Aconteceu em Araújos 02
Os Pés vermelhos
Zé Branco, Coruja e Caçapa eram daqueles tipos de amigos que podemos chamar de inseparáveis. Amigos fiéis, de poucos recursos, porém muito honestos e trabalhadores.
Moravam na pacata cidade de Araújos no interior de MG. Lugar de terra vermelha e muito produtiva.
Esta cidade, também conhecida de alguns por Zaraújo, herdou esse nome devido a uma família antiga e muito rica dona de uma grande fazenda, que posteriormente, por razões comerciais, adotaram o sobrenome de Durand. Mas a cidade por razões legais traz este nome até hoje. Criou-se até uma expressão famosa: “Quem nasce no mar é Marujo, quem nasce no Ar é Araújo”.
Mas vamos aos fatos: Esses amigos, estavam sempre juntos. Era no batente (na afamada Durands Construtora), numa pescaria, num festejo e principalmente nos botecos, aliás nos famosos botecos de Araújos.
Também eram conhecidos pela quantidade de “manguaça” que consumiam. Sempre que lhes faltava dinheiro (e não eram poucas vezes), reuniam-se na casa de Zé Branco, pra “carcá” umas e outras de uma famosa pinga de engenho que ele conservava com todo zelo num corote (1). Corote este que ele tinha um ciúmes doentio.
Seu ciúmes era tanto que ele sempre dizia: “Se um dia eu morrer, quero que este corote seja enterrado comigo”. Ficando prometido pelos dois amigos que assim é que seria.
Pois bem, uma festa aqui, uma pescaria ali e constantes ressacas no trabalho, não é que numa bela tarde de sábado nosso amigo Zé Branco, bate com as dez? “Encaçapou” desta pra melhor.
No velório Coruja e Caçapa estavam inconsoláveis e evidentemente que motivos não faltavam.
Mas o que mais os perturbava era saber que aquelas “reuniões” na casa do amigo não mais aconteceriam.
Na despedida, um deles lembrou a mãe do falecido sobre o desejo do amigo de que o corote deveria seguir o mesmo destino dele, e ela concordou.
Então pediu aos dois que fossem pega-lo e colocassem em seu caixão e assim o fizeram. Perceberam, no entanto, que o pequeno barril estava quase cheio da marvada. “Uma pena mesmo” comentou ainda um deles.
Naquela tarde de domingo, já escurecendo parentes e amigos retornavam do cemitério, consternados pela triste passagem, mas dentre eles a consternação e tristeza tinha nome, ou melhor nomes: Coruja e Caçapa.
Naquela noite choveu tanto que, pra se ter uma idéia, tinha “cachorro bebendo água em pé”.
Segunda feira de batente “brabo” lá estava a equipe como de costume na obra, desta vez com apenas um terço de seus componentes.
Acontece que o patrão Sr. Durand notou que ambos estavam com as botinhas (também conhecidas por sapatão), todas cobertas de barro vermelho.
Também notara que a ressaca era a pior que ele já tinha visto naquelas criaturas, desde então.
Teria a dupla retornada ao cemitério para uma última “reunião” com o amigo Zé Branco? Pelo sim pelo não, ficaram conhecidos em toda cidade e adjacências como “Os pés vermelhos”.
Caso queiram confirmar o teor da veracidade desta história favor entrar em contato com o meu nobre amigo Lucas Durand, aqui mesmo no RL. Muito obrigado.
(1) Corote = Pequeno barril de madeira quase sempre destinado a conservação de cachaça e outras bebidas do gênero.