudo previsto.

Entregou as flores e a caixa de bombons, sentou-se no sofá, dois metros distante e iniciou uma conversação com a moça. Esta, estranhamente parecia distante e desinteressada, respondendo em monossílabos enquanto mantinha a boca cheia com o agrado levado.

O rapaz, desconcertado, mantinha-se falando, embora a confiança lhe escorresse em grossas gotas de suor pelo pescoço. Ficou aliviado quando o olhar sisudo e o nariz fino e austero do dono da casa anunciaram que era hora de partir.

A moça ficou no sofá, meio indiferente, ainda mastigando a última pétala de rosa, os caules nus nas mãos.

Os bombons?

Permaneceram fechados na caixa. Chocolate engorda muito.

Marcelo FAS
Enviado por Marcelo FAS em 03/09/2010
Reeditado em 03/09/2010
Código do texto: T2476190
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