Matuto não é besta não! – II

 

            Na cidade de Limoeiro, bem aqui no agreste pernambucano, pertinho da capital, havia uma agência do Banco do Brasil que era por demais movimentada, principalmente nos tempos em que o governo financiava a agricultura dos pequeninos produtores com juros bem baixinhos, e a inflação nunca disparava.

            Era a chamada Carteira de Crédito Agrícola e Industrial, que sempre fora a mola propulsora da produção do campo e das cidades. Era obrigação de o governo suprir de capital a todos quantos necessitassem do pertinente giro para tocar seus negócios, ou mesmo em investimentos.

            O governo João Goulart fora obrigado a mandar abrir concurso para a entrada de novos funcionários, porque a demanda era muito grande, e somente em Limoeiro assumiram mais de vinte novos servidores daquela agência que já foi a número um em matéria de crédito agropecuário. O que se acontece hoje é apenas uma sombra do passado, que não volta mais, principalmente em face da ganância por lucro fácil, agiotagem oficial.

            Feita essa introdução, entrara um cidadão matuto, magrinho, acanhado, roupinha remendada, alpargatas nos pés, mas limpinho, querendo fazer uma ficha de cadastro. Encaminhado fora logo para o mais culto dos funcionários:

            -- Nome?  -- Manoel Eleutério da Silva

            -- Apelido? -- Mané de Ceiça.

            -- Naturalidade? -- Daqui mermo.

            -- Casado? --Sou sim senhor.

            -- Nome do cônjuge? – Tenho não senhor.

            -- Da sua mulher? – Maria Angustiada da Conceição (Ceiça).

            -- Profissão? – Industriá.

            O funcionário olhou meio desconfiado e pensou que era brincadeira, pois do jeito que o cliente estava vestido não seria de acreditar.

            -- O senhor fabrica o quê? – Algodão doce, tenho uma carrocinha.

            Realmente aquilo é uma indústria de transformação, pois se coloca o açúcar numa abertura no meio da bacia e o fogo vai se encarregando de produzir o que se chama de algodão.

            -- Muito bem, mas quem é que pode dar informações sobre o senhor? – Olhe dotô a meninada da rua toda me compra...

            E o cadastro fora aprovado. Foi-lhe financiada uma carrocinha nova e capital de giro para a matéria-prima.

            Esse era o Banco de antigamente, mas hoje é tudo no computador, e industrial desse porte não tem mais vez.

 

Poucos se recordam das velhas carrocinhas de antigamente.

Se duvidar, as de hoje são digitais.


ansilgus
Enviado por ansilgus em 19/01/2010
Reeditado em 21/04/2010
Código do texto: T2038634
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