Comilança
Quis garantir sustança
Para encarar a potranca
Comi feito um condenado
E me esqueci do ditado
Então é assim que me lixo
Pra barriga muito cheia
Até mulherão tem bicho
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Da série: Inspirações Musicais
Tragédia Afrodisíaca
(Carlos Melo)
Fui dar uns esbordeios no Bixiga
Ver se alguma rapariga
Se dispunha a um tête-à-tête
(meu sonho era uma chacrete)
Mas antes do amor ser consumado
Quis ter o estômago forrado
Pra evitar humilhação
Corri pruma cantina italiana
Pedi filé a parmegiana
Com catuaba, arroz e pão
(para surpresa do garção)
De quebra um prato de sopa bem morna
Vinte ovinhos de codorna
Tudo ao molho vinagrete
(para encarar o tête-à-tetê)
Comi mais do que um monge tibetano
A sobremesa foi tutano
Pra aumentar minha energia
Quando eu inda queixava-me da conta
Lá no hall de entrada aponta
Um monumento de guria
(cinco de frente, três de esguia)
Essa é a nora que mamãe pediu a Deus
Gostosa
Bunduda
Sem perda de um segundo abordei-a
Convidando-a pra ceia
E de pronto ela aceitou
Com tanta energia armazenada
Já passei-lhe uma cantada:
Vamos lá pro meu chatô
Eu moro num apê em Santo Amaro
O aluguel de lá é caro
Mas não tem elevador
(a escadaria é um suador)
Então, ela encarou-me e disse:
filho, não existe empecilho
Que detenha-nos de amar
(mandei um táxi parar)
No interior de um táxi mirim
Eu resolvi, então, enfim,
Partir de cara pra ação
Depois de mordiscar a sua nuca
Vi que ela usava peruca
E que seu nome era João
(nas horas vagas, Conceição...)
Conceição, eu me lembro muito bem,
Conceição, eu me lembro muito bem...
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Conheci esta música - um perfeito sambinha de breque interpretado pelo grupo Língua de Trapo, em seu primeiro LP (1982) - na adolescência e gostei muito do humor escrachado das letras do grupo, que, apesar do estilo irreverente, prismava pela produção de músicas bem compostas e interpretadas.
Outra música do mesmo disco que nunca esqueci foi "Quem Ama Não Mata".
Desconheço trabalhos mais recentes do grupo, mas algumas letras que li não me agradaram, descambando para o besteirol ou baixaria.
Nota da autora: Como algumas pessoas não entenderam a piadinha, explico. O final é uma referência ao ditado: "barriga cheia, goiaba tem bicho", no sentido de que, quando estamos empanturrados, colocamos defeito na comida.
Bicho, aí, tem duplo sentido, como pode-se perceber na música que inspirou os versos.