A VIDA É BELA
Dedicado a Roberto Benigni.
A vida é bela,
mas olhe a miséria
desfilando à janela:
quanto maior a fome,
mais vazia a panela.
Vai-se a doença,
fica a seqüela...
No braço, eczema,
na perna, erisipela.
Eu sem você,
você sem ela...
O ladrão solto,
o honesto na cela.
Tranque o cadeado,
gire a tramela,
se a filha é feia,
imagine a mãe dela...
Pouco cravo,
nenhuma canela...
Mundo cão,
morte cadela.
Menos de um ano
e já espichou a canela...
Quanto mais se sabe,
menos se revela.
Quanto maior o olho,
maior a remela.
O rico na avenida,
o pobre na viela.
Cuspiu no prato,
mijou na gamela.
O real desvaloriza,
a economia se esfacela.
Inflação de verdade,
falsa aquarela,
nenhuma verdinha,
muita febre-amarela.
Os juros pra cima,
o câmbio na banguela.
Quando pobre acorda rico,
vai ver é novela.
Ao rico, champanhe e caviar.
Ao pobre, kissuco e mortadela.
A vida é bela,
mas não tão bonita
quanto na tela.
Enfim, a vida é bela:
ópera bufa,
ilusão e balela.
(José de Castro, in "Quem brinca em serviço - textos de humor" Natal/RN: Edições Sebo Vermelho, 2003.)