Tecnologia Avançada
A Síndrome de Coisovski-Antigovna faz com que as pessoas se sintam no passado. Elas não enxergam o presente como ele é. Tudo para elas é como se fosse há dez ou vinte anos. Essa síndrome foi descoberta pelo casal Rusticuris Coisovski e Antigarina Antigovna e a incidência dessa síndrome de 1 em 1.000.000.000.000.000.
Se há uma pessoa que tem tudo de mais moderno este é Fábio Germont, um jovem empresário que enriqueceu rapidamente e hoje desfruta de tudo que ganhou e tem uma predileção pela tecnologia. Tem o melhor aparelho de celular, o notebook de configuração mais avançadada, além de outros gadgets (em bom português: geringonça, parafernália eletrônica).
E eis que um belo dia Fábio acorda numa quinta-feira qualquer, e neste dia ele comprará um novo notebook, pois o que ele comprou há dois meses já está ultrapassado. Ele se levanta, abre seu closet e vê a infinidade de ternos, só que ele escolhe o mais antigo de todos, de um modelo bem fora da moda. Sua esposa o vê e comenta a respeito, mas ele não dá importância. Fábio tem três opções de carro para sair e escolhe também o modelo mais antigo que ele tem, de forma muito natural. Saiu da garagem do condomínio e foi rumo ao centro da cidade, só que foi para o centro mais antigo. Estacionou em frente a uma loja meio escondida e velha. Quando lá entrou deparou com máquinas de escrever, algumas novas e outras bem antigas, do século passado. O dono da loja observou aquele jovem moço olhando as máquinas mais antigas, saiu detrás do balcão e foi abordá-lo.
— Posso ajudar meu jovem?
— Estou vendo essa máquina pra mim, parece ser boa.
— É pro senhor mesmo?
— Sim, pro meu trabalho, eu preciso de uma coisa nova e isso me parece novo.
— Permita-me senhor, aqui do lado tem umas máquinas mais novas, são elétricas, tem mais a ver com o senhor. Siga-me.
O homem o levou até máquinas elétricas de 1985 e 1991. Fábio ficou encantado com aquelas lindas máquinas e comprou a mais moderna que havia ali.
— O senhor não quer que eu embrulhe pra presente?
— Presente?
— Sim, pelo visto você vai presentear algum parente mais idoso.
— Não, não, meu senhor, é pra mim mesmo.
— Tudo bem, como queira.
Fábio pegou sua máquina e foi para seu trabalho. Chegando à portaria da empresa, o porteiro hesitou em abrir a porta para Fábio que buzinou. O porteiro foi até ele e reconheceu.
— Perdão Sr Germont, é que nunca vi o senhor com este carro.
— Como não me reconheceu numa máquina desta. – riu Fábio.
Ao chegar à sala de reunião em que todos o esperavam, Fábio entrou carregando uma enorme bolsa e dela tirou sua máquina de datilografar elétrica. Ligou na tomada e disse:
— Viram que linda! Acabei de comprar!
— Senhor Germont, que roupa é essa? Creio que o senhor não está passando bem, deve ser a rotina estressante. Eu dispenso o senhor por hoje e volte amanhã pronto para trabalhar.
Depois que Fábio saiu, os integrantes não se agüentaram e morreram de rir da cena patética que tinham acabado de presenciar.
O dono da máquina de datilografar não entendia o porquê de aquilo ter acontecido. Parou num restaurante para tomar algo e levou consigo sua máquina nova.
As pessoas o olhavam de soslaio para aquele homem vestido de forma estranha e carregando uma grande bolsa. Fábio agia muito naturalmente, sentou na cadeira e pediu para o garçom por uma tomada.
— Perdão, o senhor quer uma tomada?
— Sim, uma tomada para ligar esta máquina, veja que linda, ela é elétrica, coisa nova.
O garçom se conteve para não rir e disse que a tomada mais próxima ficava perto do banheiro. Fábio foi até lá e sentou. Começou a datilografar e o barulho da máquina era um pouco alto, apesar de ser elétrica. As outras pessoas com seus notebooks olhavam de forma zombeteira para ele.
Numa mesa próxima a de Fábio havia um médico que percebeu toda a situação e que conhecia a Síndrome de Coisovski-Antigovna e logo detectou que aquele homem fora acometido pela terrível e vergonhosa síndrome. Aproximou-se dele e o abordou.
— Com licença, senhor, será que poderia falar alguns instantes contigo?
— Sim, claro.
— Obrigado, eu sou o Doutor Asimov e sou especialista em neurologia. Reparei que desde a hora que o senhor chegou que há algo diferente na sua pessoa.
— O que doutor?
— Antes de te responder, me responda que dia é hoje?
— 22 de Agosto de 1991.
— O senhor está errado, estamos nessa mesma data, só que no ano de 2010. Ninguém mais usa máquina datilografar, principalmente uma pessoa do seu porte, que não só está com essa máquina antiga, como também com um terno de modelo muito fora de moda.
— 2010? Ficou louco doutor?
—Não é loucura, e nem é sua também, na verdade você foi acometido pela Síndrome de Coisovski-Antigovna.
— Síndrome de quê?
— Coisovski-Antigovna.
— Bonito nome. Uma pessoa do meu status não poderia ter nome de síndrome melhor. Imagine se fosse com sobrenome pobre.
— É sério senhor, e é a primeira vez que vejo alguém com essa síndrome, a incidência dela é quase nula, mas o senhor foi privilegiado.
— Que bom. E agora?
— Boa pergunta. Não conheço a cura para esta síndrome.
— Então vai embora, porque eu ainda preciso datilografar umas páginas de relatório para entregar na empresa. E acho que o senhor deveria consultar um psiquiatra, porque não é normal as pessoas ficarem por ai criando síndromes.
Fábio voltou para casa, tomou seu banho e foi assistir televisão no quarto de empregada onde havia uma televisão de catorze polegadas, porque Fábio não reconhecia toda a tecnologia que ele tinha em sua casa. Havia um sistema de som que dava pra ouvir até no banheiro. Depois ele foi dormir e acordou no dia seguinte como se nada tivesse acontecido. Foi ao trabalho com seu notebook e todos contaram o que tinha acontecido no dia interior e ele simplesmente não se lembrava de nada, até tinham separado o nome de um médico para ele passar, tal de doutor Asimov.
— Mas esse cara não é médico, ele é aquele escritor russo que escrevia sobre robôs. Quem foi que separou o nome dele?
Ninguém soube responder.
22/08/2010