O SAPO E A COBRA

O SAPO E A COBRA

Após desabafar toda uma noite no seu coaxar destacado em lamacento brejo perto do lago do Anzol, o sapo despede-se de seus companheiros de orquestra a procura de escuro refúgio em busca de descanso. A alvorada estava começando e os predadores ainda sonolentos rareavam molengas. Era com isso que o sapo contava para trilhar sossegado seu caminho.

- Que noite cansativa. – pensava. - quase arrebento a garganta. Dessa vez o maestro exigiu demais. Mal tive tempo de saborear alguns vaga-lumes na hora do lanche da madrugada.

Seguia pelo córrego dos lambaris quando um movimento nas ramagens próximas lhe chama a atenção volta-se atento notando sem esforço a presença de uma lagartixa dessas menores.

- Opa! Petisco a vista.

A lagartixa já o havia pressentido e sendo um bicho de hábitos similares, julgando não estar ainda no raio de ação do sapo decide permanecer imóvel a espera que este se afaste. Mas o sapo estava atendo e não queria perder a presa. Em dois tempos, dá um salto fenomenal, quase olímpico, aproximando-se da lagartixa que ensaiara uma fuga mas em vão já que a chicoteante e infalível língua do sapo executava o segundo e meteórico movimento recolhendo a parenta do camaleão para o estreito de sua goela tal e qual um rolo compressor, fazendo a lagartixa desaparecer "geograficamente" para sempre" daquela região enquanto o sapo num arroto malcriado seguia sem caminhar lento.

- Bom, pança cheia, agora sim, o descanso.

Sentiu o mormaço e meio preguiçoso, decidiu descansar num cupinzeiro mais adiante até o anoitecer pois tinha combinado uma seresta com o sapo boi e a rã verde do brejo dos arrozais. Mas as pretensões do sapo seriam marcadas por um percalço que ele não previra. Vindo sabe-se lá de onde, uma jararaca passou a ficar a sua espreita, querendo lhe dar destino parecido com o da lagartixa.

- Esse sapo está gordo e será meu pasto por hoje. – pensava a cobra que o vira engolir a lagartixa.

- E vou pega-lo no córrego das piabinhas, pois pesado com ele está, dificilmente conseguirá sair saltando por aí.

E afasta-se a cobra para surpreender o sapo mais adiante. aproveitando a sombra de um meloso verde vinha o sapo com seu jeito lento e encontrando uma terrível lagarta amarela, cujo veneno chegava a ser mortal assusta-se.

De antemão na fala ela não foi receptiva:

- Já vou avisando sapo que se você meter-se a besta comigo sofrerá na pele.

na plena certeza do quanto a lagarta era indigesta o sapo não perdeu tempo:

- E quem é maluco lagarta? Pode seguir seu caminho.

A lagarta sai vendo que o sapo não se atreveria a importuná-la, e segue seu destino com sua ambulante carga perigosa ainda observada de longe pela jararaca que também não gostaria de ter com ela um encontro, voltando as atenções para o sapo que também seguia lento pela pança cheia.

- Preciso fazer alguma coisa senão num pulo esse sapo me escapa.

E apressa-se para ir para o córrego das piabinhas onde invariavelmente o sapo passaria para seguir até seu refúgio, um cupinzeiro mais adiante, chegando antes dele por um atalho e se colocando em posição de ataque para surpreende-lo. O sapo se aproxima sem saber do risco que corria pois entre a gramínea escondia-se a cobra. Mas acelerando as coisas, uma ventania move a moita onde a cobra estava escondida e ela não se preocupa com o segredo se mostrando de surpresa o que assusta o outro que exclama numa mistura de susto e medo:

- Minha nossa, uma jararaca! E das grandes.

- Isso mesmo, seu sapo perturbador das noites, de cantar sofrível, prepare-se, pois seu fim se aproxima.

- Está brincando? Tenho uns compromissos para logo á noite, e necessito de algum repouso se me der licença.

- Te dar licença? Será que consegue entender que todos seus compromissos vão acabar daqui a pouquinho se acabaram e que vais morrer?

- Morrer? minha nossa!! Então é melhor eu rezar, não acha?

- Rezar? Então além de soltar a voz perturbando quem quer dormir á noite você é ainda humorista? de jeito nenhum!

- Nada disso, é que este é meu último desejo, não vai negar um desejo a que está para morrer vai? Saiba que minha alma poderá voltar e assustá-la, por não ter sossego no além.

Receosa e acreditando no embuste do sapo a cobra recua.

- Epa! Hum mm! Bom, contanto que seja logo, pois meu tempo é curto e preciso ir até o ninho de um pica-pau aqui perto beber uns ovos.

Passado algum tempo o sapo ao invés de rezar fica parado olhando a cobra que pergunta irritada:

Como é, não vai rezar?

- Como rezar, já viu alguém rezar de olhos abertos?

- Bá a! Deixe de conversa quem está rezando é você, não eu e quer saber? Acho que estamos perdendo tempo demais por aqui

- Eu sei. – fala o sapo. - mas não custa fechar os olhos nessa última vontade minha, você pode rezar também, para agradecer a refeição não acha?

- Tá bom, caramba!1 mas não sei não hein? mas esse negócio já demora demais,

E a cobra fecha os olhos. Pensando estar fazendo uma última vontade mas o que fez o ingrato do sapo? na verdade demonstrando pouca fé,(aliás fé alguma) Dá um salto enorme sobre a cobra e o segundo salto o põe fora do alcance da rastejante que ao vê-lo longe reclamou,

- Mas isso não é justo, você me enganou sapo, vou lembrar isso lá na frente.

- Lamento dona cobra, sua fé não foi suficiente. Até qualquer dia desses.

e com mais um salto desaparece da vista da cobra de vez.

Pacomolina
Enviado por Pacomolina em 14/02/2010
Reeditado em 23/12/2014
Código do texto: T2086691
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