O SOFÁ DA SALA VIP!

Numa dessas conversas de corredor da vida eu lhe dizia que dia desses comprei um arroz daquele tipo agulhinha, grão qualificado como I (um), mas que não tardou a encher minha despensa duns diminutos seres animados escuros, aparentemente unicelulares, o tal do arroz "carunchado".

Bem , ela com a sua inteligência rápida logo me justificou: deve ser porque o tal do arroz é caro e não deve sair das prateleiras.

Achei brilhante o seu raciocínio.

E foi logo ilustrando com um fato:

Contou-me que certa vez conheceu uma enorme casa numa região nobre de São Paulo, numa famosa rua da "elite" paulistana, cuja dona não permitia a entrada de ninguém na sala principal.

De jeito algum ela poderia correr o risco de ter seu antiquíssimo sofá de "gobelein" acetinado e rebordado com delicados fios de ouro, danificado por funcionários distraídos ou ter seus cristais trincados, ou suas originais telas de Dali deterioradas.

Apenas um funcionário da limpeza bem treinado possuia acesso à sala VIP a cada trinta dias, e sob os olhares rígidos da governanta.

E certa vez o stress na mansão começou a ficar insuportável, em virtude da festa de bodas de ouro da madame que ocorreria naquela sala de recepção,tão protegida de tudo e de todos. A imprensa já estava avisada...e convidada.

Eram orientações para todos os lados! Uma blindagem até do pensamento para não estourar os delicados objetos de arte da sala.

O sofá então, foco do principal cuidado, era a "menina dos olhos" da dona. Sua limpeza demandava horas de explicação de detalhes, de produtos especiais e de olhos exigentes.

Na verdade, ninguém ali conseguia entender como um sofá tão belo tivera um destino tão triste, o de não poder assentar ninguém em suas delicadas e macias estruturas, numa solidão desumana de anos a fio.

Mas, finalmente chegara o grande o dia, ansiosamente tão idealizado.

Luzes, perfumes, cristais, pratas, sedas, enfim todo o aparato de guarnições finas que se exige numa grande comemoração de "granfinos".

A criadagem toda impecavelmente vestida e postada para receber os convidados "elegantérrimos!", e os gestores do evento prontos para que tudo corresse na mais perfeita ordem, tudo dentro do "sim senhor, perfeitamente, senhor!"

Naquela noite, enfim, o velho sofá sairia do seu triste destino, e finalmente sentiria o calor humano dos polpudos traseiros dos requintados convidados famosos, que chegavam um a um no conhecido glamour das grandes e inesquecíveis ocasiões.

E eis que no meio da festa, justamente ao anúncio oficial do motivo da grande comemoração, alguns dos presentes refastelaram confortavelmente as suas cansadas nádegas, ancoradas na maciez do tecido que mais parecia um quadro de museu.

De repente o susto: uma coleção inesperada de pequenos camundongos fazia parte do inesperado acervo artísico, estratégicamente escondido nas entranhas do tão solitário sofá.

A confusão estava armada.

A protagonista das bodas de ouro desmaiou! Uma ambulância foi chamada ao local.

Um vexame de fato!

Os convidados mais histéricos gritavam "pega uma ratoeira, pega uma ratoeira!"

Porém os ágeis roedores em bando, se desviavam dos convidados, com faros ávidos pelas ovas de caviar que elegantemente circulavam no alto das bandejas da festa.

A criadagem corria e chocava-se sem entender como aqueles camundongos tinham ido parar ali. O cenário parecia filme pastelão.

Um ninho de ratos, inocentemente desenvolvido na sala mais vip que a cidade já vira, em meio a festa mais esperada do ano!

Com certeza ratinhos VIPs, ninguém ali ousava duvidar da sua tão nobre natureza..

Ela, que trabalhava na festa daquele dia, contou-me que nunca esqueceu da lição figurativamente ensinada pelos ratos, naquela noite de gala.

Fiquei aqui pensando numa moral da história.

Qual seria? Nem pensar nos já conhecidos ditados: "nem tudo que brilha é ouro", ou no "por fora bela viola, por dentro pão bolorento"

Eu arriscaria: Cuidado! Dourados e eternos assentos...podem ocultar...ratos fedorentos.

A analogia com qualquer cenário da realidade eu a deixo para a imaginação fértil do meu inteligente leitor.

Nota da autora:

Baseado em fatos reais.