A rena no presépio
Começo afirmando que isto aconteceu, mesmo - tanto a rena no presépio como a conversa que deu origem ao texto.
Foi assim: estávamos num fim de tarde gostoso na calçada de D. Darci, ela, eu e Benilde (já isso é meio difícil, não as conversas na calçada - afinal moro numa cidadezinha do interior, boa de prestar - mas uma tarde amena no semi-árido cearense); falávamos sobre a decoração natalina: as luzes nas acácias, castanholeiras e ficus, árvores que há tempos não víamos tão felizes, um pinheiro feito de garrafas PET verdes, cintilando à noite sob uma luz cuidadosamente orientada, no meio da lagoa Salina; o presépio montado na praça da matriz, com as figuras vestidas num tecido meio rústico, meio dourado velho (acho que foi de propósito e ficou uma boniteza!), e uma rena estilizada, feita de arame e luzes prateadas, deitada junto à sagrada família como um cachorrinho.
A desproporção das dimensões da rena - quase em tamanho natural - em relação ao presépio, pequeno e delicado, e a confusão entre ouro e prata causaram-me aquele efeito meio indigesto que normalmente essas coisas causam em pessoas 'cri-cris'.
(Eu sou 'cri-cri' - eu e Benilde Brilhante, amiga de priscas eras, até sócias já fomos em um namoro, mas o sujeito não mais nos tem, sorte dele!)
E falei também do tremendo engano ao se colocar uma rena - pelo amor de deus! - no presépio, cujas lendas contam de um estábulo com vacas, cavalos e um burrico (mas isso lá na praça não tinha, não), valendo o registro de que o lugar onde o menino nasceu era quente prá valer, sendo bem improvável que uma pobre rena sobrevivesse em habitat tão diverso do seu.
D. Darci e Benilde ouviam e concordavam com todos esses argumentos, perfeitamente lógicos, como convêm a discursos cri-cris. Aí Benilde, a Brilhante, lascou: "É, nesta cidade há muita rena em presépio..."
Aconteceu, e nos deu o que rir e pensar...